Paraísos Artificiais (Marcos Prado, 2012)

Caminhos que se cruzam, hoje e amanhã.
Do diretor de Estamira, uma ficção que trata de sexo, drogas e música eletrônica.

Por Renan Lima *

Paraísos Aritificias é um filme jovem, sobre transformações, processos e aprendizados. Duas amigas, Érika (Nathalia Dill) e Lara (Lívia de Bueno) viajam de ônibus até o nordeste brasileiro, onde haverá uma festa rave. Lá, experimentam drogas e se envolvem emocionalmente. Érika é talentosa como DJ e acaba agradando os organizadores da festa, que a convidam para tocar em outros lugares. Paralelamente a isso, dois amigos, Nando (Luca Bianchi) e Patrick (Bernardo Melo Barreto), também vão a essa festa, conhecem e se envolvem com as meninas. Em uma segunda parte da história, na Holanda, alguns personagens voltam a se encontrar e relembrar histórias do passado.

A estrutura narrativa do filme divide a história em três partes/momentos: o presente, o passado distante (no Nordeste brasileiro) e o passado recente (na Holanda). Ao passear por esses três tempos vamos conhecendo os personagens, suas motivações,histórias e trajetórias. Nando se prepara para esse festival de música eletrônica há muito tempo, enquanto seu irmão, Lipe (César Cardadeiro), um fã incontestável do irmão enxerga no mesmo algo próximo ao que pode ser chamado de herói. Do outro lado estão essas garotas, que não sabemos muito bem de onde vieram e para onde estão indo, somente que vivem o momento e abusam da curtição. O filme foca nesse encontro e nas consequências, o rumo que cada um toma e como a vida pode dar muitas voltas e provocar novos reencontros. Algo muito forte acontece entre Érika e Lara, o que faz com que a primeira carregue um grande fardo a partir de uma experiência bastante intensa das duas com as drogas.

Uma marca registrada do filme e que o caracteriza na contextualização é o som. Tanto ambientação quanto trilha sonora nos dão a dimensão e a vibração do que podem representar essas festas de música eletrônica: tanto realidade, com a curtição da balada, o poder da música, a experimentação das drogas; quanto não-realidade, com a overdose, as pirações provacadas pelos usos de entorpecentes, a “viagem” e todos os outros momentos que transcendem o mundo real, situando a densidade desses personagens, seus medos, angústias e desejos. Ou seja, essa mixagem de sons coloca o expectador em uma experiência extra-sensorial. O som condensa a realidade desses jovens, e a trilha sonora tateia o quanto cada experiência pode ou não ser segura, seja por meio de inserções musicais, gritos, ruidagem muito forte e outros sons que transmitem sensações.

Arte e fotografia se combinam nesse universo de fantasia e realidade, mesclando aquilo que é atrativamente visual, como cores e formas variadas das festas rave: o dourado flamejante do fogo, o azul das luzes, a brincadeira com as maquiagens fluorescentes, os figurinos, muitas vezes claros e vivos com as cores do verão. Por outro lado, temos momentos mais densos no filme, principalmente aqueles em que podemos ver o efeito das drogas, quando se percebe que os personagens estão com a auto-estima muito baixa e ficam a beira da depressão completa. O escuro da noite invade os personagens, deixando-os ainda mais desolados e solitários. E é nesse lado obscuro que os personagens extravasam, expõem seus sentimentos e provocam algumas tensões.

A montagem entra para dar ritmo a esse roteiro com tempos dramáticos já fragmentados. É muito claro no filme onde está se passando cada situação, o que dispensaria a utilização de letreiros explicativos, de tempo e espaço. Essa opção se torna um pouco didática, enquanto que, uma outra, sem os letreiros, deixaria o espectador brincar e fantasiar quando e porque cada situação aconteceu, o que seria uma opção narrativa tão interessante quanto. Dentro das sequências, os cortes são precisos e muito bem atenuados, dando destaque também para essa diferenciação entre mundo real e fantasioso.

O filme expôe essa questão do universo das drogas e das festas rave de maneira bastante pertinente, um recorte de uma situação que pode acontecer fora da ficção. O filme não é moralista, na medida em que não tenta passar uma mensagem de não uso de drogas. Ele expôe o que pode acontecer, no limite, quais as consequências e como o sujeito terá que lidar com isso. Enfim, é uma exposição plausível de uma situação da vida real, de como ela decorre.

Com atuações femininas de destaque, Paraísos Artificiais retrata a vida de adolescentes que vão além para curtir o melhor som, da melhor balada e na melhor “viagem” possível. Poderia falar aqui de gêneros, sobre um enquadramento do filme enquanto road movie, mas talvez essa viagem e essa estrada estejam somente na cabeça dos personagens, não existentes na trajetória, e sim muito mais na ação e reação de cada ato.

* Renan Lima é graduado em Audiovisual pelo Centro Universitário Senac e atualmente atua como Assistente de Direção.

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