Difusão de Filmes Estereoscópicos

Leonardo Antonio de Andrade é graduado em Engenharia de Computação pela Universidade Federal de São Carlos (1998); possui mestrado em Ciências da Computação e Matemática Computacional pela Universidade de São Paulo (2001). Atualmente é Professor Assistente da Universidade Federal de São Carlos. Tem experiência na área de Ciência da Computação, com ênfase em Metodologia e Técnicas da Computação, atuando principalmente nos seguintes temas: Compressão de Dados, Vídeo Digital e Estereoscopia, área de seu doutorado em andamento ligada à USP – São Carlos (ICMC) sob orientação do Prof. Dr. Rudinei Goularte.

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A questão da representação do espaço tridimensional foi talvez a mais importante contribuição do período renascentista às artes plásticas. A descoberta do método de representação do espaço tridimensional no espaço bidimensional vem de Filippo Brunelleschi (1387-1446) e Leon Batista Alberti (1404-1472), e foi denominou de perspectiva artificiallis. A técnica de representação teve sua origem em projetos de arquitetura desenvolvidos pelos dois autores. Está ligado à origem da perspectiva um pequeno aparato denominado tavolleta, que servia ao desenvolvimento daqueles projetos (Godoy, 2001).

Data de 1838 a patente de um engenho denominado Estereoscópio, feita por Sir Charles Wheatstone. O aparato era constituído de um jogo central de espelhos que refletiam dois desenhos de um objeto observado por ângulos ligeiramente diferentes um do outro, de modo que sua observação através dos espelhos permitia a sensação de visão binocular humana. Ou seja, descobre-se nesta época uma outra técnica representacional da tridimensionalidade espacial, utilizando-se de maneira mais avançada as características da visão binocular humana, já que era o cérebro que se encarregava de reconstituir a sensação estereoscópica. A Figura 1 mostra o Estereoscópio e seu funcionamento.

Figura 2.1 – Estereoscópio: a) Exemplo de Aparelho Estereoscópio e b) Esquema Básico de um Estereoscópio (Kirner & Tori, 2004)

Apesar de serem contemporâneos, o uso do estereoscópio com pares de fotografias data de meados de 1880. Foi nessa época que houve a popularização das máquinas fotográficas que tiravam pares de fotos estereoscópicas, e de livros que exploravam a estereoscopia para entretenimento (Adams, 2001). É importante salientar que quando as tecnologias de exibição de fotos estereoscópicas eram de baixo custo (em meados de 1880) sua disseminação era alta, contrastando com o momento atual, mais de um século depois.

Existem dois métodos consolidados de visualização em três dimensões para exibições coletivas, como é o caso do cinema. O método mais antigo é o anaglífico. A primeira experiência cinematográfica tridimensional com esse método foi em 1922, com o filme The Power of Love (dirigido por Nat G. Deverich e Harry K. Fairall). Essa técnica consiste em conferir duas cores diferentes para cada imagem referente aos olhos esquerdo e direito, de modo que o espectador, ao utilizar óculos com lentes que filtrem as cores desejadas, possa separar cada uma das imagens mescladas na tela.

Na década de 50 com o surgimento da televisão, desencadeou-se o processo histórico do declínio econômico do cinema. As produtoras cinematográficas norte-americanas procuraram formas de atrair a atenção do público e trazê-lo de volta às salas de exibição. Telas de grande formato (cinemascope), filmes coloridos e, também, o cinema em terceira dimensão foram usados nessa reconquista do espaço perdido para a TV.

O método utilizado nos anos 1950 é o da estereoscopia por filtragem de luz polarizada, no qual duas câmeras cinematográficas sincronizadas, montadas à distância interocular (cerca de 6,5 cm), produzem dois filmes referentes respectivamente à visão do olho esquerdo e do olho direito. Em uma tela metalizada é feita projeção sincronizada das duas películas, usando-se filtros polarizadores.

O espectador assiste ao filme de óculos, com filtros polarizadores iguais aos da projeção. Dessa forma, as imagens referentes a cada um dos olhos são filtradas de maneira que cada olho percebe somente a imagem referente à sua lateralidade. Em sistemas mais aprimorados, uma única câmera, através de uma objetiva especial anamórfica, forma duas imagens sobre uma única película. Depois, um projetor também equipado com uma objetiva semelhante reproduz aquela película gerando duas imagens separadas e polarizadas sobre tela metalizada. Da mesma forma, óculos polarizadores são necessários para a separação dos dois tipos de imagem.

Apesar de hoje existirem diversas tecnologias de exibição estereoscópica (Godoy, 2005), existem problemas tecnológicos de armazenamento deste tipo de informação em movimento que dificultam a disseminação das técnicas de visualização estereoscópicas aplicadas a vídeos digitais. Os arquivos que guardam informações estereoscópicas resumem-se a gravar informações dos dois vídeos em um único arquivo de tamanho maior, contendo as informações lado-a-lado (sibe by side) ou um sobre o outro (under/over) (Lipton, 1997). Com esse método de codificação, vídeos com número de linhas inferiores a 1024 linhas encontram limitações com as atuais tecnologias (tendo em vista a perspectiva de computadores pessoais) para serem exibidos.

Métodos de Codificação de Vídeos 3D para Difusão

Em meados de 2005, consegui uma cópia do filme Creature From Black Lagoon (Jack Arnold, 1954). Esta cópia deveria ser visualizada com um aparelho que controla óculos especiais (denominados “obturador”), que fecha a visão do olho complementar ao ser exibida na tela da TV uma imagem para um determinado olho. As imagens contidas nesse DVD são entrelaçadas, ou seja, a imagem do olho direito e a do olho esquerdo compõem um único quadro dividido em linhas pares e ímpares (sistema de estereoscopia de chaveamento de imagens). Foi extremamente frustrante ter em mãos uma mídia que continha informações digitais em três dimensões, mas não ter o aparelho para a visualização.

A partir da cópia digital do filme (em resolução baixa, cerca de 360 x 480 pixels para cada quadro), foi produzido um software para ampliar a resolução dos quadros e mixar seus canais de cor, para obtenção de quadros ciano-vermelho. Essa técnica anaglífica foi escolhida pela facilidade de projeção (usa apenas um projetor digital e óculos com filtros de cor para os espectadores).

Após desenvolver o software, todo o material digital foi processado para obter uma nova cópia. O próximo passo foi resolver a sincronização do áudio. Para esta função e para a aquisição dos óculos para os espectadores, surgiu a idéia de realizar um projeto de extensão universitária dentro da UFSCar. Foi contratado um bolsista (Daniel Roviriego, na época graduando do curso de graduação em Imagem e Som), que realizou a sincronização do som com áudio dublado em português.

Figura 2: Processo de extração do Canal Vermelho do Vídeo 1

e dos Canais Verde e Azul do Vídeo 2

Figura 3: Processo de composição do Vídeo ciano-vermelho

Esse processo representa uma alternativa mais viável para visualização de filmes em 3D pois transforma duas imagens captadas em uma única, sendo que essa nova imagem possui canais de cores separados, possibilitando a exibição a partir de um único projetor ou até mesmo na web. Mesmo usando duas câmeras digitais para captação, o custo atual é imensamente inferior em virtude das novas tecnologias apresentadas. Se você possuir os óculos 3D anaglíficos, acesse a Abertura do Filme Monstro da Lagoa Negra em 3D.

Esta restauração foi apresentada no X Socine, em outubro de 2006 em Ouro Preto. Para maiores informações sobre esta restauração, acesse a matéria Monstro Brasileiro Revive em 3D, da revista Ciência e Cultura.

Após desenvolver uma metodologia para codificação de vídeo estereoscópico (anaglífico), queria realizar uma produção com o material captado com câmeras coloridas. Em conjunto com os colegas Djalma Ribeiro e Pedro Dolosic realizamos a montagem de um filmadora 3D. Além da montagem da câmera, também realizamos a produção de um curta-metragem para ser realizado em 3D, de roteiro simples. Filme este em fase de finalização atualmente.

Para assistir o plano-seqüência de abertura do filme, acesse aqui; lembrando que é necessário o uso de um óculos 3D (com lente vermelha e ciano).

Bibliografia

(Adams, 2001) Adams, G. O passe de mágica do turismo fantástico: o sistema de viagem estereoscópica de Underwood & Underwood. Anais do XXIV Congresso Brasileiro da Comunicação. Campo Grande, MS. Setembro de 2001. Disponível em: http://reposcom.portcom.intercom.org.br/bitstream/1904/4646/1/NP7ADAMS.pdf em 10 de junho de 2007.

(Godoy, 2001) Godoy, H. Documentário, Realidade e Semiose, os sistemas audiovisuais como fontes de conhecimento. São Paulo, AnnaBlume/FAPESP, 2001.

(Godoy, 2005) Godoy, H. A. S. A Imagem Tridimensional e o Audiovisual. Publicado no site da Associação Brasileira de Cinema em outubro de 2005. Disponível no site http://www.abcine.org.br em 10 de junho de 2007.

(Lipton, 1997) Lipton, L. Stereo-Vision Formats for Video and Computer Graphics White Paper. Disponível em http://www.stereographics.com/support/body_stereo_formats.html em 10 de junho de 2007.

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Este post tem 5 comentários

  1. Author Image
    João B. Bortoletto

    Este tema de imagem e filme em 3D é muito interessante, eu mesmo tenho estudado sobre este assunto desde o ano de 1970.

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