A construção das vilãs na novela Sangue Bom e suas relações com o melodrama

Amanda Rosasco Mazzini*

Resumo: O presente artigo visa analisar a construção de duas das personagens vilãs da novela global Sangue Bom, que foi ao ar em 2013. A influência do gênero melodrama nas novelas globais será tomada como base para a análise das personagens.

Introdução

A novela Sangue Bom foi ao ar de 29 de abril até 01 de novembro em 2013 com 161 capítulos. Em questão de audiência, teve uma média de 25 pontos e foi melhor que sua antecessora, “Guerra dos Sexos”, que fechou com média de 23 pontos¹. Foi uma novela excepcional, pois conseguiu desenvolver com eficiência dezenas de personagens além de seus protagonistas e foi atualizada com seu tempo histórico, questionando quem são os ídolos construídos pela mídia e aceitos pela sociedade.

Centrada em seis personagens principais, Amora, Bento, Malu, Fabinho, Giane e Maurício, a novela abordou o universo das celebridades e das subcelebridades, com personagens buscando a fama, a riqueza ou o amor. De maneira bem humorada, a novela escrita por Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari trabalhou as diferentes personalidades que se fazem e se desfazem na mídia, em especial, Bárbara Ellen e Amora, que serão tratadas no presente artigo.

Um primeiro olhar sobre as vilãs

Bárbara Ellen era a atriz de televisão que estava em decadência, mas que tramava diversos planos para voltar aos holofotes. Extremamente caricata, lembrava Norma Desmond de Crepúsculo dos deuses (Sunset Boulevard, Billy Wilder, 1950) por rejeitar a aposentadoria de sua fama. No último capítulo, Bárbara confirma sua caricatura ao participar do reality show de título sugestivo “A Que Ponto Chegamos”, similar ao Big Brother Brasil ou A Fazenda, mas apenas com integrantes ex-famosos.

Bárbara é uma contradição. Apesar de ser uma caricatura, é perfeitamente verossímil. É uma atriz que nunca deixa de atuar, o exagero lhe garante um tom cômico, mesmo quando está ferindo outro personagem. É nos momentos em que sua atuação é menos estereotipada que sua personalidade vilanesca é mais evidente. Em um dos capítulos finais, por exemplo, diz que não se importa com seus filhos adotivos, pois eles não são seus filhos de verdade. Seu tom de voz se torna mais cínico e calmo, característico de uma personagem calculista.

Amora, uma de suas filhas adotivas, era a it-girl, uma espécie de referência de estilo de vida, e possuía inclusive um fã-clube próprio. Mas nem sempre foi assim: na infância, Amora era uma menina em situação de rua, que não possuía nem sapatos. Uma amargura que se reflete na fixação da personagem por sapatos: logo no terceiro capítulo, Amora compra vários pares iguais. A personagem passa a novela tentando balancear seu status com o amor a Bento, um floricultor distante dessa vida luxuosa, mas que fez parte de sua infância.

Amora participa ativamente das artimanhas de sua mãe, especialmente para conseguir enriquecer Bento e se casar com ele. Já casada, Amora abandona sua vida de celebridade e vira uma dona de casa insatisfeita. Quando suas mentiras são reveladas, Bento a abandona e ela precisa ser financeiramente independente e cuidar dos sobrinhos, que lhe foram deixados quando sua irmã Simone faleceu. Apenas a partir desse momento Amora perde os traumas da infância e passa a viver sem precisar do luxo. Essa redenção é acompanhada pela negação à própria Bárbara Ellen.

Amora e Bárbara Ellen foram duas personagens centrais na obra e que sintetizaram muitas das eventuais críticas à indústria midiática ao apontarem as consequências da fama e da riqueza a qualquer custo. Exemplo máximo, que foi até mesmo comentado pelo jornalista Maurício Stycer, foi quando Bárbara Ellen confronta a jornalista de fofocas Sueli Pedrosa sobre os abusos da invasão da privacidade de celebridades e da apropriação indevida de suas imagens. O contexto é o seguinte: Bárbara está falida e morando com outra ex-celebridade, Vitinho, quando Sueli, que recentemente foi abandonada por sua namorada Vivian, aparece em sua casa para fazer uma matéria. Stycer narrou a cena:

“Como é que você ainda tem forças para atormentar a vida das pessoas depois do golpe duríssimo que sofreu?”, pergunta Barbara. “Não tenho a menor ideia do que você está falando”, responde Sueli. “Ah, não? Estou falando da traição da Vivian. É só você acessar o Mexerico.com. Eu pessoalmente documentei o seu chifre e a rejeição dela. E postei no site mais terrível do Brasil, depois do seu.” Após ver as imagens no celular de Barbara, Sueli diz: “Isso é covardia com a minha vida pessoal. Isso é covardia.” Entra em cena, então, Vitinho, que observa: “Ué? E não é você que é especialista em transformar em espetáculo a miséria alheia?”. A resposta de Sueli é ótima, lembrando que o jogo do jornalismo de celebridades é de mão dupla. “É diferente. As celebridades me usam para se promover. Eles aproveitam desses boatos e escândalos para faturar em cima.” Mas Bárbara não aceita o argumento e contrapõe: “E você não? Quem nos julga e distorce a verdade em busca de audiência entra na mesma mira do que a gente, sua cretina!” Neste ponto ela é mais uma vez ajudada por Vitinho, que sentencia: “E fica tão suja quanto os famosos que critica, sua burra.”²

Assim, Sangue Bom realiza uma metalinguagem crítica sobre o próprio star system da Globo. Segundo Giselle Gubernikoff, a televisão “expõe a maioria de nossos atores ao grande público, operando em um sistema de divulgação semelhante ao dos grandes estúdios americanos, com direito a revistas de fãs, divulgação de fofocas, etc.” (GUBERNIKOFF, 2009: 75).

E essa metalinguagem de Sangue Bom aparece também a partir de referências a outras novelas globais. A vilania de Bárbara Ellen e Amora era tão evidente que elas e outras personagens debochavam disso fazendo comparações com vilãs de outras novelas. Em um desses momentos, Bárbara se compara à Adriana Esteves, intérprete da personagem Carminha em Avenida Brasil: “Eu sim é que teria sido uma ótima Carminha”³. Amora também protagonizou um desses momentos, no qual a personagem Giane comparou Amora a duas vilãs da novela Vale Tudo: “Nem a Odete Roitman e a Maria de Fátima, juntas, são piores que você”4, em referência às personagens de Beatriz Segall e Glória Pires. O fato de a novela frequentemente recorrer ao uso de referências a personagens de outras novelas globais ou até mesmo a outras atrizes da mesma emissora, assumindo a metalinguagem e potencializando a discussão sobre as construções das celebridades foi um ponto positivo.

A influência do melodrama

Vilãs como Bárbara Ellen e Amora são cada vez mais comuns nas novelas brasileiras e demonstram as possibilidades que as personagens femininas podem alcançar desde o advento dos filmes noir e do Cinema Moderno, quando foram libertas de sua função de serem exemplares do comportamento feminino. Anteriormente é possível observar personagens femininas construídas sobre arquétipos e estereótipos, bem como vilãs inseridas em tramas maniqueístas, e que poucas vezes apresentam origem e/ou justificativas para suas maldades.

Em relação às personagens femininas, as novelas, como popularizadas pela Globo, tem afinidade com um gênero cinematográfico que se situa entre os filmes clássicos e os modernos, e que teve um grande auge na década de 1950, na qual as questões feministas estão latentes, como a independência financeira e sexual, por exemplo, e estão prestes a serem liberadas com os movimentos culturais, sociais e políticos da década de 1960. É o gênero do melodrama, associados aos “woman’s film”, filmes centrados em personagens femininas e com um forte apelo ao público feminino.

O melodrama está presente no subtexto da atuação, das entrelinhas do diálogo e da mise-en-scène. Há uma tensão entre aparência e essência, que se materializa na atuação carregada e em uma plasticidade da imagem saturada de signos e significados. As estruturas sociais engessadas e arcaicas são confrontadas por personagens inconformados com sua própria condição de reprimidos. Segundo Jane Gaines, o melodrama irá narrativizar “the disjuncture between the hoped for new possibilities and the stubborn old social realities hardened by gender inequality”5 (GAINES, 2010: 24).

Os melodramas irão transcorrer com frequência em narrativas de cunho moral. É o caso de Stella Dallas (King Vidor, 1937) e Imitação da vida (Imitation of Life, Douglas Sirk, 1959), por exemplo. O crítico Luiz Carlos Oliveira Jr. comenta essa dimensão do melodrama:

“Um dos aspectos centrais do melodrama seria justamente sua extraordinária capacidade de usar ações e os fatos do mundo real, da vida social, como uma espécie de metáfora que se reporta ao reino da verdade espiritual e dos significados morais latentes. A realidade é amplificada por uma dramaturgia do excesso que torna sensível a presença, nas situações do dia a dia, de motivações obscuras, de emanações do inconsciente (essa região do ser em que se escondem nossos desejos elementares e nossos tabus). Dentro de um contexto aparentemente realista e cotidiano, encena-se um drama hiperbólico e sobrecarregado.” (OLIVEIRA JR, 2012: 42)

A questão da moral está presente principalmente na trajetória de Amora. A personagem tenta justificar suas vilanias pelo amor que sente por Bento e esse lapso de sentimento verdadeiro somado ao seu passado traumático torna a vilã ambígua, mesmo para o espectador.

Apesar de o público estar ciente de suas artimanhas, Amora sempre procurou escondê-las dos outros personagens, manipulando-os facilmente. Apenas ao final da novela, quando as suas vilanias começaram a ser reveladas, que ela começou a entrar em descrédito. Nesse momento, Amora é ameaçada de vingança e os outros personagens custam a acreditar que não é mais um plano da vilã para manipulá-los. Maurício, inclusive, se apropria da fábula do pastor e do lobo para se referir às mentiras de Amora, na qual o pastor mente várias vezes sobre a presença do lobo no rebanho, e quando o lobo realmente aparece, ninguém mais acredita no pastor. Amora é, então, abandonada por todos os personagens, exceto por sua irmã Simone e seus sobrinhos. Isso fez com que ela reavaliasse suas atitudes e alcançasse uma felicidade que não tivesse fim na riqueza material. Há, portanto, uma mudança de personalidade moralista e uma espécie de redenção para Amora, mas isso não ocorre para Bárbara.

Ao espectador, são também reveladas as atitudes vilanescas de Bárbara Ellen, mas tão logo os outros personagens descobrem sua verdadeira personalidade, sua constante atuação e sua posição de vilã. Assim, eles passam a encará-la com desdém e as cenas alcançam um tom cômico pelo fato de Bárbara tentar dissuadi-los do contrário, sempre de maneira extravagante. Ao final, Bárbara permaneceu com a caricatura da diva decadente, mas perdeu toda a fortuna e, o que não considerava importante, a guarda e/ou a afeição de seus filhos.

“Em princípio, o melodrama é composto por dramas familiares e, portanto, tem como cenário central o lar, composto por arquiteturas labirínticas, profusões de espelhos e escadas. É um ambiente propício para tramas que envolvem segredos, passados que assombram e personalidades ambíguas. E é no lar que a mulher tem mais presença do que o homem, historicamente, o que favorece a presença de protagonistas femininas fortes.” (OLIVEIRA JR, 2012: 46).

Bárbara Ellen, em pé, seus filhos adotivos, Dorothy, Luz, Kevin e Amora, e Maurício, noivo de Amora.6

Condizente com o melodrama, um dos cenários principais de Sangue Bom é a mansão de Bárbara, na qual a vilã comanda sozinha. Procura sempre chamar a imprensa para visitar a casa e apresentar a imagem de uma família perfeita e caridosa, especialmente por ser uma mãe adotiva solteira. Bárbara Ellen garante que seus filhos sofriam muito antes de seus cuidados e os usa para melhorar sua própria imagem na mídia, afirmando falsamente, por exemplo, que Kevin é homossexual, negro e sofre de distúrbios alimentares.

As escadas, em especial, também refletem a questão da mobilidade social que cerca os melodramas e as novelas brasileiras. Em Sangue Bom, as duas vilãs não pertenciam à classe alta no passado e as duas rejeitam a ideia de voltarem a serem o que eram antes. Essa vergonha que alguns personagens sentem pelas próprias origens é outro elemento comum nos melodramas. Por exemplo, em Imitação da vida, na qual Sarah Jane se envergonha por ter uma mãe negra.

O próprio título da novela faz o trocadilho com a questão das origens sociais e/ou familiares. “Sangue bom” pode ser usado como referência a pessoas que possuem um bom caráter, mas também pode fazer referência a relações de sangue. Várias tramas da novela partem do ponto de vista de personagens que não sabem suas origens e estão buscando conhecê-las, inclusive a partir de testes sanguíneos. As descobertas podem indicar um “sangue bom”, ou seja, indicar que o personagem é um grande herdeiro e/ou que possui parentes de bom caráter.

A representação da mulher no melodrama

Douglas Sirk é um forte representante do melodrama e do cuidado com as personagens femininas. O diretor foi conhecido por fazer melodramas familiares se utilizando de roteiros que continham sátiras sociais ou comédias de costumes, especialmente durante seu período na Universal International (CARLOS; GUIMARÃES, 2012: 23). É apontado que nos filmes de Sirk, as personagens centrais são as femininas, e os homens são “relegados à posição de vítimas ou meros espectadores das ações femininas” (CARLOS; GUIMARÃES, 2012: 25).

É uma definição aplicável à Sangue Bom. As personagens femininas, além das duas vilãs, são as decisivas para o rumo da trama, frequentemente manipulam os personagens masculinos para alcançarem seus objetivos e decidem com quem querem se relacionar amorosamente ou se simplesmente não querem se relacionar. Toma-se como exemplo o fato de Bárbara Ellen ter engravidado do cineasta Plínio Campana apenas para conseguir sua fortuna e buscar a fama.

Há outra característica marcante de Sirk em Sangue Bom, é o que Ismail Xavier, ao analisar o diretor, chama de “dupla moldura”. Segundo Xavier (2012: 104), os filmes de Sirk estão sujeitos a uma dupla leitura: a primeira, mais superficial, se manifesta pela aceitação da realidade aparente do filme e dos exageros como meros artifícios a favor das emoções; e uma segunda leitura, para um público que percebe a ironia nos exageros das convenções sociais e de seus códigos, como dispostos no filme.

Um bom exemplo é o de Tudo o que o céu permite (All that heaven allows, Douglas Sirk, 1955), no qual Sirk dispõe uma mulher viúva de meia-idade se envolvendo com um jovem jardineiro. Os filhos e os amigos se envergonham da mulher e afirmam que é uma incoerência ela se relacionar com um homem mais novo e de classe social mais baixa. Os velhos códigos sociais estão confinados dentro de uma casa, por trás das janelas fechadas, arraigados nos amigos da mulher que criticam o casal que acaba de chegar de carro para uma festa. Aparentemente, o filme condena o caso amoroso. Mas em uma segunda leitura, o excesso de humilhações pode e deve ser visto como a revelação das hipocrisias de uma sociedade que não aceita que uma mulher possa se relacionar com outro homem depois da morte de seu marido, e rejeita com escárnio a ideia de que esse homem jovem pode lhe dar prazer sexual, sem contar a rejeição contra o fato de ele ser de uma classe social mais baixa.

Tudo o que o céu permite (All that heaven allows, Douglas Sirk, 1955)

A novela, em uma primeira leitura, poderia passar como um alienante entretenimento sobre celebridades e suas frivolidades, entretanto, ao caricaturizar e exagerar seus códigos, os colocou no nível do absurdo, do cômico, e foi possível conceber uma visão crítica sobre eles e encará-los como uma ironia. A novela, ao apresentar Bárbara Ellen, uma atriz que nunca deixa de atuar, conseguiu denunciar uma realidade que estava apenas latente: o entretenimento e sua indústria são sempre atuação, sempre construção, tanto como ficção quanto bastidores.

O melhor exemplo talvez seja a personagem Damáris. Ela assumiu sua dupla personalidade: a primeira, de uma mulher que se diz extremamente religiosa e casta, e a segunda, nomeada de Gládis, é a de uma mulher que gosta de explorar seu lado sexual. O espelho é o objeto que emoldura o jogo do duplo e permite que as duas personalidades conversem e troquem ofensas entre si. Gládis chega a assumir explicitamente a ironia da personagem de Damáris ao afirmar: “Porque ela é uma hipócrita, que não assume o que quer e fica aí julgando os outros, apontando o dedo na cara das pessoas! Falsa, fingida, histérica!”.7

Damáris e Gládis no espelho.8

No final, as duas personalidades se aceitam e passam a conviver em harmonia: dentro do ambiente doméstico, Damáris é a que predomina, enquanto quem impera no motel é Gládis. E isso assume de maneira pejorativa a ambiguidade com que as mulheres são representadas no cinema, especialmente em melodramas:

“Here we would understand ideological contradiction, for instance, in the expectations placed on women to be sexual as well as pure, to be a mother and yet to give up a child, and to work day and night but to receive no pay for love’s labor. “9(GAINES, 2010: 31)

O melodrama, em sua origem cinematográfica, já estava relacionado com a dupla leitura. Para Jane Gaines, no início do cinema houve uma “cinematificação” do mundo, a busca pela representação de tudo e todos no cinema. Entretanto, era apenas uma ilusão afirmar que tudo, em qualquer momento, pode ser representado cinematograficamente (GAINES, 2010: 23). Quando o cinema se aventurou na ficção e as câmeras adentraram nos ambientes domésticos, percebeu-se que algumas situações estavam em desacordo com a enfeitada “realidade” das culturas oficiais e eram “irreais” para serem exibidas (GAINES, 2010: 27).

Os filmes que conseguiram driblar os censores foram bem-sucedidos porque afirmavam que as situações escandalosas que representavam podiam ser exibidas, pois elas eram “somente” ficção. Portanto, no melodrama doméstico do período silencioso, o silêncio era duplo: os filmes eram mudos também pelo fato de carregarem temas sobre os quais a sociedade permanecia em silêncio, como infanticídio, adultério, prostituição (GAINES, 2010: 32). Usava-se do melodrama para introduzir o debate de questões atuais e feministas. A intenção era dizer tudo sem, de fato, dizer nada (GAINES, 2010: 27).

Assim o jogo duplo do melodrama permaneceu através das décadas e encontrou um terreno fértil no Brasil para problematizar questões sociais e de cunho feminista. Como afirma Giselle Gubernikoff: “Na história da cinematografia brasileira, podemos observar uma forte influência do sistema patriarcal e de seus valores, já que a participação da mulher na sociedade nunca foi total” (GUBERNIKOFF, 2009: 74). Essa influência se dará em dois tipos de produtos audiovisuais: o primeiro são os que reproduzem os estereótipos e arquétipos produzidos por uma sociedade patriarcal; e o segundo, produtos que apenas aparentemente os reproduzem, mas que se apropriam desses estereótipos para criticá-los.

Conclusão

Sangue Bom, como foi visto, claramente faz parte do segundo grupo, pois exagerou estereótipos e arquétipos femininos para alcançar a ironia. Sintetizou questões do star system brasileiro e problematizou quem são nossas celebridades, o que elas escondem embaixo da aparência construída. Apresentou um tom cômico e não pretendeu ser uma exceção de autocrítica da grade global, uma vez que essa autoconsciência da influência da emissora é assumida.

Sangue Bom apresentou personagens femininas condizentes com as que vêm sendo criadas em outras novelas, mas a dimensão do exagero nos arquétipos e estereótipos foi um ponto positivo e com grande potencial de significação. E as vilãs, em específico, possuíram um bom diálogo com o melodrama, tendo como características principais o duplo e o exagero de suas personalidades.

*Amanda Mazzini Rosasco é graduanda em Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos, foi bolsista do Programa Jovens Talentos para a Ciência (Capes) e atualmente desenvolve Iniciação Científica (CNPq) sobre a representação da mulher no cinema de Walter Hugo Khouri.

Bibliografia

CARLOS, Cássio Starling; GUIMARÃES, Pedro Maciel. Douglas Sirk, o príncipe do melodrama. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil; Ministério da Cultura, 2012.

GAINES, Jane. Women and the cinematification of the world. In: BULL, Sofia; WIDDING, Astrid Söderbergh (orgs.). Not so silent: women in cinema before sound. Estocolmo: Stockholm University, 2010. p. 20-38.

GUBERNIKOFF, Giselle. A imagem: representação da mulher no cinema. Conexão – Comunicação e Cultura. Caxias do Sul, jan./jun. 2009. p. 65-77.

OLIVEIRA JR, Luiz Carlos. Em defesa do melodrama. In: Douglas Sirk, o príncipe do melodrama. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil; Ministério da Cultura, 2012. p. 39-48.

XAVIER, Ismail. Os excessos, a dupla moldura e a ironia do mestre do melodrama. In: Douglas Sirk, o príncipe do melodrama. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil; Ministério da Cultura, 2012. p. 87-104.

http://tvg.globo.com/novelas/sangue-bom/index.html. Acesso em 07 de dez. de 2013.

 

¹ Cada ponto no Ibope equivale a 62 mil domicílios na Grande São Paulo. Disponível em: http://outrocanal.blogfolha.uol.com.br/2013/11/19/ibope-amplia-medicao-de-audiencia-de-tv-paga/. Acesso em 07 de dez. de 2013.
² Disponível em: http://mauriciostycer.blogosfera.uol.com.br/2013/10/30/sangue-bom-da-recado-a-jornalista-de-celebridade-que-distorce-a-verdade/. Acesso em: 09 de dez. de 2013.
³ http://mauriciostycer.blogosfera.uol.com.br/2013/11/02/ate-no-fim-sangue-bom-foge-do-obvio-e-nao-faz-concessao-ao-espectador/#fotoNav=2. Acesso em 10 de dez. de 2013.
http://mauriciostycer.blogosfera.uol.com.br/2013/11/02/ate-no-fim-sangue-bom-foge-do-obvio-e-nao-faz-concessao-ao-espectador/#fotoNav=9. Acesso em 10 de dez. de 2013.
5 Tradução nossa: a disjunção entre as expectativas perante as novas possibilidades e as velhas e teimosas realidades sociais, endurecidas pela desigualdade de gênero.
http://tvg.globo.com/novelas/sangue-bom/por-tras-das-cameras/noticia/2013/04/ter-ou-ser-autores-contam-tudo-sobre-a-criacao-da-trama-de-sangue-bom.html. Acesso em: 10 de dez. de 2013.
7 Disponível em: http://tvg.globo.com/novelas/sangue-bom/Vem-por-ai/noticia/2013/08/ca-te-espera-damaris-gladis-do-cabucu-promete-se-vingar-ela-e-hipocrita.html. Acesso em: 10 de dez. de 2013.
8 Disponível em: http://mdemulher.abril.com.br/blogs/jorge-brasil/curti-nao-curti/curti-dialogo-no-espelho-entre-damaris-e-gladys-em-sangue-bom/. Acesso em 10 de dez. de 2013.
9 Tradução nossa: Aqui nós entenderíamos uma contradição ideológica, por exemplo, nas expectativas dirigidas às sobre mulheres para que sejam tanto sexuais como puras, para serem mães e ainda abandonarem uma criança, e para trabalharem dia e noite, mas não receberem nenhum pagamento pelo trabalho de amor.

 

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