Mocidade empoeirada

Crítica do filme: Os Jovens Baumann (Bruna Carvalho Almeida, 2019)

Texto por: Marina Lamas[¹]


Caminhar pelo tempo é entregar tinta e papel à memória – essa, costuma desenhar conquistas e devastações incógnitas. Olgária Matos, certa vez, designou o trajeto único do desmoronamento temporal: “Ruínas: ruído e lembrança. Em meio ao desaparecimento, são guardiãs do imperecível. São vestígios do invisível.” O cinema, como um eco travesso na temporalidade, carrega a aptidão tanto de resguardar quanto de criar lembranças. De obras como La Jetée (1962), com seu movimento confiante pelo tecido de não-acontecimentos, a outras como Inconfissões (2018), que reconhece o passado e nele habita, datas são traçadas em uma linha temporal fílmica. Com isso, apresenta-se nas telas o diálogo encontrado por Olgária entre o tempo, o ruir e o que ficou. Bruna Carvalho Almeida, em seu longa-metragem Os Jovens Baumann (2019), rodeia com a câmera tal conversa – mas nunca se aproxima o suficiente para escutar as reminiscências.

O passado presente

Apostando em found footage, a diretora nos leva a acompanhar as férias de jovens herdeiros que, em 1992, desaparecem subitamente – seus últimos rastros moram nessas filmagens caseiras encontradas em posterioridade. Com registros em VHS e se cercando de momentos lúdicos, o filme consegue construir um ambiente noventista e juvenil que, em desbalanço, é explorado de forma acanhada e repetitiva. Se em um primeiro instante os joguetes entre primos soam calorosos, eles logo passam a retumbar em um bis indesejado. Entre o cumprir de necessidades cotidianas e situações fragilizadas de incitação (a presumida tensão criada ao se estar à luz de velas), grande parte do caminhar soa como uma maneira de distrair os atores em set – que parece funcionar, já que o envolvimento das personagens em cena é uma das forças do longa. Nesse existir sem ser muito, todo o durante é erguido como uma desculpa. Uma promessa.

 Eles desaparecerão.

Futuro anulado

A narração em off, movida em tom embargado, é a responsável por constantemente afiançar um descolamento da inércia: o misterioso sumiço. A voz se movimenta apenas em auto-reafirmações de existir, sim, interesse. A violência contra os jovens acaba sendo, justamente, a fixação em insinuar a tragédia por vir. O presente é limitado a prenúncios; o fim, desconhecido. O desaparecimento dessas pessoas não ocorre com a súbita ausência, já que nunca realmente existiram em concretude. Os jovens se portam em uma história sem história. São fantasmas fabricados. Eles partem, mas memória alguma é construída para que o tempo pudesse escrever em saudosismo. A promissora ficção se torna precocemente senil. Meio às ruínas, os Baumann são feitos pó. 


[1] Marina Lamas, graduanda no curso de Cinema e Audiovisual do Centro Universitário Una. Procurando se perceber pelas ramificações do cinema, trabalhou na monitoria de festivais (16º MUMIA e 21ºFESTCURTASBH), na realização de curtas-metragens e, entre buscas, sempre se encontra com a escrita de críticas e análises fílmicas.

Esse texto foi desenvolvido como parte da Oficina de Crítica Cinematográfica ministrada pelo crítico Victor Guimarães (escritor da revista Cinética) durante a 13ª Mostra CineBH. Os textos selecionados dão direito ao autor de participar da 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes como Juri Jovem na Mostra Olhos Livres.