Crítica | My Night at Maud’s (1969), de Éric Rohmer

Por: Vinicius Marinho Siqueira.

O intelectualismo expresso em forma de amor, ao mesmo tempo que permeia as formas e capacidades humanas de se relacionar em emoções e razão, é bem expresso não somente no cinema quanto na literatura francesa. O orgulho da identidade de saber se posicionar, que lida com a apatia no sentido filosoficamente cínico de maneira natural, harmoniosa de certa maneira pacífica. Um tipo de dialética do cinema que envolve todos os sentidos psíquicos como trejeitos, formas de agir e pensar com a quididade natural dos atos vivenciados pelos personagens.

O filme nos põe uma pausa para reflexão pelos subtextos contidos na narrativa. Até que ponto a brutalidade e a selvageria se separa e encontra o ser? Alertas e preposições românticas, ora precipitadas ora como forma antagônica de se intimidar e seduzir, conquistando ligações para surgimento de ideais e contrapartidas. As questões naturais e semânticas de traços, aspectos que se relacionam com o real.

Na cena em que o personagem vai para o concerto de música logo no início do filme, há um corte entre o posicionamento dele na plateia logo que o plano fica voltado somente para os músicos no palco, na maneira que o enquadramento nos evoca para aquela ambientação. Proposições metafísicas a respeito das vicissitudes da vida, intenção e atenção que as pessoas causam umas nas outras.

No meu ver o cinema francês, de maneira muito própria, conduz o realismo poético com a psicologia literária de Balzac no livro O pai Goriot, de maneira pouco similar em relação a cinemas de outros países. Inclusive em amplitude moral e exposição íntima dos personagens, onde as particularidades, pensamentos, divagações e proposições mundanas são retratadas com clareza. Uma espécie de ápice exterior sem “estereótipos” (sem intenção de formar a partir de técnicas e linguagens da imagem obliterar a motivação, ímpeto do personagem) mas com simples detalhes em diálogos e atitudes que fecundam a amplitude de seres racionais, implicando questões morais, cristãs, filosóficas com suposições e variáveis.

Isso é algo que muito me atrai no cinema Francês, essa pesquisa complexa e constante pelo desejo e a proeminência de ideias por causar na vivência interpessoal. Até que ponto esses princípios moldam não só a capacidade humana, mas o que há de atrativo entre uma pessoa e outra. Espécies de provas e experimentos sociais que é evidente na maioria dos filmes, porém expresso na capacidade de estar vivo e presente, de forma que a emoção trabalha em função do racional mas não necessariamente depende disso para acontecer. São ímpetos divagações tempestuosas que surgem a partir do acaso onde se juntam exposições do cotidiano com vivências em sociedade.

Isso retrata de certa forma o platônico como algo infantil, assim como no curta metragem dirigido por Truffaut e Godard Les mistons, a descoberta pueril faz parte do convívio. “Coexistência antagônica” poeticamente falando aventureira, sem perder a espiritualidade puritana no sentido ético e moral, deixando com que o universo proposto interaja com os devaneios vivenciados pelas pessoas,circunstâncias nos moldam ou nós moldamos as circunstâncias?

Às vezes pelo simples desejo de promover ou desvendar os sentidos que nos permeiam, sem deixar de experimentar e inovar na autonomia dos acontecimentos, as mulheres sempre à serviço da criação, do choque entre o que se pode alcançar e almejar e o que a arte, essa força matriz gera, colocando em cheque o atrito necessário para se expressar artisticamente e a ideia de que é necessário que a arte esteja sempre confortável em suas perspectivas e proposições fidedignas ao estático. A intenção trabalhando a favor de uma construção duvidosa, as perguntas inalcançáveis que de certa maneira nos motiva a pensar e de forma espontânea e criativa.