Curso de Cinema da UFPE

Cinema UFPE: Pernambuco sai na frente outra vez

Universidade Federal de Pernambuco inicia as atividades de seu bacharelado em cinema.

A tradição histórica não poderia cessar.

À revelia do atual marco histórico, Recife ganhava seu primeiro cinema há 100 anos atrás. O cine Pathé fora erguido na tradicional Rua Nova e exibia filmes realizados na Europa e nos Estados Unidos. Esta mesma rua chegou a abrigar três cinemas inaugurados todos no ano de 1909. A produção local já se instalava ao lado dos principais cinejornais mundiais abrindo os programas dos filmes de ficção. Desde 1920 a Pernambuco Filmes, dos italianos Ugo Falangola e seu sócio J. Cambieri, já produzia os chamados naturais, documentários feitos sob encomenda para o Governo do Estado. As conseqüências de tanta aproximação com a telona não tardaram a se manifestar; o Ciclo do Recife, na década de 20, foi o mais marcante dos Ciclos Regionais registrados no Brasil. Durante os oito anos de duração, 13 longas foram produzidos. Sem dúvida, um marco histórico.

Conseqüência imediata desta já ativa movimentação cinematográfica e injetando um novo ânimo a vida cultural da cidade, que passava por certa depressão decorrente da crise econômica enfrentada pelo Nordeste naquela década, jovens empreendedores resolveram investir na produção local. Apaixonados pelo cinema e pela possibilidade de filmar em Pernambuco, em 1925, fundaram a Aurora Filmes, produtora pioneira no Nordeste a funcionar com o objetivo de rodar longas de ficção. Para subsidiar as produções da nova empresa, realizadores chegaram a fazer um filme publicitário com enredo, estilo precursor em seu gênero que promovia a “Garrafada do Sertão”, mistura medicinal muito popular à época dita capaz de levantar qualquer doente. E, mais uma vez, Pernambuco saía na frente.

Estes filmes marcados indubitavelmente pelo modelo clássico americano foram suplantados pela chegada do som. Durante as décadas de 30 e 40 algumas produtoras ainda se instalaram na cidade fazendo filmes comerciais com importantes nomes a frente de suas fachadas. Estes cineastas iriam dar início a um ressurgimento da movimentação em torno do cinema no início dos anos 50 quando se fala de um “ciclo esquecido” na cidade. Surgiram cineclubes e a produção de longas de ficção foi premiada nos festivais nacionais. As filmagens da grande produção da época, O Canto do mar (1952) de Alberto Cavalcanti, movimentaram a cidade e o interior do estado. A estréia, inclusive, fora marcada por um acontecimento cinematográfico: um dos deputados convidados para a cerimônia foi assassinado às portas do cinema por questões políticas, aumentando o burburinho em torno do filme.

A década de 60 teve algumas produções em 16 e 8mm e revelou o diretor de fotografia Rucker Vieira. Sua luz dura, crua, sem refletores e rebatedores inspirou a estética do Cinema Novo. Pernambuco outra vez pioneiríssimo. Os filmes em 35mm voltariam na década seguinte com apoio institucional e incentivos de premiação do governo. Os realizadores estavam rumando a uma profissionalização institucional quando as empresas de material cinematográfico lançaram a câmera doméstica de bitola Super 8. “Arranje uma câmera, reúna uma turma, vá para a rua. A transa é filmar”: o título do artigo publicado no jornal, define bem o espírito dos realizadores da época. A tecnologia estava enfim acessível.

Durante um curto período, o Super 8 foi encarado como uma forma de escapar às pressões econômicas e estéticas do cinema comercial convencional e por isso se começou a falar de um “movimento de cinema marginal” no Recife. Foram produzidas cerca de 250 obras.

A produção da sétima arte ficou na década de 80 com cerca de 15 filmes rodados. Nos anos 90, porém, o Recife vivia um novo momento de efervescência cinematográfica, que dessa vez foi denominado de Árido Movie. O marco delimitador desse movimento foi o longa O baile Perfumado, de Lírio Ferreira e Paulo Caldas. Antes, dependente de relações cordiais estabelecidas entre os cineastas pernambucanos e os técnicos ligados ao curso de cinema da Universidade de São Paulo, hoje a cidade dispõe de técnicos, críticos e realizadores de projeção no cenário nacional. A tradição, iniciada em antigos períodos, vem se mantendo até hoje, quando Pernambuco se consolida como um dos mais fecundos pólos produtivos do Cinema Brasileiro, tanto do ponto de vista do profissionalismo de sua produção quanto de suas contribuições estéticas para o Cinema Latino Americano.

Diante de uma tradição histórica relevante e de um quadro atual tão propício, o Nordeste ainda apresentava carência de escolas que oferecessem a formação superior na área. Era hora, então, de Pernambuco assumir mais uma vez seu protagonismo. E, marcando o centenário de sua primeira sala de exibição, a Universidade Federal inicia as atividades do curso de graduação em Cinema, o primeiro da região. O forte desenvolvimento das atividades cinematográficas em Pernambuco e no Nordeste tem gerado uma demanda explícita, por parte de produtores culturais, cineastas e instituições culturais e governamentais em estimular a Universidade a assumir o papel que lhe cabe na formação de quadros qualificados para o cinema.

Com a proposta pedagógica freiriana, calcada no pressuposto de que o conhecimento não é algo transferível, Ângela Prysthon e Paulo Cunha, coordenadora e vice-coordenador da graduação, estão à frente de uma equipe multidisciplinar, que engloba mestres e doutores das mais diversas áreas da Comunicação Social e das Artes.  No âmbito do projeto, conhecimento e a aprendizagem são entendidos como a relação entre sujeitos e a realidade e “conhecer”, nesses termos, deixa de ser um produto ou estado e passa a ser uma ação humana sobre a realidade circundante.

A idéia central é que o Bacharelado em Cinema constitua uma comunidade de aprendizagem. Desse modo, a ênfase recai na construção do conhecimento pelo grupo, incluindo docentes, alunos, técnicos, ou mesmo o contexto produtivo, formado pelos realizadores e pelos produtores culturais. Todos deverão ter uma participação ativa ao longo desse processo. O estudante pesquisa, o professor também pratica, existe uma conexão entre a reflexão e a produção – e dessa forma os fenômenos são melhores relacionados entre si. O professor e/ou orientador passa a ser visto como integrante de um grupo que objetiva a construção do conhecimento. Sua função é promover desafios que estimulem a descoberta e a troca de informação, intermediando processos de interação entre os membros.

No foco do Bacharelado em Cinema da UFPE está a articulação da pesquisa, da crítica da cultura contemporânea e a da prática efetiva, que irá unir professores, estudantes, técnicos e profissionais. O currículo é versátil, flexível e condizente com esse modelo de atividade.  O programa é aberto e voltado para a realidade de um campo em constante mutação, o audiovisual. Não são conteúdos, mas lugares de discussão que orientam a formulação das disciplinas.

Visando ampliar a flexibilidade de trânsito dos estudantes no curso, e incentivando a construção cooperativa desse percurso, o currículo evitou as seqüências de disciplinas preestabelecidas e correlacionadas, não existindo, portanto, pré e co-requisitos. No caso de trancá-las ou ser reprovado, a formação do estudante não, necessariamente, irá atrasar.

As disciplinas propostas para o Curso de Cinema da UFPE contemplam as seguintes áreas de conhecimento: Teorias de Base, que abordam os fundamentos do Cinema e as diversas teorias conexas ao campo cinematográfico; Teorias Internas, que tratam dos diversos sistemas teóricos desenvolvidos no próprio quadro da experiência cinematográfica; Oficinas, que organizam as atividades direcionadas à construção do objeto cinematográfico; História do Cinema, que tratam do acervo histórico das experiências cinematográficas.

O curso segue com sua primeira turma, mas ainda passa por fase de ajustes técnicos. Subsidiado pelo programa REUNI do Governo Federal, o bacharelado está em fase de contratações de novos docentes e de aquisição de materiais. As salas de aula ainda estão em fase de aprimoramento estrutural e os laboratórios sendo devidamente equipados.

No momento, está se produzido um curta-metragem coletivamente entre os alunos e já ocorrem atividades de extensão como o Cineclube Contraplano e o Seminário de Realização, ambos acontecendo quinzenalmente. Nestas ocasiões, o público, seja universitário ou não, têm a oportunidade de conversar diretamente com os realizadores dos filmes exibidos.  Os encontros já receberam o cineasta Lírio Ferreira e o também realizador e crítico de cinema do Jornal do Comércio, Kléber Mendonça Filho, entre outras figuras de destaque na cena local.

A história do cinema Pernambucano, segundo o crítico Alexandre Figueirôa, se confunde mesmo com a estória das pessoas. O curso de cinema da UFPE pretende fomentar semelhante diálogo dentro e fora da universidade. O cinema no Estado tem tradição e qualidade e o curso de cinema da UFPE vem reivindicar seu papel neste contexto. Boa sorte a academia.

Camila Nascimento Martins é aluna do curso.

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Este post tem 6 comentários

  1. Author Image
    REGINALDO LIMA

    GOSTEI MUITO DA DESCRIÇÃO
    PENSO EM FAZER CINEMA APÓS CONCLUIR MEU CURSO ARTE E MÍDIA EM CAMPINA GRANDE E RECICE É UMA BOA OPÇÃO.
    ATUALMENTE CURSO GEOGRAFIA NA UFRN DE CAICÓ.

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    marcos

    eu sou proprietario de uma empresa de eventos e estou elaborando um projeto sobre cinema e queria obter ajuda sobre o assunto cinema…

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    Antônio de Hollanda

    Gostaria de saber onde encontro o Perfil curricular do curso de cinema.

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    tallyta

    vou tentar uma vaga nesse curso esse ano amo cinema e será um sonho se eu entrar =D

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    Antony

    Meu sonho é estudar cinema nessa universidade, espero que o curso seja bom

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