Conhecido por sua obsessão estética pela montagem rápida e frenética, que tem origem na infância televisiva do diretor e por explorar em suas obras temas como o vício, a indiferença e a eterna busca pela verdade ou resposta, Darren Aronofsky vem se destacando e ganhando rápido reconhecimento da crítica e do público.
Nascido em 12 de Fevereiro de 1969 no Brooklin, Nova York, o diretor é formado na Universidade de Harvard, onde realizou seus primeiros trabalhos audiovisuais.
Seus dois longas-metragens analisados nesse trabalho, Pi e Réquiem para um Sonho apresentam elementos cinematográficos semelhantes, tanto esteticamente como em seu enredo, que seriam repetidos em seus trabalhos mais recentes.
Aronofsky utiliza métodos não convencionais para contar suas histórias, além de explorar as diferentes áreas do cinema para construir uma tensão que ultrapassa a barreira que separa o personagem que sofre a ação e o espectador que assiste. Os elementos visuais e estilísticos são ferramentas utilizadas para exteriorizar seus personagens. Os enquadramentos, os efeitos sonoros/musicais e a edição frenética e rítmica contribuem para o desenvolvimento dessa tensão, assim como a clara caracterização do protagonista.
O diretor desseca seus personagens explorando suas personalidades psíquicas e cerebrais, obrigando o espectador a experenciar as sensações e angústias dos próprios protagonistas. O filme atua, nesse sentido, como um espelho que reflete a experiência do próprio espectador, absorvendo emocional e intelectualmente aquele que assiste.
A narrativa também apresenta um completo retrato dos personagens e seus problemas emocionais, tentando assim transcender a divisa que separa o filme de seus espectadores, proporcionando uma experiência muito mais interpessoal.
Em Pi, ao mesmo tempo em que apresenta uma trama intelectualmente intrigante, o filme não é de fácil absorção, recria a experiência perturbada interna do personagem principal ao mesmo tempo em que nos mostra sua angústia e busca existencial através de sua visão de mundo sempre com câmeras subjetivas.
Já em Réquiem para um Sonho vemos a degradação dos personagens e seus conseqüentes isolamentos em busca de seus sonhos individuais.
A decupagem é extremamente bem articulada e em ambos os casos busca atender a demanda da direção nessa busca pela subjetivação dos personagens. A abundância de planos detalhes é uma característica marcante no diretor, muitas vezes começando uma seqüência com planos muito próximos que impedem o espectador de se localizar no espaço da ação. Ainda somado a essa estética, a quebra de eixo é muito comum e distorce a perspectiva do espectador, que ao se perder, entra no universo caótico do personagem.
Nesse trabalho procuramos mostrar como as diferentes áreas são utilizadas por Darren Aronofsky para complementar a sua proposta de direção e quais elementos estéticos são recorrentes em seus filmes.
Roteiro
A narrativa, tanto em Pi quanto em Réquiem para um Sonho, acompanha a opção estética do diretor (ou vice versa). Diferentemente do cinema clássico, Aronofsky conta suas histórias utilizando os recursos cinematográficos, evitando a simples adaptação literária com forte utilização dos diálogos como acontece na televisão.
Darren Aronofsky é conhecido por sua obsessão em explorar temas existencialistas em suas obras. A relatividade da realidade é exposta seja através do contato direto dos personagens com o mundo das drogas, seja com o questionamento crítico da vida. As relações humanas entre os personagens são deficitárias, pois todos buscam suas verdades através de um autoconhecimento interior.
Em Pi, Maximillian Cohen (Sean Gullette) é um homem brilhante e atormentado, que está prestes a fazer a mais importante descoberta de sua vida: decodificar o padrão numérico por trás do mercado de ações. À medida que vai se aproximando da solução, o caos vai engolindo o mundo à sua volta. Ele é perseguido por uma agressiva firma de Wall Street determinada à dominação financeira, bem como por uma seita que tem a intenção de desvendar os segredos por trás de seus antigos textos sagrados.
Sua busca pela “resposta” o impede de aceitar outros pontos de vista a respeito de sua vida e do mundo que o cerca. Essa alienação é demonstrada ao espectador através das subjetivas e planos detalhes e a decupagem traz o espectador para dentro da imagem. A paranóia atinge o clímax durante as várias crises de dor de cabeça que Max sofre durante o filme.
A mania de perseguição do personagem e sua isolação do mundo exterior devido sua crise interna são elementos que se repetiriam no roteiro de Réquiem. Em seu segundo longa-metragem, o diretor utiliza a questão dos vícios como principal motor de sua narrativa.
Os personagens principais buscam sua felicidade através de sonhos regados por ilusões que vão se desmanchando ao longo do filme. Desprovidos dessas defesas, os personagens entram em um colapso social e acabam vivendo exclusivamente seus vícios internos, esquecendo seus principais objetivos apontados no início do filme.
Aronofsky narra a história com personagens reais, com problemas reais em um contexto socioeconômico que acaba influenciando escolhas e opções. As buscas internas são deparadas com problemas financeiros e a moral, principalmente em Réquiem, é modificada conforme as necessidades dos personagens. A trama é sempre recheada de recursos cinematográficos característicos que se espalham desde a fotografia, efeitos sonoros/musicais, e a montagem.
Devido a isso, o espectador é convidado a adentrar essa catarse horripilante juntamente com os personagens. Ao contrário da clareza pregada pelo cinema clássico, vemos um quebra-cabeça na narrativa e muitas vezes não entendemos o que se passa na cabeça dos protagonistas e porque assumem certas decisões. Essa ausência de informações fundamentais deixa o espectador perdido e opciona um maior leque de entendimentos e verdades.
Fotografia e Arte
A fotografia e direção de arte dos filmes Pí e Réquiem para um Sonho são pensadas a partir de uma proposta geral dos filmes, como já mencionado acima: entender, identificar-se e sentir na pele as personagens principais. A escolha da tonalidade e do tipo de iluminação, as cores privilegiadas e as lentes escolhidas têm papel de nos transferir para o universo dos protagonistas e, em última instância, fazer-nos sentir suas obsessões na pele.
Em Pi, Aronofsky escolheu uma fotografia em preto e branco. Fruto de uma maior exposição, o P&B aqui é duro com pretos vezes granulados e brancos “estourados” – não se tem quase os meios tons (cinzas). É o preto no branco.
Essa escolha traz o espectador para mais próximo de Max, o protagonista. Max enxerga o mundo assim como enxergamos a imagem de Pí: um mundo em que não há meios termos, mas sim respostas exatas, medidas exatas e, acima de tudo, um padrão.
Além disso, vale dizer que essa estética de grande contraste e sem nuances de cor praticamente não é agradável aos olhos do espectador, ainda mais quando nos deparamos com esse tipo de imagem por um longo tempo. No entanto, o mundo da personagem também não é agradável e muito menos confortável – Max carrega uma obsessão e angústia que é traduzida frame a frame pela escolha estética.
A transposição do espectador para a pele de Max é feita assim, parcialmente por essa visão de “preto no branco” e também por esse quase constante e angustiante contraste. Juntamente a esses fatores, temos o uso de diferentes lentes. A lente que se destaca aqui é a grande angular. A grande angular confere às cenas maior perspectiva, o que está em primeiro plano ganha maior volume e é mais destacado do fundo. Max é felizmente captado, por vezes, com tais lentes, pois tem seu universo muito bem desenhado, visto que é uma personagem que se isola e se fecha num mundo próprio. Imerso em seu mundo, vemos Max em primeiro plano, destacado num espaço (ou até mesmo do espaço!) em processo constante de isolamento.
Em Réquiem para um Sonho temos muitas características de Pí que permanecem, no entanto, o P&B desaparece assim como seu grande contraste. Tem-se uma escolha de cores e luzes com tonalidades que se misturam entre branco, amarelado, marrom médio e esverdeado principalmente. As paletas de cor principal assim como a iluminação acabaram servindo para dar uma ambiência sem vivacidade por todo filme que analogicamente se liga a vivacidade que as personagens têm consumida por suas obsessões na trajetória do filme. É claro que, na evolução dos filmes, algumas cores são introduzidas e ora outras são privilegiadas, mas elas sempre caracterizam os personagens. No bloco em que as personagens estão decaindo (em variados sentidos), por exemplo, as cores muitas vezes tendem para uma tonalidade mais escura como cinza escuro e preto.
É curioso apontar aqui que a escolha das cores também teve muito a ver com a caracterização do sonho de Sara, mãe de Harry. Seu sonho era participar do programa de televisão vestindo seu velho e belo vestido vermelho. Assim, com o vermelho sendo símbolo do sonho de Sara forçou-se a escolha de tonalidades de objetos e de luzes que deixassem-no se sobressair quando em tela – os verdes aqui têm grande papel pelo destaque que dão ao vermelho e pela possibilidade de retratarem também um ambiente de pouca vivacidade dependendo de sua tonalidade, obviamente.
De qualquer modo, a iluminação durante o filme também varia de acordo com a trajetória das personagens. Inicialmente, temos uma luz tal como é intitulado o primeiro bloco do filme: “Summer”. Assim, identifica-se uma tentativa de reprodução da luz solar, obviamente, do verão. O “verão” na trajetória do filme é a época em que as personagens acreditam que seus sonhos poderão se tornar realidade. Mais a frente, a luz muda com a evolução (ou involução) das personagens e os ambientes tornam-se mais escuros, dada também a “queda” moral, física, financeira e psicológica dos protagonistas que têm ápice no capítulo muito bem intitulado “Fall” – que significa tanto queda, em inglês, como Outono. Vale indicar um ambiente em que a mudança é fortemente sentida é a casa de Sara Golfarb: de um ambiente claro e caseiro (que não se diga em nenhum momento também confortável porque nesse filme isso, de fato, não é permitido) a um ambiente distorcido, escuro e assustador.
Além dessas características visíveis na progressão dos blocos do filme e dos personagens, a iluminação muitas vezes pende para um tom onírico que se liga diretamente a questão dos sonhos que viram pesadelos dos protagonistas.
Mas mudanças não são só sentidas pelas cores e pela iluminação. As lentes também foram inteligentemente usadas para reforçar o caminho escolhido pelos protagonistas. Mais uma vez temos o uso de grandíssimas angulares. Em diversos momentos a grande angular é aliada a esse ambiente mal iluminado e sem vivacidade criando uma tortura para o espectador (assim como a tortura que as personagens sofrem, tortura advinda de obsessões/sonhos próprios). A grande angular aqui, outra vez, aliando-se ao retrato do universo das personagens, destaca-os do ambiente e reforça o isolamento que sofrem – resultante, mais uma vez, de seus sonhos e/ou obsessões.
O isolamento das personagens reforçado pela grande angular além de por aspectos de montagem também se torna muito palpável com o uso de câmeras acopladas aos atores. A subjetividade aí fica em primeiro plano – tanto literalmente como metaforicamente – com o foco da cena intensamente na personagem, em seu sentimento e suas ações que acaba por destacá-lo mais uma vez do espaço.
Som
Assim como a proposta narrativa/imagética de adentrar o espectador no mundo dos personagens, Darren rege o som de seus filmes não muito longe desse princípio, parecendo realmente um maestro da linguagem sonora cinematográfica. Percebemos quão profundo a música e ruídos vão no desenrolar da ficção, construindo um sentimento de emoção e tensão na história contada. Em Pí, seu primeiro trabalho reconhecido pela crítica, quanto mais próximo de sua “resposta” está Max, mais a música se intensifica, criando laços que envolvem o espectador e a paranóia social e individual vivida pelo personagem.
Já em Réquiem para um sonho, seu filme posterior, a música constrói um movimento cíclico, retornando a cada situação de tensão desenvolvida pelos personagens principais.
Essa ligação entre espectador e personagem colocada por Aronofsky, pode ser exemplificada mais profundamente através do ruído perturbador que ouvimos quando Max, personagem central de Pí, sente suas dores de cabeça. As dores são extremamente fortes, e o ruído, de timbre agudo e incômodo, transmite ao espectador um pouco daquela sensação em que o personagem está imerso.
Na trilha musical (e não na sonora), Darren tem como principal parceiro Clint Mansell, que trabalhou com o diretor em seus três longas-metragens: Pí; Réquiem para um sonho e Fonte da vida. Tendo em vista os baixos orçamentos, principalmente em Pí, optou-se por fazer uma trilha eletrônica, com apenas um teclado/sintetizador. O que ouvimos é um drum’n’bass energético, que se encaixa perfeitamente com a situação de Max: música e personagem em perfeita sintonia angustiante.
As cenas narradas apenas com o som é outro fator importante nos filme do diretor. Tomamos como exemplo Réquiem para um sonho e a cena em que a mãe de Harry, Sra. Goldfarb, toma seu café-da-manhã ou desjejum. Nela vemos a mesa posta, com uma xícara de café, meia laranja e um ovo. Ao invés de nos mostrar a senhora comendo, o que seria o mais óbvio se pensarmos num cinema clássico, o diretor prefere manter um plano fixo da mesa, e com três cortes secos, somados aos sons de um copo se esvaziando, uma laranja sendo espremida e um ovo se quebrando, resolve o “problema” criativamente.
Montagem
O processo de montagem colocada em prática em ambos os filmes de Darren Aronofsky aqui citados, se evidencia claramente como uma opção estilística carregada de densidade dramática e repercussão narrativa. Em certas concatenações de planos, notadamente dotados de correspondências sonoras, Aronofsky nos coloca o ver, o ouvir e o sentir, como contribuintes simultâneos para o entendimento da narrativa. São caminhos audiovisuais tomados para expressar a emoção dos personagens e dos temas da história.
Sem dúvida, a marca mais chamativa das opções de montagem feitas por Aronofsky é a chamada hip-hop montage. Demarcando ações obsessivas, a técnica consiste em passar uma ação mais complexa através de takes consecutivos de ações simples. O uso de close-ups muito rápidos acompanhados de sons exagerados agem no intuito de fixar a atenção do espectador para um fluxo imagético, diretamente ligado à obsessão vivenciada pelo personagem.
Para exemplificar essa técnica podemos citar quando Max Cohen abre e fecha a porta de seu apartamento, digita em seu super-computador ou toma suas pílulas para uma forte dor de cabeça, na história apresentada em Pi. Em Requiem para um sonho, a hip-hop montage é usada de forma a mostrar física e fisiologicamente os reflexos corporais ligados ao consumo de uma droga; ou ainda, ressaltando a obsessão de Sara Goldfarb ao limpar sua casa e abrir e fechar sua caixa de correios na espera de seu convite para aparecer na TV.
Mediante ao processo de “condição de isolamento” fruído pelos personagens trabalhados por Aronofsky, podemos perceber alguns dispositivos de montagem que servem como ferramentas para nos colocar certas marcas dessa isolação. Nas vezes em que um personagem problemático não está submetido a ter sua ação centralizada através da snorri-cam (que se fixa ao ator, colocando-o sempre no centro da tela), a opção por dividir a tela em dois campos independentes (split-screen) é correntemente utilizada por Aronofsky. Quando tais campos englobam separadamente até mesmo personagens que estão muito pertos um do outro, tal técnica exprime eficientemente a noção de isolamento individual do personagem imerso em seu micro-cosmo de vivência.
Em outro exemplo, quando, em Requiem para um sonho, a personagem Sara Goldfarb folheia um livro de receitas no intuito de emagrecer para voltar a caber num certo vestido, Aronofsky nos coloca uma visão subjetiva da personagem lendo as páginas de uma maneira não usual. O uso de jump-cuts entre as palavras visualmente lidas pelo espectador é trabalhado de maneira a transmitir a ansiedade peculiar de uma senhora de casa que passa por aquela situação. Tal seqüência é seguida pelo café da manhã de Sara, no qual cortes secos durante o completo consumo do alimento, revelam uma nítida decepção de Sara com a eficiência daquela alimentação. Tal sentimento é aprofundado pelos curtos impulsos sonoros ocasionados por essas ações, ressaltando que aqueles itens foram muito brevemente consumidos.
Deve-se ressaltar ainda, a íntima relação que a montagem tem com a banda sonora nos filmes de Darren Aronofsky. Tanto o áudio do filme quanto a trilha sonora fortalecem as opções de montagem, atenuando amplamente os efeitos ocasionados pela dimensão dramática incorporada pelos métodos de edição do filme. Para exemplificar tal característica, lembramos de uma cena em Réquiem para um sonho, na qual a venda de drogas tem um ruído de caixa registradora a cada momento que Harry e Tyrone vendem mais um papelote da droga. Também se encaixa nessa perspectiva o momento no qual um intenso ruído é associado ao contato entre uma caneta e um cérebro real, numa paranóia introspectiva do personagem de Max Cohen em Pi.
Adentrando mais na Montagem de Réquiem para um Sonho
Réquiem para um Sonho, de Darren Aronofsky, gira em torno de quatro personagens: Tyrone, Marion, Harry e Sara. Os quatro acabam num mundo de vícios por causa de seus sonhos. Os três primeiros jovens pensam ter uma oportunidade de alcançar certa riqueza, ou mesmo abrir uma loja (Marion e Harry), através do dinheiro conseguido pela venda de drogas. Sara, mãe de Harry, sonha aparecer na televisão, recebe uma proposta e, para isto deseja emagrecer cerca de 20 quilos e vestir seu vestido vermelho. Sara, por fim, acaba seguindo a uma clínica que receita anfetaminas.
A seqüência que analisaremos a seguir está no início do filme, no bloco intitulado “Summer”. Nesta fase, as personagens estão felizes e entusiasmadas ao se verem perto de realizarem seus sonhos. Mais especificamente, a seqüência retrata a venda de drogas, o dinheiro arrecadado e um sonho se tornando palpável (a compra de um estabelecimento comercial).
A seqüência em si é um bom exemplo do tipo de montagem pelo qual o filme (além de Pí, outro filme do diretor) ficou conhecido, a montagem hip-hop
Análise:
Primeiramente, temos uma hip-hop montagem de Tyrone vendendo as drogas. É noite, ele está na frente de uma banca. Tyrone recebe o dinheiro, guarda-o, olha para os lados (verificando se está tudo “limpo”), pega a droga escondida atrás de um pneu e entrega ao consumidor. Todos os planos, a não ser o inicial de Tyrone (na banca), são planos detalhe. Vemos mãos, bolso, olhos, pneu, mãos, etc.
A troca de planos é extremamente rápida apesar da cena não se dar em fast motion. A ação é picotada e acaba, pois, sofrendo uma enorme elipse sem deixar de ser inteligível: o que se enfatiza aqui são os passos-chave de uma venda ilícita.
Justifica-se o uso deste procedimento pela própria ação que se dá: a venda de drogas na rua. A rapidez da cena pode-se relacionar com o fator real de necessidade de velocidade da ação (por ser obviamente ilícita). Além disso, essa rapidez liga-se ao tempo psicológico da personagem, claramente numa situação de grande ansiedade.
Os planos de venda de Tyrone são repetidos por duas vezes, na mesma ordem. Isso ocorre para se pluralizar a ação, isto é, fica explícito que ocorreu mais do que uma vez . Por ser uma cena em hip-hop montagem, a repetição acaba por se multiplicar mais ainda: a repetição de uma ação que se dá em planos detalhe concatenados e rápidos parece multiplicar muito mais a ação do que uma repetição de plano- seqüência.
Depois do último plano (a passagem de droga) repetido entramos em uma outra hip-hop montagem paralela, pode-se dizer. Enquanto a ação na rua se dá, temos Marion dentro do apartamento consumindo droga. Do plano detalhe de passagem de droga temos um plano detalhe das mãos claras de Marion (muito bem caracterizadas por um esmalte escuro) e um saquinho com cocaína. Não apenas temos aí uma evidência de ligação pelo tempo – ações que ocorrem simultaneamente – mas também, tem-se uma evidencia de causa e conseqüência, ou seja, Marion tem a possibilidade de se drogar exatamente por ter a mercadoria em casa (de onde retiram para venda) e, também, por estar ganhando com isso (drogar-se é de certa forma parte deste negócio).
O ritual de Marion é também retratado em hip-hop montagem (os planos mais especificados estão relacionados abaixo). O drogar-se é retratado passo a passo em planos detalhe, do mesmo modo que a venda de drogas por Tyrone. Em especial, não apenas temos os passos da ação da personagem, mas também temos planos de sua resposta fisiológica (como a dilatação de suas pupilas). A razão para este retrato também rápido e em detalhe é análogo a cena anterior. A rapidez e o plano detalhe não tanto se ligam ao ambiente hostil (Marion está dentro de sua casa), mas sim ao vício. Com os passos para cheirar cocaína tão explícitos, vistos tão de perto, temos saltado à tela a obsessividade da ação, ou seja, o retrato do vício. Fica mais claro o papel deste tipo de montagem das cenas que as personagens se drogam ao vermos o filme como um todo – a repetição destas cenas (detalhes dos passos para se drogar) funciona tal como a repetição da venda de Tyrone, a multiplicação da ação é muito maior e a obsessão se torna muito mais palpável. De qualquer maneira, após Marion drogar-se temos um plano em fast motion (representada pelas suas mãos, novamente) trabalhando com suas colagens e, indiretamente, com seu sonho de obter um estabelecimento comercial. A ligação dela se drogando com o seu trabalho não é apenas temporal, obviamente, mas sim , novamente causal e irônica. Marion tem a possibilidade de alcançar seu sonho devido à venda das drogas, mas o perderá (dentre tantas outras coisas) devido também ao vício. Juntamente a esses fatores, o fast motion aqui pode ser um índice de retrato do psicológico de Marion sob o efeito da cocaína e, além disso, indica-se aí que a droga chega até mesmo ser o impulso que a faz correr atrás do seu sonho.
Após esta cena, temos quase que uma repetição da cena de Tyrone. No entanto, nesta cena quem está vendendo é Harry. Temos os mesmos passos da venda repetidos também três vezes – se algo é mudado é apenas para se colar mais com a personagem em questão pode-se dizer, mas a essência é a mesma. A presença desta cena expõe a participação ativa de Harry tal como Tyrone, e a sua repetição se coaduna com a do companheiro em todos os aspectos.
Essas duas cenas que se passam por três vezes e têm uma cena de consumo de entorpecentes entre elas configuram uma estrutura de repetição que é reflexo de comportamentos obsessivos e, em última instância, do vício que paira por todo filme. A linguagem do filme alcançada muito pela montagem acaba por ser uma linguagem viciada e obsessiva, por fim, e espelho do filme como um todo.
Posteriormente a essas cenas analisadas, temos um descanso visual. Harry adentra no apartamento e conversa com Marion, sua namorada, após a venda na rua. A conversa é retratada numa simples concatenação de plano e contra plano. No entanto, a escolha pelo retrato de um personagem e depois de outro não é apenas pelo classicismo (que, aliás, nem mesmo é buscado no filme). No filme como um todo, o diretor (e a sua proposta com a montagem) desenham personagens em isolamento. Apesar de juntos, ou mesmo de serem namorados, as personagens estão sozinhas, isoladas – muito provavelmente devido aos seus comportamentos obsessivos e aos seus vícios, de qualquer modo, cada uma está no seu mundo apesar da convivência e dos negócios feitos em conjunto. O diretor assim reluta em retratar mais do que o devido das personagens em plano conjunto. O plano e o contra-plano, pois, acaba também sendo uma escolha para separar o quanto pode cada personagem do universo do outro.
A conversa dos dois acaba (fala-se exaltadamente sobre o sucesso das vendas) e temos então um plano fixo (uma fotografia) de um espaço comercial para alugar. Obviamente, aqui, temos uma ligação novamente de conseqüência. Devido ao sucesso, o casal pode ir procurar o lugar para realizarem o sonho do estabelecimento comercial. O plano da foto, assim, é um vislumbre da possibilidade, é o sonho cada vez mais tangível. As fotos vão voltar mais a frente e estão em progressão – primeiro se tem o vislumbre, depois estão vendo o local e analisando, e por fim, estão na frente do local como se tomando posse do sonho. Essas fotos se intercalam com o tráfico das drogas, por, como já dito, serem possíveis devido a isso. Além disso, os negócios são tanto o começo como o fim dos sonhos (e do filme).
As cenas relacionadas ao tráfico diferenciam-se um pouco das do início da seqüência aqui analisada. Depois da primeira foto, tem-se um plano da cocaína sendo peneirada e dividida em fast motion. O fast motion aqui muito provavelmente se liga com a ansiedade de concretizar sonhos (aliás, o plano foi “puxado” pela fotografia- “vislumbre” de um local comercial para se alugar). Depois disso, repete-se novamente a venda de drogas por Harry com maior economia de quadros, pois não é mais necessário perpassar por todos os passos como no início da seqüência, o espectador já reconhece a ação e tem ela toda na sua mente. Além disso, o caminho para realização está quase que no final e tudo começa ser visto com pressa e “vontade de chegar logo” ao que podemos chamar de clímax da vida pessoal das personagens. Vale apontar aqui que logo depois disso, inserem-se planos detalhes que enfatizam o crescente da seqüência:
– primeiramente, tínhamos a venda da droga.
– aparece a real possibilidade de alugar um estabelecimento.
– o casal alcança uma felicidade e maior união.
Este último passo é retratado pelo plano detalhe do beijo do casal e pela fotografia (plano posterior) do estabelecimento comercial.
Ainda enfatizando o aspecto cíclico do negócio das drogas e como tudo está interligado (drogas, sonho, felicidade pessoal), os planos se repetem duas vezes com poucas alterações. Em essência tem-se: peneiração da cocaína, passa a droga, guarda o dinheiro, mãos costurando (preparação da droga), mãos se dando (passo de passagem da droga), beijo dos namorados e foto do estabelecimento. Como novidade, depois disso, têm-se planos concatenados que reforçam o sucesso financeiro (dentre os outros sucessos já pontuados) : o dinheiro da caixa das personagens vai subindo tal como num stop motion.O stop motion retrata claramente a rapidez dos negócios e o “sucesso fácil”. Mais uma vez, o dinheiro é associado tanto a droga como a felicidade das personagens – logo depois de vermos a pilha subir, tem-se repetido o plano das mãos (passo de passagem da droga), do beijo do casal, e uma foto final do casal no estabelecimento.
Por fim, temos o encerramento da seqüência com um enquadramento como se fosse de dentro do armário onde guardam a caixa com o dinheiro do tráfico. O armário é aberto, Tyrone pega a caixa (insere-se um detalhe da caixa sendo aberta e recendo mais dinheiro) e fecha o armário. Esses planos de encerramento são menos rápidos e um pouco como um descanso de toda seqüência além de consagrarem o sucesso das personagens.
A montagem da seqüência como um todo funciona muito bem tal como a visão de Walter Murch, retratada em seu livro “Num Piscar de Olhos“. Em primeiríssimo plano temos a emoção das personagens e da narrativa. Em hip-hop montagem, em planos detalhes, em grande velocidade e com inserção gradual de planos que demonstram a aparente reta final para o sonho em temos tangíveis a própria ansiedade das personagens. Cada corte acaba também por fazer a história avançar e a seqüência toda é trabalhada para caracterizar a euforia de se estar conseguindo um sucesso e uma realização. A evolução da história assim se dá mesmo quando se repetem planos muitas vezes. Isso porque a repetição não é vazia, mas sim agrega um fator – a repetição é como a subida de mais um degrau para satisfação de seus desejos. Juntamente a tudo isso, o ritmo resultante é orgânico à história tão contemporânea – a questão frenética, o aspecto hip-hop acaba por ser não só o ritmo das personagens, mas também das suas mentes “a milhão” (tanto pela droga como pelo sonho tangível). As escolhas de planos têm, por serem em grande maioria planos detalhe ou de personagens sozinhos, um alvo extremamente delineado – até mesmo por isso o filme torna-se um pouco como uma tortura, ás vezes. O espaço aqui, que, no entanto, é deixado para trás – a continuidade é feita , em grande maioria, pela ação e até mesmo temos espaços não identificados muitas vezes (como na passagem da droga). No entanto, esse sacrifício foi essencial ao vermos a linguagem construída pelo filme e, com certeza, não trouxe danos ao que se deve levar em primeira consideração: a emoção. Aliás, essa falta de preocupação em situar explicitamente o espectador, para a seqüência em questão, funciona perfeitamente visto que, assim, o espectador tem o foco duplicado na ação (determinante para as personagens e para atmosfera do filme). Adentrando na ação, adentra-se no ritmo e por uma verdadeira orquestração de fatores que não apenas se ligam à montagem, o espectador acaba por transfigurar-se para a pele de Harry, Tyrone e Marion.
Saindo das regras apontadas por Murch, poderíamos ainda olhar a montagem da seqüência como uma mescla de fins narrativos, sensoriais e discursivos. A seqüência, tem um ponto forte narrativo por nos contar o sucesso das personagens, o envolvimento com o tráfico e o encaminhamento de um sonho. A narrativa também é ponto de partida para o aspecto sensorial da seqüência: a montagem acaba retratando a sensação de obsessão por sua estrutura repetitiva, o “gosto” do vicio pelo aspecto hip-hop do consumo da droga e a euforia causada por um sonho, condensada em fotos e beijos. A questão discursiva acaba por ser resultante não tanto da seqüência, mas do filme como um todo que discute a busca frenética pelo prazer, pelo sucesso e o conseqüente processo de isolamento na modernidade criando mundos privados para cada ser humano. A idéia de isolamento e do sonho que vira pesadelo salta por todo o filme.
A ligação com o Som:
Como em grande parte do filme, Darrem Anonofsky opta por colocar trilha musical/sonora em toda seqüência analisada acima. Trilha musical pelos arranjos criados no teclado/sintetizador de Murray, parceiro do diretor nas composições, e sonora pela síntese de sons direto e folley com o todo.
A trilha musical está presente em toda seqüência. O som é eletrônico, dando ritmo aos planos e às ações dos personagens. Detalhe para a dinâmica do som no tempo: em cenas de grande ansiedade como na venda de drogas a trilha é de intensidade alta, alcançando o primeiro plano sonoro e encobrindo qualquer som direto ou diálogo; já em cenas como o diálogo de Marrion e Harry a trilha diminui, dando “voz” aos personagens, porém sem deixar de ser presente.
A junção da trilha musical com os ruídos é o que mais nos chama atenção. Adicionado à música, ouvimos ruídos das situações em questão, percussivamente encaixados no tempo musical, como se alguém tocasse um instrumento chamado “folley” (créditos do montador, que possivelmente conhece a linguagem musical). Ouvimos ruídos dos pacotes de drogas, de uma caixa registradora (que não é visual, porém representa do significado psicológico da cena), das mãos e de outros sons presentes no quadro.
Ainda no meio dos ruídos, há a criação de sons “não diegéticos” como na cena em que observamos um stop motion do dinheiro arrecadado com o tráfico. O som colocado em cada troca de planos não existe, sendo criado apenas para representar (do mais grave para o mais agudo) o enchimento da caixa de sapatos com os dólares. Em cenas de fast motion, também nos é passada a sensação de aceleração sonora, com o próprio som direto representado em alta freqüência ou com a criação de novos sons, que possibilitem este efeito.
O som em Réquiem para um sonho está intrinsecamente ligado com a edição (não que os outros filmes não estejam) exigindo um conhecimento musical do montador para ser possível a idéia proposta. A criação do suspense e ansiedade das cenas e personagens é intensificada com o sincronismo do som com a imagem, andando plano a plano juntos, como se um houvesse um preenchimento de ambas as partes.
Adentrando mais na Montagem de Pí
Através da Seqüência 2:56 – 4:42
Maximillian Cohen (Sean Gullette) é um homem brilhante e atormentado, que está prestes a fazer a mais importante descoberta de sua vida: decodificar o padrão numérico por trás do mercado de ações. À medida que vai se aproximando da solução, o caos vai engolindo o mundo à sua volta. Ele é perseguido por uma agressiva firma de Wall Street determinada à dominação financeira, bem como por uma seita que tem a intenção de desvendar os segredos por trás de seus antigos textos sagrados
Análise:
A seqüência inicial de Pi têm extrema importância. Primeiramente ela apresenta o personagem principal Maximillian Cohen (Sean Gullette), sua filosofia e sua visão de mundo, muito importante para o espectador entrar de vez no filme. Além disso, essa seqüência tem características marcantes do diretor, principalmente na montagem.
Eisenstein defendia que a montagem deveria ser pensada não somente na edição, e sim em todo o processo de criação do filme. O diretor Darren Aronofsky parece perceber essa importância e juntamente com seu produtor Eric Watson estabeleceu uma coesão entre as diversas áreas (seja na montagem, fotografia e até trilha sonora), tentando explorar a subjetividade do personagem em todos os aspectos.
Na fotografia um número diferente de posições de câmera foi desenvolvido. A “Heat-Cam” que cria ondulações na frente das lentes, e uma “Vibrator-Cam”, usada para efeitos estremecidos durante todo o filme. Aronofsky ainda explica a escolha do contraste dramático na fotografia: “A maioria dos filmes em branco e preto acabam com um visual cinza; queríamos um filme branco ou preto. E que fosse o mais ricamente estilizado em relação à fotografia”. Para isso, o diretor de fotografia Matthew Libatique usou uma película inversa de branco e preto, que é extremamente difícil de filmar, expor e montar, mas que resulta em contrastes bem fortes.
A trilha sonora tem o mesmo caráter alucinado das imagens e constrói um efeito perturbador que reflete o caos interno do personagem.
A narração em primeira pessoa, juntamente com seu rápido caminhar na rua, fazem parte da introdução do personagem principal. A seqüência analisada começa com Max caminhando na calçada rapidamente ao fundo, enquanto em primeiro plano, desfocado, algumas pessoas orientais fazem movimentos lentos de yoga. Essa dicotomia entre ocidente/rápido e oriente/lento vai permear o filme em diferentes momentos. Uma grade divide essas duas camadas podendo-se perceber que a montagem do quadro começa a ter grande destaque já nessa divisão de espaços.
A câmera acompanha em movimento de panorâmica até Max desaparecer entre as pessoas desfocadas. Essa cortina serve para o abrupto corte que passa para o próximo plano em que o personagem começa sua narração em voz off, que será repetida diversas vezes no filme. Marcando o tempo como um investigador de policia que registra uma ocorrência, Max começa: “12h45min. Reitero minhas suposições. Um: A matemática é a linguagem da natureza. Dois: Tudo à nossa volta pode ser representado e compreendido através dos números. Três: Se grafar os números em qualquer sistema surgirão padrões. Conseqüentemente: Há padrões em todo lugar da natureza.”
A narração, a montagem e o movimento de câmera estão interligados diretamente nessa seqüência. O olhar do personagem é feito através de uma câmera subjetiva tremida, rápida, com movimentos alucinados (Vibrator-Cam). Essa câmera mostra como o personagem vê seu arredor. As imagens são colocadas na montagem juntamente com a parte da narração em que Max está “observando o mundo” e seus movimentos caóticos. Conhecida como hip hop montage, marca registrada de Aronofsky, essa técnica mostra imagens ou ações mais com velocidade aumentada, acompanhada de efeitos sonoros, tentando simular alguma ação.
Em contra posição, quando Max faz suas “reiterações” sobre o mundo, prevalece a lógica e a razão do personagem e, portanto a montagem pula de cenas alucinadas da movimentação da rua para um plano próximo do rosto de Max. A câmera acoplada no corpo do ator (Heat-Cam) faz com que o movimento seja suave, calmo e sereno.
Na continuação da seqüência, vemos um plano em contra plungee de galhos de uma árvore. O zoom vai aproximando do das folhas enquanto a montagem intercala esse plano com um contra de Max olhando para o alto, com o zoom também se aproximando de seu rosto até um primeiríssimo plano dos olhos. “Evidências: o ciclo de epidemias, manchas solares, as cheias e baixas do Rio Nilo”. Com a mesma dinâmica descrita anteriormente, a narração dessas “evidencias” são intercaladas entre as imagens da árvore e o plano de seu rosto. A narração rápida e seca é contraposto ao silêncio e expectativa do rosto que observa. Essa cena se repetirá mais três vezes no filme e é importantíssima para o entendimento da narrativa, pois é nesse olhar ingênuo o único momento em que o protagonista sorri.
Logo após acontece uma fusão de imagens entre as folhas e um painel eletrônico da bolsa. Agora o movimento do zoom é o inverso, abrindo o quadro até revelar o painel. No entanto não estamos em Wall Street, mas em um dormitório fechado, pequeno e com uma estrutura low-tec assombrosa. O eixo dos planos abertos do quarto é quebrado pelos planos detalhes de Max. Nesse sentido a arte e a montagem atuam juntos para causar estranhamento no espectador que fica totalmente perdido naquele local estranho e com um maníaco alucinado com números e hipóteses.
“Mas e a bolsa de valores? Um universo de números que representa a economia global. Milhões de pessoas trabalhando, uma vasta rede, uma rede viva. Um organismo. Um organismo natural. Minha hipótese: a bolsa de valores também possui um padrão. Bem em frente de mim, sempre teve. 12h50min pressiono enter“. O tempo que perturba e prende o personagem parece pautar também a montagem, rítmica e veloz.
Planos detalhes da tela do computador, do painel e do teclado são intercalados e uma expectativa é criada. Não sabemos o que esperar, mas esperamos algo acontecer. Aronofsky parece construir uma narrativa em que somente o personagem sabe para onde está indo. Essa loucura subjetiva é muito bem construída na montagem, criando picos dramáticos em um simples apertar do botão enter. Durante várias vezes no filme nos deparamos com essa expectativa e geralmente os resultados também são entendidos somente pelo personagem. A seqüência termina com o toque do telefone e o primeiro contato de Max com o mundo exterior ao seu.
Diferentemente do cinema convencional que utiliza a câmera como terceira pessoa, em uma visão onisciente, dando ao espectador uma visão distanciada da ação, Daren Aronofsky rompe com esses padrões e insere o espectador na própria experiência do filme. Ele restringe os enquadramentos e nos mostra planos do protagonista ou de suas perspectivas. Em Pi, a câmera realmente se torna Max em varias cenas, mostrando o mundo do ponto de vista de seus olhos ao invés de apenas observá-lo.
A montagem tem papel fundamental nessa integração entre a proposta de roteiro e direção, causando um impacto sufocante e angustiante no espectador que se sente perdido no meio de tantos cortes e quebras de eixo. Essa seqüência ilustra bem essa estética justamente porque demonstra esses diversos elementos em seu percurso.
Caio Tomio Otagaki, Felipe Carrelli Sá Silva, José Eduardo Da Silva Ruiz, Juliano Parreira e Suzana Altero Bispo são graduandos em Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)
MUITO OBRIGADO!!!! Esse documento vai me auxiliar muito na minha pesquisa, estou redigindo minha monografia nesse momento. Muito grato!
Vi recentemente o filme Cisne Negro e numa cena em que Nina toma seu café da manhã a mãe põe um ovo e uma laranja à mesa. A mesma laranja e o mesmo ovo que são consumidos pela personagem que fazia a mãe de Jared . Há alguma explicação para essa repetição? O que significa laranja com ovo para Aronofsky?Se souberem me digam porque a curiosidade está me consumindo!
Gustavo: Há sim uma explicação. Sara, a mãe da personagem de Jared, para emagrecer entra em uma dieta, bastante famosa nos Estados Unidos, de ovo e grapefruit (Egg and Grapefruit Diet). O significado é o mesmo em Cisne Negro.
Aliás, ótima análise! Parabéns a todos!