CRÍTICA | Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades (2022), Alejandro González Iñárritu

Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades

Por Fred Laffitte

Graduando em Comunicação e Multimeios, PUC-SP

Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades (2022), filme do diretor mexicano Alejandro González Iñárritu, acompanha o documentarista mexicano, mas radicado em Los Angeles, Silvério. Ele, após receber um prêmio, retorna a seu país nativo que desencadeia questões existenciais sobre suas origens, suas relações familiares, seu ofício e sua desconexão com sua terra nativa. Essa narrativa é construída com humor absurdo e onirismo particular.

Em Bardo, é possível traçar o caráter autobiográfico da obra, Iñárritu busca um retorno a alguma raíz cultural e não encontra. Isso forma o núcleo existencial do filme e cria uma experiência surreal, pois ele, diferentemente de seus conterrâneos, nunca foi um diretor mexicano no sentido que Alfonso Cuarón fez em Roma (2018) e Y Tu Mama También (2001). O único filme de Iñárritu que se passa completamente no México é Amores Perros (2000) que mesmo assim remete muito mais uma estrutura hyperlink a lá Pulp Fiction (1994) do que uma história mexicana. Iñárritu sempre foi desapegado com essa tradição e foi por um caminho mais da globalização, do cinema transnacional, mais moderno, e de certa forma, americanizado como Babel (2006). No entanto, para a academia, ele também é classificado como alguém de fora, simultaneamente aclamado e também criticado. Se de um lado, Iñárritu é arrogante e auto-indulgente, do outro ele sabe exatamente o que a crítica especializada pensa e sabe brincar e incomodá-los, o filme Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) (2014) ilustra esses dois lados perfeitamente.

Mesmo sob toda essa arrogância, justificada ou não, nesse último filme, ele constrói uma obra que assume todo seu ego em uma autoconsciência do quão ridículo essa posição consegue ser. Essa autoconsciência é uma faca de dois gumes, reconhece as falhas e o egocentrismo, mas não consegue evitar e sabe quais vão ser as críticas. É um filme que se posiciona diante das contradições e inseguranças do artista sem um propósito redentor ou de conciliação, só resta uma culpa, da qual soa verdadeira e de maneira contraditória ele não parece querer perdão e reconhece o absurdo nisso.

A partir disso, o filme também cria esse realismo mágico buscando inspiração na tradição literária latina, mas reconhece a sua desconexão com ela. Essas cenas oníricas e paradoxais que reverencia como um estrangeiro emulando do que um nativo e que funciona muito bem exatamente por esse ser o conflito principal, um artista sem origem. Tanto que essa emulação remete muito mais a um filme do Terrence Malick como Árvore da Vida (2011) com esse teor mais contemplativo do que os elementos oníricos e surreais de diretores como Federico Fellini ou de Luís Buñuel, por exemplo.

Porém, acho que o principal erro desse filme é nesse mesmo excesso de emulação de metáforas visuais, pois por mais que funcionam individualmente, acaba desvalorizando os momentos que cria pelo excesso. A cinematografia aclamada funciona nessa área por bem e por mal. É como se faltasse um certo desapego consigo mesmo, possivelmente fruto dessa arrogância, em oposição aos filmes de Malick que dizem que ele corta mais da metade do filme para fora. O filme põe a sua magia em um pedestal tirando ela do seu contato com a terra.

No final, toda a busca do protagonista termina na fronteira entre México e Estados Unidos. Se em 8 ½ (1963) de Fellini, o filme começa com o sonho de Guido sendo puxado de volta para terra para que não voe longe no litoral italiano, aqui, o personagem Silvério, tenta voar e só consegue na morte, mas não importa quanto voe, só há deserto em volta. O filme se assume nesse entrelugar cultural, o seu estado como diretor permanente atrelado a um país que nunca o aceitará completamente e a outro que se é um estado de mente, como o próprio filme afirma, a personagem após visitar, sofre um derrame.

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