Para Roma, Com Amor (Woody Allen, 2012)

Por Thiago Köche *

O tour de Woody Allen pela Europa chega, agora, à Itália. Desde 2008, o diretor nova-iorquino vem tendo a prática de filmar em países fora dos Estados Unidos, por enquanto europeus, tendo visões americanizadas do Velho Mundo, com seu tradicional sarcasmo. Foi assim com Scoop – O Grande Furo (2006), em Londres, Vicky Cristina Barcelona (2008), em Barcelona, Meia-Noite em Paris (2010), em Paris e agora com Para Roma, com Amor (2012), em Roma.

Woody Allen vem alternando suas participações como ator em seus filmes. Desses listados, ele atua apenas em Scoop e em Para Roma, com Amor. Já é um bom motivo para ir ao cinema: voltar a ver Woody Allen atuando, mesmo que não seja como protagonista do filme.

Allen usa no roteiro deste longa o esquema de sketchs, no qual ocorrem várias histórias paralelas na cidade eterna, mas sem se interligarem. Temos basicamente quatro núcleos:

Judy Davis e Woody Allen

Woody Allen e seu genro: Jerry (Woody Allen) e sua esposa e Phyliss (Judy Davis) viajam para conhecer a família de seu genro, em Roma. A filha do casal, Hayley (Allison Pill), se apaixonou por um italiano assim que, perdida pelos pontos turísticos da capital, pediu informação para o mesmo. Jerry descobre que o sogro de sua filha, Giancarlo (Fabio Armiliato), tem uma voz maravilhosa para a ópera, ramo do mercado musical em que Jerry atuou. Porém, este talento só se mostra debaixo do chuveiro, enquanto Giancarlo toma banho. A comédia aqui está no culto e americano Jerry tentando convencer a tradicional família italiana de esquerda que o talento de Giancarlo é inestimável para que ele tenha como emprego somente uma agência funerária. Enquanto isso, a parte romântica fica por conta do casal recém-firmado e apaixonado, tentando lidar com o conflito dos pais.

Alessandro Tiberi e Penélope Cruz

Do interior para a capital italiana: Antonio (Alessandro Tiberi) e sua esposa Milly (a linda Alessandra Mastronardi), casal interiorano e tímido, viaja para Roma para conhecer os tios ricos de do rapaz e tentar se inserir no mundo de negócios da família. Milly se perde na cidade grande quando sai para cortar o cabelo, enquanto a prostituta Anna (Penélope Cruz, mais sensual do que nunca) invade erroneamente o quarto de Antonio para entregar um “serviço”. Milly não chega a tempo de conhecer os tios de Antonio e Anna tem que se passar como esposa do tímido rapaz do interior. Enquanto isso, Milly conhece o famoso ator do cinema italiano, Luca Salta (Antonio Albanese). A comédia aqui está no modo de se vestir e nos trejeitos de Anna, que destoam da high-society que Antonio tem que conhecer para ser um grande empresário romano, além da neurose e ansiedade do italiano, que irritam a moça descolada e despreocupada. Ao mesmo tempo, a comédia encontra-se no deslumbramento da professora do interior, Milly, com as fortes investidas de Luca Salta. A parte romântica fica com a relação improvável entre Anna e um cara certinho como Antonio, além da relação entre a não tão santa Milly e o galanteador barato ator italiano.

Roberto Benigni

Um famoso do nada: sem motivo algum, a imprensa italiana começa a perseguir Leopoldo (o sempre excelente Roberto Benigni), um clássico romano de classe média que tem uma vida chata e sem perspectivas com sua mulher e casal de filhos pequenos e que acaba ficando famoso na Itália inteira. A comédia está na mudança brusca da maneira de viver de Leopoldo e em uma forte crítica à nova mídia que supervaloriza inutilidades, como que tipo de pão Leopoldo comeu ou como ele se barbeia. A parte romântica está em como Leopoldo lida com o fato de que, da noite para o dia, vira alvo das mulheres mais bonitas de Roma, enquanto sua esposa sem sal o espera em casa.

Jesse Eisenberg e Alec Baldwin

Triângulo amoroso e Alec Baldwin: o jovem arquiteto americano Jack (Jesse Eisenberg) mora com sua namorada Sally (Greta Gerwig) em um charmoso bairro de Roma. Indo para casa, Jack encontra John (Alec Baldwin), arquiteto americano de renome que já viveu no bairro na mesma idade do rapaz. John faz amizade com Jack e o acompanha em suas andanças pela cidade. Em certo momento, chega à cidade a melhor amiga de Sally, a culta e interessante Monica (a impecável Ellen Page), pela qual Jack se apaixona. A comédia está em John seguindo sempre Jack aonde ele vai, tecendo comentários sobre o erro de se apaixonar pela melhor amiga de sua namorada. O romance está no triângulo amoroso entre Jack/Sally/Monica.

Como se pode perceber, em todos os núcleos do roteiro há a presença da comédia e do romance. Sim, trata-se de uma comédia romântica como os comerciais e cartazes do longa-metragem dizem. Mas não é mais uma comédia romântica comum, conhecida como “água com açúcar”, com atores limitados e aquele roteiro padrão, previsível e chato. Aqui temos um bom número de excelentes atores em em plena maturidade profissional (Woody Allen, Alec Baldwin, Penélope Cruz, Roberto Benigni), atores em início e consolidação (Jesse Eisenber, Ellen Page, Alison Pill), e atores europeus promissores (Flavio Partenti, Alessandro Tiberi, Alessandra Mastronardi), que dão veracidade ao filme que se passa em Roma (todo filmado lá, aliás). Obviamente, Allen não resiste em tirar sarro dos italianos: carros compactos por todos os lados, o jeito galanteador tanto dos romanos como das romanas, as infinitas ruelas e lombas pequenas e a clássica mania de dizer que tudo é perto quando na realidade é muito longe. A visão é sim americanizada e principalmente turística, mas não deixa de ter um pouco da Itália verdadeira, ao contratar atores italianos, ao filmar lá e claro, ao ter uma pesquisa prévia do local para escrever o roteiro.

O roteiro é recheado de traços de Woody Allen: encontros e desencontros, amor, sexo, traição e claro, todo aquele seu humor comedido, inteligente, mas que não deixa de render boas risadas. Tecnicamente, como sempre, perfeito – padrão hollywoodiano na Europa. Áudio e montagem invisíveis (que não se nota, não se sente, não se percebe os cortes de edição nem a mixagem de áudio), como devem ser em um filme com esta proposta. Na direção de câmera, Woody Allen, como sempre, poupa os planos detalhes e apela para os planos abertos, gerais, e no máximo, médios, enfatizando o seu ponto forte, a direção de atores, e não a estética cinematográfica, que raramente foi seu foco.

É por isso que os filmes de Woody Allen são tão atraentes e tão envolventes. O espectador é conduzido pelos atores, não pelo diretor. Quem assiste os admira pela atuação e dramaticidade do roteiro, e não por um plano revolucionário, uma troca de foco ousada ou uma montagem fragmentada.

Na simplicidade e sem esquecer o que o fez ser um dos maiores diretores de cinema da história, Woody Allen diversifica seus filmes com um simples e divertido modo: mudando de país onde roda os mesmos. Assim, Allen se reinventa e deixa de ser o mesmo.

* Thiago Köche é graduado em Realização Audiovisual pela universidade UNISINOS.

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Este post tem um comentário

  1. Author Image
    Georges

    O episodio do casal interiorano é cópia ipisis literis de “Abismo de Um Sonho” (Lo Scieco Bianco) de Fellini, de 1952…

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