[REC] 2 – Possuídos (Jaume Balagueró e Paco Plaza, 2009)

Em 2007 um filme espanhol com um título curioso e chamativo entrou no circuito de debates on-line. [REC], filme espanhol dos diretores Jaume Balagueró e Paco Plaza recebeu muitos elogios, comentários e prêmios. Estreado há muito tempo na terra do Tio Sam, a forma dos brasileiros verem o tão debatido filme era no jeito  brasileirinho mesmo: a ilegalidade. Download. Este humilde resenhista, grande amante do horror, não resistiu, apesar de combater (na medida do possível) o download de filmes e sempre que possível ir ao cinema e locar filmes.  Sem medo de afirmar, é um dos melhores filmes do gênero até hoje. Gostei tanto que fui ao cinema quando estreou no Brasil, rever nas telonas e prestigiar a obra de forma decente, com imagem e som perfeitos.

A espera pela continuação era com ansiedade. Novamente a estréia americana fora muito antes da nacional, logo, downloads e downloads… Mas como dessa vez tinha certeza de que algo bom viria, resisti fortemente à ilegalidade. No primogênito, não sabia se a aposta seria positiva.

Pra aumentar a expectativa, depois da estréia nacional, demorou duas semanas para chegar ao Rio Grande do Sul. Esperando tanto tempo por um filme (o que não acontecia comigo em tempos), a expectativa fora grande; porém vi a obra e me decepcionei. Talvez tenha botado muita esperança de 2007 até 2010 num resultado maior que o primeiro (o que seria muito difícil), mas vamos aos fatos.

O que [REC] tem, [REC]2 – Possuídos não tem. É síntese e antítese.

[REC] tem o espírito do cinema inovador em dois diretores em carreira ascendente. Câmera na mão, atuação realista dos bons atores, transformando o filme num todo – não pensamos num plano, cena ou diálogo memorável (apesar da fala final ser genial). O filme é bom como uma obra em si. Pouco se preocupam com foco, diafragma (entrada de luz na câmera, o que deixa escuro ou claro), com a câmera tremer muito, com os atores saírem de quadro; os diretores Balagueró e Plaza se preocupam com o parecer real. E parece. O pouco uso de trilha sonora, muito som ambiente e gritos horripilantes perfeitamente mixados deixam o espectador tenso e o filme realista. Acreditamos, por uma hora e meia, que uma equipe de reportagem fora seguir um grupo de bombeiros trabalhando, até que os mesmos recebem uma chamada de emergência de um prédio e lá encontram pessoas infectadas com um vírus que deixa as pessoas ferozes e agressivas, como um zumbi, porém, ágeis. Um roteiro simples, mas que rende um longa-metragem violento, com alma e com talento. O final do filme conta com uma suspeita da causa de todo esse caos, mas apenas uma suspeita, que deixa o público refletindo a obra após seu término. A arte continua viva na mente do espectador. Um ciclo se fecha de forma perfeita.

Porém, o ciclo fora aberto primeiramente com uma versão americana. O defeito de Quarentena (John Erick Dowdle, 2008), remake americano do filme, apesar de ser um bom filme, é tentar explicar demais as causas do problema de contaminação. Como todo bom filme americano, é pragmático e explicativo. A versão ianque tem algumas virtudes que a versão castelhana não tem, mas não consegue ser superior ao original.

O ciclo tem nova vida com uma continuação anunciada: [REC]2 – Possuídos assume uma posição. Assume uma explicação, assim como sua versão de 2008. E isso anulou a qualidade que fez [REC] ascender como clássico do horror.

A continuação começa exatamente de onde o primeiro parou. Exatamente do mesmo plano. O último plano do original termina e entra os créditos da sequência. A ligação está feita.

Desta vez, o ponto de vista (de câmera tremida) não é de uma equipe jornalística e sim militar. Quatro soldados da SWAT espanhola irão investigar a infecção junto com um membro do governo perito em quarentenas e infecções, o Dr. Owen (o excelente Jonathan Mellor, em ótima atuação). Um dos soldados têm uma câmera, a pedido de Owen, para registrar a pesquisa do prédio, além de cada soldado ter uma mini-câmera no capacete. Pronto, está explicado nosso ponto de vista, e temos um começo para a estória seguir. Lá vão os cinco para dentro do prédio, passando por um corredor de plástico, com muita luz em volta, branco, áureo, clean – dando a transição de ambiente para os personagens, da segurança (o externo desinfectado) para um verdadeiro inferno (o prédio infectado).

Lá dentro, obviamente, zumbis ferozes atacam a primeira carne fresca que vem. Logo a equipe está no quarto do padre que fazia pesquisa com a menina Medeiros no prédio, uma garota possuída pelo demônio que teve autorização do Vaticano de ser estudada (aonde o primeiro filme acaba). Com toda aquela parafernália religiosa, pedaços de jornais colados, fotos, fichas, papéis, textos, livros, gravadores, equipamento médico; os truculentos militares (representando a vontade, a força, “bater depois perguntar”) literalmente põem na parede o Dr. Owen (que apenas fala, argumenta, justifica, representando a razão), que se revela padre Owen, vindo do Vaticano para conseguir uma amostra do sangue de Medeiros e encontrar um antídoto.

O que era zumbis ferozes e sangue na tela se transformou em seres-humanos possuídos, envolvendo rezas, cruz amedontrando os possuídos; exorcismos. O que era um filme de zumbi se transformou num filme de exorcismo. Há uma troca de posição de roteiro brusca. Isso aumenta e muito a probabilidade de rejeição, trocando o subgênero tão substancialmente.

O que era sequências vertiginosas e violentas uma atrás da outra, gerando um grande clímax dentro do público, deu espaço para reflexões, diálogos, planos contemplativos e trabalhados. Obviamente temos o mesmo estilo – gritos, câmera na mão, sangue, violência. Mas juventude experimental deu lugar para a maturidade cinematográfica de uma dupla de diretores que atingiu o sucesso quanto à “vamos explicar isso”. E esse amadurecimento, ao contrário de outros realizadores, não fora proveitoso para o resultado final.

Para piorar, no meio do filme temos a troca de ponto de vista para adolescentes com uma câmera caseira que invadem o prédio de forma marginal e ilegal. Lá, vivem um inferno. Posteriormente, há uma volta ao ponto de vista original. Isso é totalmente desnecessário e desgastante. Há uma bela surpresa perto do final, porém, o desfecho é pouco interessante.

O amadurecimento da série fora prejudicial. Obviamente temos a base do sucesso do primeiro longa-metragem, porém, a essência mudou, e se perdeu muito na continuação do que se tinha anteriormente. A dupla Bagualeró/Plaza não errou, apenas não melhorou, como se era esperado. Pelo menos por mim.

Thiago Köche é bacharel em Realização Audiovisual pela UNISINOS (RS).

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Este post tem um comentário

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    Diego

    Concordo plenamente com você! Aliás, na maioria das vezes, eu prefiro a sua resenha do que qualquer merda que escrevem no Omelete. 😉

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