
Por Gustavo Ramos Ribeiro
Redação RUA
Pra começar, o filme é um espetáculo de ambientação, a experiência de assisti-lo no cinema elevou completamente a imersão e todo o desconforto que o filme quer passar, por mais que tenha seus elementos aterrorizantes e sustos, a atmosfera é carregada no suspense, desconforto e a antecipação que alguma coisa vai acontecer, vai explodir. Iniciando-se com uma jovem Ellen Hutter, com uma atuação fenomenal de Lily-Rose Depp, pedindo a deus que a entregue um anjo companheiro, para lhe dar a companhia e o amor que sempre ansiava mas era negado a ela, ao invés de um anjo, o completo oposto aparece, e é onde somos apresentados ao vampiro Nosferatu, que em uma visão faz Ellen prometer que sempre será sua e de mais ninguém, e que um dia estarão juntos para sempre.
A forma que lidam com o vampiro e toda sua essência no filme é uma das melhores partes, eles fazem um arroz e feijão bem-feito e capricham no tempero, colocando a presença sombria e opressiva com poderes estranhos e rodeado em praga, mas que para conseguir tudo o que deseja, precisa do consentimento de Ellen e Thomas, para consumar a relação entre ele e a mulher que sonha com e persegue a anos, e tratando o vampiro da forma mais grotesca que pode ser, como uma sanguessuga que fixou os olhos em uma garota solitária e busca consumir toda a vida e sangue que ela possui, até de forma bem erótica, onde todas as cenas onde o vampiro morde e suga o sangue de outra pessoa é filmado onde os enquadramentos e o posicionamento dos atores dê um subtexto sensual a esses atos de consumo, com espasmos e reviradas de olho entre os gritos e mordidas.
O subtexto erótico contribui para a qualidade do filme do filme se elevar onde o vampiro, Nosferatu/Conde Orlok, interpretado pelo talentoso Bill Skarsgard é posto como um fruto proibido e profano na realidade do casamento feliz, sagrado, e tranquilo de Ellen e Thomas Hutter, o último interpretado por Nicholas Hoult, agindo como um marido amável mas distante e ausente, que não consegue passar tempo ou satisfazer as vontades da esposa por estar ocupado com o trabalho e ganhando dinheiro para a família, a ausência do marido entristecendo Ellen e jogando-a diretamente nas garras de seus traumas e a conexão com o vampiro, que conecta-se com a mulher pela solidão que sente.
Ellen Hutter é a melhor protagonista que a obra precisava, e a performance de Lily-Rose Depp merece todos os elogios possíveis, marcando o ponto principal da obra onde sua solidão é o que faz Nosferatu ficar com cada vez mais sede e tesão pela ideia de estar perto dela, essa solidão que é amenizada quando se casa com o marido Thomas, e inicialmente, parece tudo bem, até que o pensamento de ter que se distanciar dele por tanto tempo e se sentir largada as traças em relação ao trabalho, faz com que ela seja assombrada por pesadelos e visões conflitantes, onde para ela, ao mesmo tempo que é ruim, parece bom, e chega ao auge quando Thomas tem que sair a trabalho para encontrar-se com Conde Orlok em seu castelo.
Conde Orlok, usando sua presença como vampiro é revelado que tornou o chefe de Thomas um servo leal, e usando dessa conexão faz Thomas ir até seu castelo, o manipulando e fazendo que troque o seu casamento por uma quantia de dinheiro, e Thomas, que no caminho foi assombrado por povos locais e visões aterrorizantes, eventualmente tenta matar Nosferatu com uma estaca no coração, mas o conde acorda a tempo e contra-ataca, o mordendo e sugando seu sangue enquanto a noite continua.
Depois de preso por dias, vemos que Ellen está sendo assombrada pela presença do vampiro, que graças a Thomas e seu chefe, consegue um lugar para morar na mesma cidade que Ellen Hutter, e está a caminho, trazendo a peste consigo, e Ellen demonstra sinais do que os médicos do filme chamam de histeria, a amarrando e tentando conter seus espasmos e movimentos, trazendo uma crítica a situações onde mulheres que passavam por problemas mentais eram maltratadas e amarradas enquanto chamadas de histéricas, refugiando-se na concepção de que são mais sensíveis a emoções e devem se conter, pois a demonstração de fortes emoções é visto como algo vulgar.
Após a introdução do personagem de Willem Dafoe, uma versão maluca de Van Helsing, que é visto com um conhecimento sobre vampiros e é o único que acredita que Ellen tem algo mais sombrio a perturbando e um perigo vindo é onde o clima muda da calmaria opressiva e terror onipresente da primeira metade para um caos assustador e presenças mais ativas, onde o “Van Helsing”, Ellen, Thomas que consegue retornar para a cidade depois de eras, e o amigo de Ellen e Thomas, após ver sua esposa e filhos sendo mortos pelo vampiro, buscam acabar com esse mal e a praga que veio junto, enquanto Conde Orlok faz de tudo para trazer Ellen a seus braços e conseguir o consentimento da mulher para finalmente tomá-la como sua.
E nesse esforço Ellen se mostra a mais forte personagem da história, com o apoio do Van Helsing, ela reconhece o que tem que fazer e prepara-se para o momento mais difícil de todos, onde após noites rejeitando Nosferatu e todas suas ameaças, a mulher cede, permitindo com que o vampiro a morda e consuma seu sangue e carne por horas, até o nascer do Sol, e nessa hora, Orlok não tem para onde voltar, já que Thomas e seu grupo queimaram seu caixão e a mansão onde ficava, então perece em uma cena com uma iluminação linda, e fechando o filme com a final morte do vampiro.
A forma sensual de ser dirigido faz uma abordagem interessante e chamativa sobre a história de Nosferatu, com esse subtexto indo para o plano principal assim que vemos Orlok agindo e as conversas sobre solidão que Ellen tem com seu marido, que em um surto, mostra o seu pior, mais grotesco e sombrio, e Thomas tem a reposta certa onde ao ver sua esposa demonstrando esse lado e valida e a beija, finalmente entendendo o que ela quer e o que importa, a companhia, presença e o corpo são importantes, nessa presença sexual mais ativa do filme é deixada de lado o vampiro charmoso em troca de um conde grotesco e sujo, mas que excita e causa sensações conflitantes, deixando a relação de Ellen com esse novo grotesco ótima de acompanhar, e o protagonismo da moça é inquestionável ao mostrar que toda a força era dela, e a forma de parar esse mal, de fazer com que ele vá embora, é deixando vir, passar e evaporar, ao invés de pôr um filtro racionalista e jogar para debaixo do tapete, Ellen Hutter mostra-se forte ao confessar seus sentimentos,vontades e tesão, e na presença do grande mal, não sucumbir, e nos deixando embasbacos ao decorrer dessa obra de 133 minutos que passa como se fossem 50.