19º Festival Internacional de Animação do Brasil Anima Mundi

Por Thiago Jacot*



Neste ano de 2011 o Festival Internacional de Animação do Brasil Anima Mundi entrou na sua décima nona edição, mostrando ser um dos mais importantes eventos do calendário do audiovisual brasileiro. Porta de entrada para produções nacionais e internacionais, o Festival teve recorde de inscrições com mais de 1300 curtas e longas de animação, oriundos de cerca de 80 países. Neste ano, a curadoria selecionou 421 filmes de 44 países para as mostras principais. Depois do Brasil, que comparece com 77 produções, seguem França, com 58, Reino Unido (40), Estados Unidos (31), Alemanha (18), Canadá (14) e Rússia (13). Ainda completam a lista países como Taiwan, Grécia, Lituânia, Mônaco, Letônia, Colômbia, Índia, Israel e Estônia.

O Festival é divido em dois grandes blocos que acontecem em duas cidades. Primeiramente, temos o Anima Mundi que aconteceu durante dez dias no Rio de Janeiro, de 15 a 24 de julho no Centro Cultural Banco do Brasil, Centro Cultural Correios, Casa França-Brasil, Odeon BR, Arteplex Botafogo, Oi Futuro Flamengo e Ipanema, e seguiu para São Paulo, entre 27 a 31 de julho, no Memorial da América Latina,  Centro Cultural Banco do Brasil, Espaço Unibanco Augusta e Cine Livraria Cultura.

Minha principal impressão foi o cuidado e o capricho da organização com os mínimos detalhes. Os diretores do festival faziam

Animador estoniano Priit Pärn

rigorosas visitas aos locais de exibição e se preocupavam a todo o instante com a qualidade delas, observando atentamente o andamento das projeções digitais e em película 35mm. Outro ponto positivo é o preço das entradas. Inteira R$8,00(oito reais) e meia R$4,00(quatro reais). Esse valor é muito acessível em comparação à maioria dos cinemas, o que permitiu a um variado e grande público ter acesso aos filmes do festival, incentivando os que não possuem o hábito de assistir a animações a assistir e a entrar em contato com distintos estilos de animação que a programação ofereceu. E que baita programação, diga-se de passagem. Também podemos destacar a arte conceitual do Anima Mundi. O animador estoniano Priit Pärn, convidado especial da edição 2009, criou o conceito de todas as peças gráficas do Anima Mundi 2011: logo, cartazes, catálogos e produtos. Como o cartaz no início do texto.

As novidades continuam com a inclusão de uma sessão de terror na mostra competitiva de curtas, composta pelos melhores exemplares do gênero produzidos no último ano, e as mostras especiais, como a mostra de animação chilena Chilemonos, que tive a oportunidade de assistir inteira. Uma mistura das melhores sensações visuais que o mundo da animação nos oferece. Foram muito felizes na seleção dessa mostra. Também alguns episódios inéditos da série em stop-motion Shaun the Sheep (série exibida pela TV Cultura no Brasil), produzida pela Aardman (produtora dos conhecidos pelo público brasileiro, A Fuga das Galinhas (Chicken Run, 2000), Wallace & Gromit – A

Chilemonos

batalha dos vegetais(The curse of were-rabbit, 2005) e Por Água Abaixo(Flushed away, 2006). Sou suspeito para falar dessa série, pois sou um grande fã. Aparentemente o seriado possui um ar infantil, mas possui na sua composição um humor inteligente e recheado de referências, que na verdade, caberiam em outro artigo, sem falar no inconfundível conceito de estilo de animação assinado pela Aardman. Os diretores do festival ainda convidaram quatro longas, que integraram as mostras não-competitivas. Entre eles estão o brasileiro Morte e Vida Severina, inspirado no poema de João Cabral de Melo Neto, e Chico e Rita, primeiro longa de animação do diretor espanhol Fernando Trueba, co-dirigido com o desenhista Javier Mariscal e seu irmão, Tono Errando. A obra retrata a história de amor entre uma cantora e um pianista na Havana de 1948, com música do cubano Bebo Valdés e participação da cantora de flamenco Estrella Morente.

Ainda integrando as mostras especiais temos a Mostra Pixar, celebrando os 25 anos do estúdio com uma seleção de seus trabalhos em curtas metragens de animação, a retrospectiva de filmes de animação franceses, com o espetacular La Planète Sauvage (Planeta

Shaun the Sheep

Fantástico) que foi exibido aqui nos anos 1970 com o nome de “Planeta Selvagem”. Obra-prima de ficção científica animada permanece como referência para muitos outros trabalhos posteriores do gênero. Seguimos com o Futuro Animador Adulto, feito por educadores, assim como jovens e adultos de diversas profissões, que estão tendo o seu primeiro contato com a animação através de oficinas e cursos livres de animação em todo o mundo.

No ano em que a animação Rio – dirigida pelo brasileiro Carlos Saldanha alcançou milhões de espectadores e destacou o país mundo afora, nada mais apropriado do que seu convite para o evento. Freqüentador do festival desde a sua primeiríssima edição, Saldanha teve um Papo Animado dedicado aos seus trabalhos e também participou de um dos debates do VI Anima Fórum, série de encontros que debate os rumos e as novidades do mercado.

Morte e vida Severina

Composto de quatro mesas, o fórum discutiu temas como as dificuldades de um bom roteiro, os desafios da animação brasileira e as relações entre estúdios e animadores. A palestra de Saldanha (‘Rio – Quadro a Quadro’) abordou detalhadamente todos os passos necessários para se realizar uma superprodução animada, da concepção ao lançamento em escala mundial. O encontro coroa o amadurecimento da animação brasileira e prepara o terreno para se investir nesta modalidade de produção bem mais exigente em termos de preparação, estrutura e investimento. Esse encontro apenas aconteceu no Rio de Janeiro, o cineasta não teve agenda para São Paulo.

Chico e Rita

O Anima Mundi 2011 recebeu ainda a visita do mestre do anime Shinichiro Watanabe, japonês que dirigiu os cultuados seriados Cowboy Bebop e Samurai Champloo. Watanabe se destaca pelo refinamento visual e musical de seus trabalhos – ele é um grande conhecedor e admirador da música brasileira. Além de seu Papo Animado, foi exibido o longa Cowboy Bebop – o filme e uma sessão retrospectiva, na qual participa um episódio inédito de uma curiosa série de anime inspirada na realidade brasileira, Michiko e Hatchin, em que Watanabe atuou como diretor musicOutro que veio trocar experiências com o público brasileiro é o americano David Daniels. Conhecido pelo trabalho em diversas vinhetas publicitárias e clipes musicais (como em ‘Big Time’, de Peter Gabriel), ele falou sobre uma técnica criada e desenvolvida por ele, a strata-cutanimation, que constrói o

Carlos Saldanha

movimento através de fatias em sequência de um mesmo bloco demassinha. Já a também americana Miwa Matreyek mostrou porque é um dos nomes mais disputados por renomados festivais de arte internacionais. Posicionada atrás de uma tela, que exibiu seu filme de animação projetado, Miwa interagiu com as imagens e mesclou os conceitos de animação, teatro e artes visuais. Ela apresentou sua performance no festival. Novamente, os convidados especiais apenas se apresentaram no Rio de Janeiro. Podemos pensar em São Paulo como sendo uma versão menor do festival, mesmo porque, as premiações de júri técnico só acontecem no Rio de Janeiro, deixando também para São Paulo o júri popular.

Nas últimas duas décadas, o Anima Mundi sempre esteve conectado e atento às inovações tecnológicas e toda a sua interferência na forma de produzir animação. Prova disso é a longevidade dos concursos Anima Mundi Web, de 12 anos, e Anima Mundi Celular, com sete edições. Devido à permanente evolução dessas mídias, a partir do ano passado os dois concursos estão integrados em apenas um, o Anima Web & Celular.   A 19ª edição comemora também o décimo aniversário do Anima Escola, projeto pioneiro de capacitação na linguagem da animação, especialmente concebido para os professores de escolas públicas. Em algumas aulas práticas e teóricas, professores e alunos participam de um programa pedagógico durante o qual realizam filmes de animação.Nestes dez anos, o projeto capacitou quase dois mil professores da rede municipal carioca de ensino e se tornou Ponto de Cultura, atuando também na rede estadual. Sem falar na produção de centenas de filmes, que

Cowboy Bebop

participam do Anima Mundi na mostra Futuro Animador e de outros festivais no Brasil e no exterior.

Minha tentativa é sintetizar e descrever, talvez em vão, todo universo da animação na programação do Anima Mundi. A programação é gigantesca, e oferece atividades e exibições para os mais variados públicos. Desde a exibição em suas mostras competitivas e não competitivas, para os Papos Animados com profissionais e personalidades de animação, seguindo para os projetos educativos envolvendo a linguagem de animação, como os Anima Escola e as exibições do Futuro Animador e por fim um fórum que discute o andamento do mercado de animação. Sem dúvida, um dos mais interessantes festivais brasileiros de audiovisual que merece nosso prestígio. O Anima Mundi ultrapassa o simples conceito de exibições e mostras e atinge níveis de interação fantásticos entre o público e a produção audiovisual no segmento de animação. A lista de premiados no Rio de Janeiro e São Paulo pode ser conferida no site www.animamundi.com.br, assim como alguns trabalhos que podem ser assistidos on line. Para quem perdeu deste ano, tente se programar para o ano que vem e aproveitar uma seleção especial da produção mundial de animação.

Thiago Jacot é graduando do curso de Imagem e Som da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

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