CINECLUBE | A Dama do Lotação (1978), Neville D’Almeida

Por Nícolas Martins

Cineclube “Da RUA ao CAIS”

No texto que introduziu a programação “Nelson Rodrigues no Cinema”, tema do mês de agosto do Cineclube “Da RUA ao CAIS”, mencionei como as histórias elaboradas pelo autor na literatura e no teatro incorporaram diferentes movimentos e tendências do cinema brasileiro. Em A Dama do Lotação (1978), de Neville D’Almeida, temos o que provavelmente foi a expressão máxima de suas histórias nas telonas: a pornochanchada. 

Isso pode parecer um contrassenso. Por muito tempo, a pornochanchada foi vista como um gênero puramente comercial, tanto pela grande imprensa quanto pelos cineastas autorais do Cinema Novo, como Glauber Rocha e Nelson Pereira dos Santos. Porém, o que se percebe no visionamento de A Dama do Lotação, é de que existe espaço para o exercício de uma autoria dentro de uma produção, à princípio, intensamente industrial. 

Na obra, é possível identificar diversos traços de uma linguagem cinematográfica moderna. Por exemplo, os planos gerais que buscam enquadrar vários elementos de cena e personagens. Além disso, a montagem também não busca acompanhar o diálogo simetricamente. Em ocasiões, ouvimos a fala de um personagem e a resposta do outro, com a câmera permanecendo em um close do primeiro falante. Esse trabalho de linguagem se mostra de extrema importância para a condução de uma pornochanchada, que busca trabalhar a relação entre corpos e a sexualidade. A linguagem busca sempre essa conexão entre personagens e elementos, seja dentro ou fora do plano. 

Além disso, é válido ressaltar o papel da direção de arte na construção de sentido do filme. Assim como em Sete Gatinhos (1981), outra adaptação de uma obra do Nelson Rodrigues por Neville D’Almeida exibida no cineclube, existe o jogo com as cores brancas e vermelhas do figurino. O branco representaria os “bons costumes” de uma classe média-alta carioca e o vermelho representaria um rendimento à sexualidade. Não só isso, mas o trabalho de cenografia é bem detalhado em torno dessa pequena burguesia do Rio de Janeiro, evocando novelas comumente produzidas na época em torno de personagens que pertencessem a essa classe. 

Por fim, A Dama do Lotação (1978), de Neville D’Almeida, triunfa ao nunca se esconder por trás dessa autoria que, supostamente, separa um filme de “alta arte” do filme de “baixa cultura”. Frontalmente, Neville busca colocar a sua pornochanchada como ela é, com todos os contornos comerciais que a tornaram a sexta maior bilheteria do cinema brasileiro.  

A Dama do Lotação será exibido como parte da programação “Nelson Rodrigues no Cinema” que compõe o mês de agosto do cineclube “Da RUA ao CAIS, no auditório do CECH na UFSCar, às 14h. 

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