A Casa (Rodrigo Hernandéz, 2011)

Thiago Köche*

Cartaz nacional do filme "A Casa"

Um filme de horror uruguaio em plano-sequência em salas multiplex pelo Brasil inteiro? Irresistível por três motivos: ser um horror em plano-sequência; ser um horror uruguaio (gênero pouco explorado no país) e ser um longa-metragem feito no país vizinho e exibido em muitas salas de cinema espalhadas por aqui. Este é A Casa (2011), longa-metragem de estreia do diretor Rodrigo Hernandéz.

A obra foi rodada em apenas quatro dias, custou míseros seis mil dólares, com apenas quatro atores e percorreu o mundo inteiro tendo, com certeza, lucratividade interessante. Só por estas várias curiosidades, o filme já deve ser respeitado, independente da qualidade do longa-metragem, já que ao mesmo tempo possui conteúdo original e finalidades comerciais (como sorteios de camisetas no site oficial www.lacasamuda.com). A Casa teve distribuição brasileira pela Playarte Filmes, grande empresa do ramo. Se não bastasse tudo isso, foi selecionado para o Festival de Cannes, além de festivais no Peru, Cuba, Eslovênia e outros. O filme não esquece sua língua originária – apesar de ser claramente um “filme para gringo ver” –, é todo falado em espanhol, nas pouquíssimas falas que possui. O longa-metragem tem 86 minutos e foi produzido pela Tokyo Films.

O filme é “baseado em fatos reais”, mais um chamariz que prova o cunho comercial do projeto. Em 1944, em uma antiga fazenda num vilarejo uruguaio foram encontrados dois corpos mutilados e várias fotos perturbadoras. Na verdade, este “baseado em fatos reais” pode gerar vários filmes diferentes, pois estes fatos podem ter várias interpretações. Hernandéz teve esta interpretação dos poucos “fatos reais” para se basear: Laura (Florencia Colucci) e seu pai Wilson (Gustavo Alonso) se hospedam numa casa pela noite para que no dia seguinte avaliem a mesma para venda. Quando Wilson já descansa e Laura tenta pegar no sono, barulhos estranhos no andar de cima da casa incomodam a garota. Ela acorda seu pai para verificar a estranheza e aí começa o pesadelo.

Primeira dúvida dos realizadores audiovisuais: realmente o filme é um plano-sequência, ou seja, rodado em apenas um take, sem cortes, ou é formado por vários planos que, juntos, forjam um verdadeiro plano-sequência? O que muitos realizadores fazem é “cortar” cenas no escuro ou em planos com pouca luz, de maneira “invisível”, pois assim é muito menos trabalhoso do que realizar um filme todo sem cortes. Exigiria muito trabalho de toda equipe, não podendo ter erro nenhum da equipe de áudio, da equipe de câmera e dos atores no tempo real que o filme pretende ter. A Casa é, claramente, um filme composto por vários planos-sequência. Isso pode ser percebido porque muitas vezes a tela fica preta, e isso forja (de forma muito inteligente, vale ressaltar) um trabalhoso plano-sequência “verdadeiro”. Ao contrário da maioria dos realizadores e admiradores desse tipo de plano, não considero demérito nenhum filmar vários takes para parecer um só. Alfred Hitchcock fez isso em Pacto Sinistro (1951), de forma muito mais perceptível do que o próprio Rodrigo Hernandéz. O filme parece um plano-sequência “verdadeiro” e, acima de tudo, tem o que isso pode acrescentar num filme de horror: tensão em tempo real, como o pôster nacional anuncia.

O problema é a profundidade do filme, ou melhor, a falta dela. A obra é rasa demais. Laura é uma personagem inexpressiva, não sabemos absolutamente nada sobre ela, o que faz automaticamente não termos simplesmente nenhuma empatia por uma garota que se esconde, geme e tem medo de qualquer som. O mesmo acontece com todos os personagens paralelos que pouco aparecem e tem pouca relevância, como Laura. A falta de objetividade do filme, que apenas faz a personagem principal seguir a origem dos barulhos e lá encontrar coisas bizarras, irrita e não progride como esperávamos. O final é audacioso, mas não vale a expectativa

O destaque é a “mão” do diretor. Hernandéz consegue fazer vários planos interessantes e belos com apenas uma fonte de luz – uma lamparina. É ela que ilumina o filme, o tempo inteiro, dentro da casa escura. A falta de luz e, consequentemente, a falta de informação de imagem na tela, nos faz ter medo do desconhecido, juntamente com o belo trabalho de som do filme, como Laura tem.  Realmente nos sentimentos na pele dela. O longa-metragem é, com certeza, inquietante (incluindo uma trilha sonora simples, mas que incomoda), mas nada a mais que isso.

Gustavo Hernandéz estreia bem em seu primeiro longa-metragem. Um filme interessante, original, plano-sequência, com poucos recursos – tanto técnicos quanto financeiros –, com excelente carreira comercial e acima de tudo – uruguaio, terra de poucas obras audiovisuais por ano, e que pouco explora o horror. Por estes motivos, já vale o ingresso.

Thiago Köche* é graduado em realização audiovisual pela universidade UNISINOS.

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Este post tem 2 comentários

  1. Author Image
    Devlon

    Ótimo filme podem indicar…

  2. Author Image
    Devlon

    claro…se a pessoa que vai vÊ-LO não tiver problemas cardíacos.

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