6º CONTATO: Debate – Distribuição Audiovisual Independente – Novos Meios de Exibição

Por Jéssica Agostinho *
Fotos por Nayton Barbosa *

Estava programado para as 14h, no Auditório da Reitoria (UFSCar), o Debate sobre Distribuição Audiovisual Independente. Apesar do atraso, o encontro foi altamente profícuo e interessante. Estavam presentes como facilitadores do debate, Paulo Ricardo Dias Florentino, membro da Rede Fora do Eixo e da distribuidora online DF5; Prof. Alexandra Pinto, coordenadora do Cine UFSCar; Maurício Zattoni, responsável pelo audiovisual na Coordenadoria de Cultura da Prefeitura de São Carlos; Carlos Eduardo Magalhães, cineasta e realizador e Marta Kawamura, realizadora e integrante da Produtora Magma Filmes.

Após a apresentação realizada pelo integrante da equipe do 6º CONTATO, Gabriel Ribeiro, os convidados presentes na mesa passaram a fazer suas considerações e problematizações a respeito da distribuição das produções audiovisuais independentes.

Gabriel Ribeiro, Paulo Florentino, Alexandra Lima, Maurício Zattoni, Carlos Eduardo

A necessidade de mudança no sistema de distribuição, uma velha conhecida dos realizadores independentes brasileiros, para os quais atingir o público é sempre um desafio, foi uma constante no debate. Para abordar como essa inovação pode acontecer e quais os caminhos, falou-se do sistema tradicional de distribuição. No sistema tradicional, em uma visão puramente comercial do cinema, a distribuidora funciona como intermediador entre o realizador e o exibidor, estando o público ao final da cadeia.

Após citar o documentário A Política do Cinema, Maurício Zattoni falou sobre algumas estratégias frequentemente utilizadas pelas distribuidoras que acabam por pressionar os pequenos exibidores. Podem ser citadas duas situações, sendo uma delas a divisão percentual entre distribuidor e exibidor do valor arrecadado de cada ingresso vendido.  Não tendo tantos custos fixos como tem o exibidor, a distribuidora recolhe-se em uma zona de segurança, não sofrendo muito as consequências de uma baixa bilheteria e arrecadando muito no caso contrário. Na segunda situação, a distribuidora negocia um valor fixo para que o exibidor possa adquirir determinado filme. Assim, o dinheiro arrecadado com a bilheteria, se ultrapassar esse valor fixo, gerará lucro ao exibidor. Mas, se não ultrapassar, o prejuízo será exclusivo dele e, mais uma vez, a distribuidora não sofrerá nenhum risco.

Tendo-se em mente a necessidade de renovação dessa sistemática que prejudica o realizador, o exibidor e até mesmo o público, que não tem acesso a diversas obras e enfrenta os altos preços de ingressos, foram apresentadas novas possibilidades e alternativas de distribuição independente. Nessa medida, Paulo trouxe a experiência da criação da distribuidora online DF5, cujo nome já aponta para a necessidade de atualização do mercado audiovisual, brincando com o atalho de teclado para a atualização de páginas na internet. Paulo ainda salientou que uma distribuição eficiente, que, de fato chegue ao público, incentiva a própria produção audiovisual. Carlos Eduardo ainda complementou relembrando a criação da DF5, que se deu através de troca de e-mails entre cineclubistas. Foram citados dois filmes que marcaram a trajetória da distribuidora, O Assassino do Bem (São Carlos, 2010) e Cartão Postal (Rio de Janeiro, 2011), que não possuíam um público especifico, mas que atingiram cerca de 10 mil espectadores através da DF5.

Ainda abordando estratégias de distribuição, Maurício citou a Programadora Brasil, que através de processos periódicos de inscrições, mantém um extenso catálogo de produções e as disponibiliza para uma rede de cineclubes e pontos de exibição. Essa maneira de distribuição vai além do período de “vida útil” comercial de um filme, sendo que a obra ainda poderá ser exibida por muito tempo após sua realização. Outro ponto interessante é o feedback oferecido ao realizador, com informações sobre os efeitos no público e sobre as exibições. Ele ainda falou a respeito do Cine Mais Cultura, uma rede de acesso facilitado, que reúne mais de mil cineclubes. Como filmes ícones desse contexto, foram citados Terra deu, Terra come e Acácio.

Outro ponto bastante discutido e relembrado é a atividade cineclubista como uma alternativa para o escoamento da produção independente. Alexandra relembrou, em sua fala, que o cineclubismo há muito ocorreu paralelamente aos sistemas comerciais, sendo fundamental para a formação de diversos cineastas e pensadores. A atividade cineclubista ainda é muito presente – como a Pós TV abordou em sua edição de quarta-feira – e foi relembrado o Cine São Roque, cineclube desenvolvido no distrito de Água Vermelha, em São Carlos, do qual Carlos Eduardo fez parte e afirma ter sido de fundamental importância em sua carreira cinematográfica. Cabe aos próprios realizadores expandirem suas estratégias de distribuição para além dos circuitos de festivais e encararem os diversos cineclubes existentes como canais bastante produtivos.

Marta Kawamura

Os realizadores presentes na mesa, Carlos Eduardo e Marta Kawamura, compartilharam suas experiências com a distribuição de determinadas obras. Marta relembrou a realização de Dayane e Zé Firo, que, através do intermédio da Programadora Brasil, compôs, com outros curtas-metragens, o DVD “Animações Infantis”. O DVD percorreu diversos cineclubes espalhados pelo Brasil, sendo que a remuneração foi realizada no ato da aquisição do filme e através de uma quantia simbólica para cada DVD adquirido. Ainda foi citado o documentário Mestre Izael, que envolveu, em sua estratégia inicial de distribuição, apenas 100 cópias e a disponibilização gratuita na internet. O documentário atingiu um público específico, tendo em vista que “Izael Teixeira é Mestre de Capoeira na Pena de Ouro, a mais antiga associação de capoeira em funcionamento em São Carlos”, vendendo cerca de 300 cópias. O valor arrecadado era dividido entre o custeamento da mídia, a produtora Magma e para uma associação de capoeira. Outro projeto extremamente interessante desenvolvido pela Magma Filmes é o ensino de audiovisual para mulheres de terceira idade, contribuindo para a comunicação popular. Para acessar o blog do projeto, clique aqui. Em contraponto a filmes já realizados, Carlos Eduardo trouxe a experiência de um filme em produção: Delírios de um Cinemaníaco, longa-metragem baseado na vida de Zé Pintor, personalidade sãocarlense que realizou diversos filmes na década de 1960. O filme estreará dia 10 de novembro, no Cine São Carlos. É interessante apontar aqui, algo também abordado na mesa, a respeito da inserção dos filmes independentes também no circuito comercial. Pequenos exibidores, como o Cine São Carlos ou aqueles que possuem exibição digital, são possibilidades a serem exploradas.

Cena do filme "Delírios de um Cinemaníaco"

Prof. Alexandra mencionou que, resguardadas as exceções, as tecnologias e mídias estão mais acessíveis do que nunca e os realizadores independentes podem vir a ter acesso às novas possibilidades de distribuição. Relembrou o filme argentino A Educação Proibida, já exibido no Cine UFSCar, que foi inicialmente pensado para a internet e atingiu grande público.

Durante o espaço aberto para as perguntas do público presente, voltou-se na problemática do sistema comercial de distribuição, relembrando os fatores que contribuem para que os filmes brasileiros não cheguem em abundância aos cinemas de grande porte. Fatores como a pressão exercida pelas grandes distribuidoras, o marketing milionário televisivo e a compra dos “pacotes” de filmes americanos, que, para adquirir um filme específico, é necessária a compra de diversos outros filmes menores. Lembrou-se que a própria ANCINE (Agência Nacional do Cinema) não estimula o desenvolvimento de boas estratégias de distribuição, não reconhecendo números de espectadores provenientes de exibições cineclubistas e limitando o gasto de distribuição a 30% do valor investido na produção.

O debate encerrou-se questionando se estaria esse tipo de cinema – das grandes distribuidoras, dos ingressos caros e salas esvaziadas – chegando ao seu fim. Relembrou-se, através da fala da Prof. Alexandra, uma experiência encantadora de novas possibilidades de exibição, figurada em José Luiz Zagati, o sucateiro de São Paulo que montou em sua própria garagem uma sala livre de cinema.

* Jéssica Agostinho e Nayton Barbosa são estudantes de Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos e editores da RUA.

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