Instruções Para Matar Maíra (Guilherme Ghussn, UFSCar, 2010)

Instruções Para Matar Maíra é um TCC de 2010 realizado na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Ganhador do prêmio de Melhor Ficção na VII Mostra Competitiva do Interior, o filme aborda a natureza do fascínio através da história de Marcelo que se apaixona pela misteriosa Maíra. Confira além do curta, uma entrevista com o diretor.

Por Fernanda Sales*

RUA: O curta foi um TCC de alunos do curso de Imagem e Som. Fale um pouco de como iniciaram o projeto, como a equipe se formou e como a universidade contribuiu com o projeto no começo.

Guilherme Ghussn: O processo de elaboração, aprovação e realização de um TCC do curso de Imagem e Som é um pouco injusto. Se por um lado esta peneira pela qual os projetos passam acaba com a liberdade de cada aluno poder criar seu próprio produto audiovisual, ela cria projetos fortalecidos, criados em equipe, algo que foi encorajado durante todo o curso, não somente agora. O Maíra (“apelido” do nosso projeto) foi feito nestes moldes. Assim como a maioria dos alunos, eu até tinha um esboço de um roteiro para apresentar, mas quando os roteiristas Danson e Rafael me convidaram para dirigi-lo, foi que eu vi a possibilidade de entrar em um projeto que já tinha um roteiro bem encaminhado e muito interessante. À medida que os projetos eram apresentados em aula, cada aluno buscava participar de um projeto com o qual tinha mais afinidade, e as equipes foram sendo formadas.

RUA: O curta é uma livre adaptação do conto “Instruções para matar Duilia” de Roberto Drummond. Como surgiu a idéia de utilizar o conto? Como foi o processo de adaptação do conto para um roteiro cinematográfico pelos roteiristas?

G.G.: O roteiro veio de uma parceria entre o Danson Knetsch e o Rafael Marcon, que trabalharam nele durante a especialização em Roteiro, que começou no 5º semestre. Foi genial o modo como eles pegaram um conto (de um autor que ambos admiravam) em primeira pessoa, onde não existem cenas e sim divagações do narrador, criaram um personagem-narrador, estruturaram o curta baseado nas instruções do conto, mas com situações que não haviam na obra original, brincaram com recursos narrativos audiovisuais e conseguiram com uma construção totalmente diferente trazer a essência do conto do Roberto Drummond. Leia o conto e veja o curta. Fico maravilhado até hoje.

RUA: Como diretor do curta, quais os elementos ou princípios você estabeleceu para o curta e acredita ter alcançado no produto final? Trabalhou com quais referências?

G.G.: No processo colaborativo, eu como diretor busquei nunca impor nada. Cada membro da equipe trazia durante as reuniões suas opiniões, mas o roteiro em si já era tão coeso, que praticamente não foi mudado. Algumas cenas foram cortadas devido a problemas de produção, e os ensaios filmados com os atores traziam novas idéias para os roteiristas algumas vezes. A decupagem dos planos que criei poucas vezes foi criticada, porque ela estava muito centrada no roteiro. Fazer com que todos caminhassem juntos foi a minha grande função.

RUA: Quais empecilhos você encontrou no meio do processo?

G.G.: Tivemos problemas com os horários da nossa atriz Ana Carolina Godoy, já que era na época dos últimos dias das filmagens da novela Vende-se Um Véu de Noiva do SBT, na qual ela interpretava uma personagem principal, coincidiram com as diárias do Maíra. Ela chegou a ir e voltar de São Paulo quatro vezes em uma semana. Com isso nosso plano de filmagem estava sempre se modificando. Perdemos a locação inicial do cemitério uma semana antes das gravações, mas felizmente conseguimos uma substituta, que no final era até melhor que a anterior. A cena final do curta deveria ser feita ao nascer do sol, alguns atrasos fizeram com que a iluminação não tenha sido a ideal. Até uma semana antes da entrega do curta, estávamos cogitando re-filmar a cena. Teríamos um gasto extra, e trazer a atriz estava mais difícil ainda. Foi quando resolvi montar a cena final com o material que tínhamos, e com alguns tratamentos na pós conseguimos chegar em um resultado satisfatório.

RUA: Como foi a direção de atores? Eles fizeram algum laboratório? Como foi o processo de seleção dos atores para o filme?

G.G: Foi maravilhoso. Até então os curtas que eu tinha feito como forma de exercício durante o curso envolviam um trabalho com poucos ensaios ou somente no set. Muitas vezes as atuações eram feitas por amigos ou membros da própria equipe. Quando o projeto foi aprovado para ser produzido como um TCC, foram dados seis meses para se fazer a pré-produção do curta. A preparação do elenco passou a ser uma das metas a ser trabalhada nesse período. Algo que não citei é que, na verdade, eu fui convidado para co-dirigir o curta com o Danson (um dos roteiristas). Na nossa divisão de responsabilidades ele seria o diretor de atores e eu seria um diretor técnico. Quando ele não pode mais assumir este cargo (devido a sua promoção na EPTV São Carlos), concentrando-se apenas no roteiro com o Rafael, eu senti que precisaria de ajuda de alguém com os atores. Foi quando eu convidei a Sami Makino, caloura minha que trabalhava com teatro, para me ajudar com o elenco. Ela já conhecia o Gustavo Sol, e julgou ele perfeito para o papel. Ele mesmo acabou indicando a Ana Carolina e assim formamos a dupla de atores. Passamos então a ensaiar praticamente a cada 15 dias. Acho que foram uns cinco ensaios aos finais de semana, que foram registrados em vídeo e vistos pelos roteiristas. Com a ajuda de Matheus Chiaratti, foram elaborados vários exercícios de preparação que não consistiam nas cenas em si, mas sim em situações diversas que potencializavam a relação entre as duas personagens. Foi muito intenso e elevou em muito a minha noção de o que é ser um diretor.

RUA: Fale um pouco do papel que teve a universidade para a sua formação audiovisual. Você acredita que a universidade é um meio importante para a produção de Audiovisual no Brasil?

G.G.: Um problema sério com o curso, é que a universidade não dá muita importância pra ele. Faltam equipamentos e faltam professores. Enquanto os investimentos são altíssimos nos cursos de exatas e biológicas, em humanas chega a ser o mínimo para existir. Criaram um curso que depende da troca de equipamentos a toda hora, e no final temos que nos virar com o pouco que temos. Há gente que vê uma vantagem nisso, pois quem consegue fazer com pouco, faz melhor com muito. Não sei se concordo muito com isso, mas uma coisa é certa: entrar na área com um curso superior faz diferença. Mesmo o método de ensino sendo um pouco falho, você respira cinema o tempo todo durante o curso. Há muita coisa que se aprende na prática fora da aula, mas vejo que uma parte teórica muito importante que eu absorvi na faculdade dificilmente eu teria fora dela. Mesmo algo que eu aprendi por conta própria eu precisei ter uma base vinda das aulas. Mas se formar no curso não é garantia de emprego. Isso pode te ajudar a se destacar, mas a área do cinema depende muito de contatos.

RUA: Agora que está formado, fale um pouco sobre o que esta fazendo, em quais projetos esta envolvido, etc..

G.G.: Quando me formei, tentei escapar de vir trabalhar em São Paulo. Passei uma temporada em São Carlos, mas acabei indo pra Paulínia pra tentar trabalhar no Polo Cinematográfico de lá. Acabei participando de alguns projetos que vieram filmar na região, mas com o descaso do atual prefeito não teremos produções por um bom tempo por lá. Acabei recentemente mudando pra São Paulo e estou ainda tentando me ajustar na área. A área do audiovisual é muito ampla, tem campo em qualquer cidade, mas o cinema comercial, que eu busco fazer já é mais difícil. Enquanto isso tento escrever roteiros e pensar em alguns projetos. Espero logo realizar um novo curta que me deixe tão satisfeito quanto o Maíra me deixou.

*Fernanda Sales é graduanda do curso de Imagem e Som da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Editora Geral da Revista Universitária do Audiovisual (RUA).

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