Mesa: Cinema, Barbárie e Nazismo na XII SOCINE

A mesa sobre cinema, barbárie e nazismo foi realizada logo no início da manhã e posso dizer que foi um belo jeito de acordar para o restante do dia. Iniciou-se, infelizmente, com problemas técnicos (bem semelhante a outras mesas para falar a verdade), mas depois que engatada foi muito satisfatória.

Iniciou-se a mesa com a apresentação “Nazismo animado: construção da Alemanha Nazista pelos estúdios Disney” da Mestranda Bárbara Marcela Reis Marques de Velasco (UnB).

Bárbara baseou sua palestra na análise do desenho animado “Education for death”, de 1943, dos estúdios Walt Disney. Ela se esforçou para conseguir passar-nos o desenho, mas quando conseguiu valeu a pena. Analisou superficialmente a questão dos traços, do jogo de claro e de escuro e dos contornos grandes na configuração do personagem nazista versus os cidadãos “indefesos”, e focou-se, acredito que por falta de tempo, na narrativa básica, que já diz muito por si.

A narrativa do desenho acompanha o crescimento de um menino chamado Hans na Alemanha nazista. O discurso de Bárbara aponta como o ambiente escolar retrata uma incitação a violência e, por fim, uma dominação do cidadão pelo ideal e comportamento nazista, além da conseqüente repressão da identidade em nome da construção da massa que faria da Alemanha Nazista um” grande país”.

O desenho, obviamente, não é direcionado para o público alemão e sim para os aliados. O cinema como arma e propaganda versus um inimigo, aqui não retrata o lado do “Bem”, isto é, o lado americano, de fato. A Guerra de ideais é implícita e a propaganda dos EUA se dá pelo retrato negativo do inimigo. O oposto do que acontece no documentário analisado pelo Doutorando Miguel Freire (UFF), O Dia da Liberdade, filmado em 1935 por Leni Riefenstahl.

O trabalho intitulado “A fala do Füher chega a Tag der Freiheit” propõe uma análise do documentário O Dia da Liberdade como uma transposição do discurso de Hitler feito em Luitpold Grove, em 1934, no qual se dirigiu à juventude alemã no filme O triunfo da Vontade, de Leni Riefenstahl.

O Dr Miguel aponta como se construiu a essência do discurso de Hitler através da escolha de planos, ângulos, movimentos de câmera, fusões, trilha sonora, enquadramentos, etc. O documentário, segundo Miguel Freire, pode ser considerado bipartido. Tem-se a Alvorada, caracterizada como o hoje e o futuro sendo fruto de uma nação unida, construída pelos jovens tal como incita Hitler em seu discurso de 1934. Tem-se a noite, como signo do passado, do que precisa ser deixado para trás e de onde precisa renascer, com confiança para uma nova nação e um novo homem.

O Prof. Dr. Antônio da Silva Câmara (UFBA) também falou da barbárie, mas felizmente não tocou na questão do nazismo. Felizmente, não porque o nazismo deve ser enterrado, de maneira alguma. Obviamente nossa história e seus percursos sombrios devem mais que serem analisados e trabalhados, mas o presente não deve ser deixado para trás nas pesquisas simplesmente porque o hoje em geral é mais difícil de analisar.

Seja como for, o último trabalho apresentado foi “A barbárie no cinema documentário”. A época discutida então é o pós 11 de setembro de 2001, a partir do filme “Caminhos para Guantánamo” do diretor Michael WinterBotton.

Antes de adentrar no filme de fato, o Prof. Dr. Antonio discutiu a invasão do governo americano no Iraque e no Afeganistão, fatos que se aproximam muito da atitude do mesmo país na América Latina, na época das ditaduras militares. A tortura em ambas as épocas foi um aspecto infeliz de dominação e Antônio apontou o quanto traz uma acentuada destruição da existência humana e das relações.

Com os ataques de 11 de setembro, o governo americano não reconheceu o estatuto político do grupo terrorista que apontou responsável, classificando-os como não cidadãos; desrespeitou a Convenção de Genebra e usou do “Vale tudo”, se assim pode-se dizer.

Perguntou-se, então, o professor remontando a Adorno na época da Alemanha Nazista, porque os indivíduos cometem atrocidades sob condições de mando? Porque soldados sem passado de violência cometeriam tortura?

O gênero documentário – tomando aqui toda licença das armadilhas dessa rotulação – parece ser o espaço para a representação de situações limites, como a perda da civilidade, enquanto a ficção perde esse aspecto ao limitar-se aos dramas do cotidiano, com a construção de heróis. No documentário “Caminhos para Guantanamo” vemos um documentário que comprova o gênero como o meio dessa discussão conjugando questões posta pelo Prof. Dr.: cinco jovens ingleses de origem muçulmana foram presos no Afeganistão por suposta participação nos atentados de 11 de setembro e ficam meses na base de Guantanamo. Vê-se a reconstrução de momentos de tortura, humilhação e terror… Vê-se o “vale tudo” e até mesmo a fetichização da dor alheia.

Todas as apresentações, assim, trataram da barbárie no passado, no presente e em vários aspectos – a denuncia da barbárie que se configura mais como uma propaganda, a propaganda de um ideário que incitou a barbárie e a denuncia dela, por fim. A mesa, apesar dos problemas técnicos, de fato foi frutífera e as apresentações instigantes e organicamente ligadas, o que, infelizmente, não aconteceu em outras mesas e/ou seminários que presenciei.

Suzana Bispo é graduanda em Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)

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