Editorial Outubro de 2013

Desde seus primórdios, o cinema busca em outras artes inspiração para seus enredos. Da literatura ao teatro, a grande maioria das principais obras da história já receberam alguma adaptação cinematográfica. Os tempos passaram, novas mídias surgiram, as possibilidades do audiovisual aumentaram e os públicos mudaram. Agora essa relação de flerte não se limita a literatura e ao teatro. Quadrinhos, games e até mesmo blogs e músicas servem de mote para roteiristas criarem produções audiovisuais. Além disso, a forma como essas mídias se relacionam não é mais a mesma. Além de servir como inspiração, esses outros formatos passaram a exercer papel ativo e integrado a esses produtos. O seriado americano True Blood é um excelente exemplo dessas interações. Além da trama principal, o programa se apropria da narrativa transmídia e produz conteúdos exclusivos em outros formatos, como uma história em quadrinhos e uma websérie. Outro recurso muito utilizado para divugalção de filmes com grandes lançamentos é a criação de uma coletânea de músicas inspiradas no filme, geralmente feita por artistas convidados, resultando em um material que não se preocupa em ser a trilha sonora oficial do filme, mas apresenta referências ao seu universo, criando um conteúdo original e, até certo ponto, independente. A própria linguagem cinematográfica passou a exercer novos papéis nessas interações, servindo de fonte inspiradora para esses meios, como é o caso da graphic novel Sinal e Ruído de Neil Gaiman, e seriados como Hannibal (que utiliza o personagem de O Silêncio dos Inocentes) e Bates Motel (que traz para os dias atuais a trama de Psicose), ambos lançados esse ano.

Quando pensamos em “Releituras no Audiovisual” não estamos estabelecendo um recorte temático que leve em conta apenas a adaptação enquanto a transposição de uma obra para uma narrativa audiovisual. Muitas produções se baseam em outras criações sem necessariamente se propor a reproduzir seu conteúdo, como é o caso do musical “Across The Universe”, que cria uma história inédita a partir de músicas dos Beatles. Acrescentemos também ao grupo os remakes, tão frequentes nos tempos atuais, especialmente em Hollywood. As vezes servindo como homenagem à algum clássico que merece ser redescoberto por novos públicos, por outras uma mera tentativa de se repetir o sucesso comercial atingido pelo original, o fato é que a maior parcela desses remakes precisa passar por adaptações que adequem a trama ao contexto atual. Ao escrever o roteiro de Mulheres Perfeitas, um remake feito em 2004 a partir do filme As Esposas de Stepford (que, por sua vez, é a adaptação de um livro), de 1975, o roteirista Paul Rudnick em parceria com o autor do próprio livro, Ira Levin, precisou adaptar as atitudes transgressoras de suas personagens femininas, e acabaram até mesmo acrescentando um personagem gay a trama. Como é possível notar, os exemplos são abundantes e as situações são múltiplas, eo tema não apresenta a limitação que uma primeira análise do assunto pode insunuar.

E são essas relações tão – tanto as tradicionais quanto as mais recentes – entre o audiovisual e outras linguagens que tornam esse debate tão pertinente. Indo muito além da pergunta “mas o filme é melhor que o livro?”, a edição #65 da RUA busca refletir sobre os desdobramentos desses diálogos, seja a integração de material televisivo com a internet, ou os desafios de se adaptar um clássico ao contexto contemporâneo. Mais do que analisar a fidelidade ou o purismo presente nessas adaptações, pretendemos ponderar em cada uma das nossas seções sobre o processo como um todo, suas motivações, resultados atingidos e como essas trocas podem ser muito ricas e, até mesmo, extremamente originais.

Henrique Rodrigues Marques

Editor Geral

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