O vampiro da cinemateca (Jairo Ferreira,1977)

Longa-metragem rodado em super-8, realizado por Jairo Ferreira entre 1975 e 1977, tempo em que trabalhava como crítico de cinema da Folha de São Paulo. Narrado em primeira pessoa, feito sem equipe, de maneira artesanal, não segue uma linha narrativa e nem conta “uma” história, seguindo uma construção mais poética e livre, segundo o que autor costumava chamar de “cinema de invenção”. “É preciso inventar novos signos”, ouve-se na voz over do autor-narrador, a certa altura do filme.

O crítico e cineasta Jairo Ferreira
O crítico e cineasta Jairo Ferreira

Misturando imagens da própria vida, com características de filme-diário; imagens com encenação e improviso de atores; a imagens e sons de arquivo (filmando projeções de filmes diretamente do cinema e da televisão, usando narrações de rádio, músicas), aparecendo nas imagens, declamando poemas; Jairo Ferreira incorpora estes e outros elementos na construção do discurso do filme, que pode ser chamado de documentário em primeira pessoa, performático, experimental. Um filme de montagem, onde os signos e as significações são articulados na edição das imagens e sons, numa estética de colagem. Se existe algum tema principal no filme, este seria o próprio cinema, nunca tratado como mero entretenimento ou mercadoria, mas na sua condição e potencial como arte e poesia.

Jairo Ferreira em ação
Jairo Ferreira em ação

A postura de Jairo Ferreira como personagem e autor do filme é notadamente antropofágica, e emblemática é uma de suas frases, quando se referia ao seu processo de fazer cinematográfico: “chupo filmes para renovar meu sangue”. Essa declaração deixa claro que o “vampiro” do título não é nem Nosferatu, nem Drácula, e nenhum outro ser metafísico ficcional, senão ele mesmo, o autor.

Jairo Ferreira em cena do filme
Jairo Ferreira em cena do filme

O filme usa características do Cinema Marginal, como certo niilismo, principalmente para tratar da situação que vigorava no país e no cinema brasileiro. O pastiche dos gêneros cinematográficos clássicos já se evidencia no título, e frases como “O Doutor Phibes ataca em São Paulo, e vai reinventar o terror!” são constantemente ouvidas na voz de Jairo Ferreira. Referência marcante é a influencia da poesia concreta, no que diz respeito a constante re-invenção de signos. A idéia de “invenção”, absorvida de Ezra Pound e de seu ABC da literatura; bem como a antropofagia cultural, proposta por Oswald de Andrade, também se fazem presentes a todo o momento, permeando o filme.

Renato Coelho é graduado em Cinema pela FAAP, mestrando em Multimeios pela Unicamp, e professor do curso de Imagem e som da UFSCar.

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