A questão do sujeito contemporâneo no filme Crime Delicado, de Beto Brant

Fernanda Salvo é mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

—————————

Resumo

No presente artigo buscamos realizar uma crítica da sociedade e da cultura contemporâneas, evidenciando a fina articulação entre textos culturais midiáticos e contexto social em que surgem. Para tanto, utilizamos o filme Crime Delicado (2005), do diretor Beto Brant, como ponto de partida para refletir sobre a questão do sujeito contemporâneo – esse sujeito apontado tantas vezes por teóricos (JAMESON, 2006; KELLNER, 2001; BAUMAN, 1998) como fragmentado, desconexo e descentrado – constituído num cenário e numa cultura pós-modernas.
A idéia que nos norteia é a de que o cinema de Beto Brant, ao demonstrar preocupação recorrente com a exploração das relações humanas e da experiência dos sujeitos, possa ser encarado como lócus privilegiado para a observação de como tal sujeito tem sido midiaticamente representado.
Sendo assim, iniciamos o artigo propondo um retrospecto do cinema da retomada, por considerarmos importante situar o cenário em que surgiram os filmes do cineasta Beto Brant, bem como as características mais marcantes de seu trabalho. Em seguida, apresentamos nossa metodologia de análise, que privilegia a realização de uma crítica diagnóstica da cultura, numa aproximação da perspectiva dos Estudos Culturais. Por último, fazemos uma breve discussão sobre as questões introduzidas no campo discursivo do filme Crime Delicado.

1. Retomada no Cinema Brasileiro

Retomada é nome que se dá ao cinema realizado no Brasil dos anos 1990 até agora. O termo refere-se ao processo de recuperação da produção cinematográfica brasileira e ao estabelecimento das bases de uma indústria de produção nacional, depois da grave crise enfrentada pelo setor, no início da década de 1990.

A implantação do modelo econômico neoliberal no Brasil gerou graves conseqüências para a atividade cinematográfica. Ao tomar posse, o Presidente Fernando Collor de Mello – primeiro presidente democraticamente eleito após a ditadura militar – rebaixou o Ministério da Cultura a Secretaria e extinguiu alguns órgãos fomentadores e reguladores da atividade cinematográfica no País, como o Conselho Nacional de Cinema (Concine), a Fundação do Cinema Brasileiro e – no ato mais extremo – a Empresa Brasileira de Filmes S. A. (Embrafilme), que agonizava em seus últimos anos, mas permanecia como o principal sustentáculo do cinema nacional.

Tais medidas levaram a produção de filmes ao declínio quase total. Somente com muita dificuldade foram produzidos alguns títulos, que não podem ser considerados grandes sucessos nem de realização nem de público. Para alguns pesquisadores, como Lúcia Nagib, os dois primeiros anos da década de 1990 podem ser encarados como os piores já atravessados pelo cinema brasileiro. “Em 1992, apenas dois filmes de longa-metragem foram lançados no Brasil” (NAGIB, 2002:13).

A partir de 1993, no entanto, durante o mandato-tampão de Itamar Franco, medidas como a promulgação da Lei 8.685 – conhecida como Lei do Audiovisual (que cria mecanismos de captação via renúncia fiscal) – e o advento de leis de incentivos estaduais e municipais propiciaram o surgimento daquilo que se convencionou chamar de retomada no cinema brasileiro.

Amplamente difundido entre teóricos e jornalistas, o termo retomada passou a designar justamente aquele momento em que o cinema nacional conquistou um aumento considerável da produção e trouxe novamente o público para as salas de exibição. Segundo o então titular da Secretaria de Audiovisual, José Álvaro Moisés (Oricchio, 2003: 27), entre 1995 e 2001 o País produziu 167 longas-metragens, contra menos de 30 nos primeiros anos da década anterior. Estendendo-se a contabilidade até o final de 2002, chega-se ao número aproximado de 200 longas feitos e lançados durante o período[1].

Além disso, outros fatores estiveram em jogo para alavancar a retomada: o mais poderoso conglomerado de comunicações do País, a Rede Globo, entrou para o mercado de produção de filmes, criando a Globo Filmes; ao mesmo tempo algumas majors norte-americanas como Warner e Columbia viram com interesse estratégico o fomento da produção e da distribuição dos filmes nacionais, que surgiam agora com singular vigor.

Porém, Lúcia Nagib ressalta que a idéia de uma retomada no cinema não chegou a ser unanimidade entre os próprios realizadores (2002: 13):

Para alguns, o que houve foi apenas uma breve interrupção da atividade cinematográfica com o fechamento da Embrafilme, a seguir reiniciada com o rateio dos próprios recursos da produtora extinta, através do Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro. Em três seleções promovidas entre 1993 e 1994, o Prêmio Resgate contemplou um total de 90 projetos (25 de curta, nove de média e 56 de longa metragem), que foram finalizados numa rápida seqüência. Assim, o estrangulamento dos dois anos de Collor teria resultado num acúmulo de filmes nos anos seguintes, produzindo uma aparência de boom.

A utilização do termo retomada parece mais adequada levando-se em consideração o renascimento que se deu no âmbito da produção de filmes após seu estrangulamento com a política de Collor. Nesse sentido, torna-se relevante ressaltar que foram justamente o Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro – que injetou R$ 13 milhões em 90 projetos de curtas, médias e longas-metragens em todo o Brasil – e as leis de incentivo que criaram a oportunidade para que cineastas veteranos que estavam afastados dos sets de filmagem voltassem a filmar, ao mesmo tempo em que uma nova geração pudesse se revelar.

Com tais fomentos, a produção nacional continuou a crescer, muito embora a Lei do Audiovisual não tenha ficado isenta de críticas – como privilegiar demasiadamente os diretores de marketing das empresas na escolha dos argumentos dos filmes a serem produzidos. No entendimento de muitos cineastas, tais profissionais não possuiriam os requisitos necessários para avaliar as qualidades artísticas e estéticas dos projetos, sendo movidos, ainda, por interesses comerciais da própria empresa. De todo modo, é preciso lembrar que muitos dos longas-metragens do cinema pós-Embrafilme foram realizados com recursos de outras fontes – como concursos promovidos pelo governo federal – o que garantiu certa fuga do determinismo econômico, ao mesmo tempo em que se viabilizou a produção de filmes com bom nível de qualidade.

Os primeiros frutos da renovada produção começaram a aparecer, de fato, nos anos de 1994 e 1995, com o lançamento de títulos como A Terceira Margem do Rio (Nélson Pereira dos Santos, 1994), Lamarca (Sérgio Rezende, 1994) Alma Corsária (Carlos Reichenbach, 1994), Veja Esta Canção, (Carlos Diegues, 1994) Carlota Joaquina, princesa do Brazil (Carla Camurati, 1995), Terra Estrangeira (Walter Salles e Daniela Thomas, 1995) e O quatrilho (de Fábio Barreto, 1995).

A participação dos antigos e novos realizadores em orçamentos complementares do Prêmio de Regaste e das leis de incentivo auxiliou no delineamento daquela que se tornaria uma característica determinante da retomada: a descentralização da produção do eixo Rio-São Paulo – já que cineastas de vários estados puderam ser contemplados em seus projetos -, fato que gerou, conseqüentemente, a diversificação das temáticas cinematográficas. Essa pluralidade temática afirmou-se no conjunto dos filmes que, de modo geral, não apresentavam uma ligação com gêneros específicos, mas alternavam-se entre “comédias, filmes políticos, obras de denúncia, de entretenimento puro, filmes destinados ao público infantil, neochanchadas, policiais, épicos, etc.” (ORICCHIO, 2003: 29).

Porém, a natureza dessa diversidade não deixou de ser questionada por alguns teóricos. Para Ismail Xavier (2000), a tendência de se dizer que nos anos 1960/70 a unidade ideológica dos cineastas impediu que o cinema mantivesse postura e estilo mais diversificados é bastante equivocada, pois, em seu entendimento, aquele cinema havia preservado a liberdade de buscar as mais diversas alternativas e formulações criativas que se aliavam a projetos que tinham o objetivo último de pensar os rumos da arte cinematográfica, bem como os rumos das questões nacionais; em contrapartida, na produção contemporânea, a diversidade teria se dado num clima dispersivo, sem o real espaço para o debate crítico ou para o aprofundamento político, demonstrando um investimento muito maior na qualidade da produção, em detrimento de projetos mais densos, relativos, por exemplo, à luta por um cinema crítico às padronizações do mercado. Por isso mesmo, o autor defende que a variedade de estilos no cinema dos anos 1990 dificultou a identificação da “personalidade” deste mesmo cinema.

De fato, os anos de 1994 e 1995 foram caracterizados por grande hibridismo na produção nacional, ao mesmo tempo em que o traço comum mais fortemente identificável no trabalho dos diversos cineastas foi, sem dúvida, o tom pessoal e a autoria. Nesse sentido, é importante notar que a nova geração de cineastas não se ligou a projetos comuns, afastando-se definitivamente do viés ideológico e político que animou os realizadores do Cinema Novo – o grande modelo estético-representacional da cinematografia moderna no Brasil.

De todo modo, vale destacar que se os cineastas da retomada caminharam mais despreocupados no que diz respeito a um projeto de transformação nacional – proposta fundamental do Cinema Novo -, buscando alternativas comerciais que viabilizassem a realização de seus filmes e alinhando-se a uma estética cinematográfica transnacional, não é possível negligenciar que eles continuaram a operar numa chave de questionamentos sobre a identidade nacional, sobre o abismo de classes que separa a sociedade e sobre as contradições, dúvidas e impotências da nação. Tanto assim, que nos primeiros anos do cinema pós-Embrafilme, os cineastas dialogaram com a tradição do cinema brasileiro, lançando um olhar nostálgico ao passado e aos temas e espaços emblemáticos tão caros aos cinemanovistas. Desse modo, o sertão mitológico do cinema de Glauber Rocha foi revisitado em filmes como Corisco e Dadá (Rosemberg Cariry, 1996), Baile Perfumado (Paulo Caldas e Lírio Ferreira, 1997), Guerra de Canudos (Sérgio Rezende, 1997), O cangaceiro (Anibal Massaini Neto, 1997) e Central do Brasil (Walter Salles, 1998).

Mas é fundamental destacar que essa nova produção não ficou isenta de críticas por parte de alguns estudiosos, que acusaram os cineastas da retomada de privilegiar nesses filmes os aspectos estéticos e o bom acabamento das imagens (quase publicitárias), em detrimento do debate ético e político a respeito das temáticas focalizadas. Talvez a crítica mais aguda nesse sentido tenha sido endereçada pela pesquisadora Ivana Bentes (1999), que cunhou a expressão “cosmética da fome”[2] para denunciar a “espetacularização do sertão e da favela” promovida pelo cinema dos anos 1990. Como propõe a autora (1999: 87-8):

A idéia, rejeitada nesses filmes (do Cinema Novo), de expressar o sofrimento e o intolerável em meio a uma bela paisagem, ou de glamourizar a pobreza, ressurge em alguns filmes contemporâneos, filmes em que a linguagem e a fotografia clássicas transformam o sertão num jardim exótico, a ser “resgatado” pelo grande espetáculo (…) Passamos da “estética” à “cosmética” da fome, da idéia na cabeça e da câmera na mão (um corpo-a-corpo com o real) ao steadycam, a câmera que surfa sobre a realidade, signo de um discurso que valoriza o “belo” e a “qualidade” da imagem, ou ainda, o domínio da técnica e da narrativa clássicas. Um cinema “internacional popular” ou “globalizado” cuja fórmula seria um tema local, histórico ou tradicional, e uma estética “internacional” (Grifo nosso).

Com uma crítica menos aguda, Lúcia Nagib acredita que o movimento dos cineastas da retomada de voltar suas câmeras para a dura realidade nacional apontou, antes de tudo, para os sentimentos de ternura e a esperança que o Brasil nutria na década de 1990, num impulso nostálgico de buscar no cinema recente a utopia que alimentou os realizadores do Cinema Novo.

Mas vale destacar que após os primeiros anos da retomada a tendência nostálgica dos filmes que retrataram o sertão em imagens vibrantes foi sendo substituída pela crueza de um cinema urbano e violento. A partir de então, os espaços de exclusão social, como as favelas e periferias das grandes cidades ganharam o centro do debate. No ano de 2002, os lançamentos de O Invasor (Beto Brant), Cidade de Deus (Fernando Meirelles) e Ônibus 174 (José Padilha) foram definitivos para colocar a nu as tragédias nacionais, explorando sem concessões os territórios de pobreza, corrupção e violência da sociedade. Para Lúcia Nagib, a utopia dos cineastas da retomada encerrou-se aí, e o filme O Invasor, de Beto Brant, corporificou a distopia urbana no cinema brasileiro contemporâneo.

2. Beto Brant, o cineasta no limite

O cineasta paulista Beto Brant faz parte do que se convencionou chamar “geração anos 90”: cineastas que iniciaram sua trajetória no formato de curta duração e fizeram sua estreia no longa-metragem nos primeiros anos da retomada no cinema brasileiro.

Após obter grande sucesso de crítica com seu longa-metragem de estreia Os Matadores (1997), Beto Brant conquistou notoriedade ainda maior com o lançamento de seu terceiro longa de ficção O Invasor (2001), que chamou a atenção do público, da crítica e foi aclamado em festivais nacionais e internacionais. Nesse percurso, o cineasta conquistou seu espaço, passando à privilegiada posição de autor. Desde então, os filmes de Beto Brant são aguardados com curiosidade, já que ele é considerado um dos nomes mais inquietos e expressivos que despontaram no cenário cinematográfico contemporâneo.

De fato, Brant se diferenciou da maioria dos cineastas da retomada por ter buscado a via contrária. Se grande parte dos realizadores recorreu ao sertão e à favela -cenários emblemáticos do Cinema Novo -, Beto Brant privilegiou o espaço urbano depauperado, as ruas, os bares, os prostíbulos, a boemia da noite paulista. Desse modo, o cineasta aproximou-se muito mais da matriz encontrada nos filmes do Cinema Marginal, iniciado no fim dos anos 1960 na Boca do Lixo paulista, que teve como ponto forte uma estética (ou antiestética) do sujo, do feio e do cafajeste – num verdadeiro deboche e riso sarcástico endereçados às impossibilidades do momento político de um Brasil que ainda vivia os horrores da ditadura militar.

2.1.Cinema das relações humanas

O cinema de Beto Brant apresentou desde o início uma persistente investida na exploração da experiência dos sujeitos, atitude que se aprofundou à medida em que o cineasta foi amadurecendo suas temáticas, sendo patente que a violência urbana e política que marcou seus três primeiros longas-metragens, cedeu lugar a uma narrativa na qual o traço pessoal e a interiorização dos protagonistas, que vivenciam um mundo em colapso, é denunciada por seus conflitos interiores, como se pode observar nos filmes Crime Delicado (2005) e Cão sem Dono (2007). De todo modo, é fato que se lançarmos um olhar atento ao conjunto dos filmes de Beto Brant, perceberemos um ponto comum a todos eles: as ações narrativas são fortemente focadas nas relações humanas, enfatizando as subjetividades e a vulnerabilidade das alianças firmadas entre os sujeitos. Dessa maneira, mesmo quando os filmes do cineasta buscam explorar a complexidade da sociedade atual, eles não se fartam em apresentar o sujeito contemporâneo como o grande protagonista da representação. No mundo diegético de Beto Brant ninguém é o que aparenta, e a cada novo filme o cineasta parece confirmar sua investigação ao comportamento humano, explorando temas fulcrais da experiência, ao colocar em jogo os limites da ética, da amizade, da lealdade, do amor e da traição.

Sem dúvida, esses são os sintomas de um cinema que busca testar os extremos, operar nas fronteiras, sejam elas simbólicas ou reais – como no universo sem lei dos assassinos de aluguel na fronteira do Brasil com o Paraguai, em Os Matadores (1997); seja na busca incessante pelo inimigo do passado, em Ação entre Amigos (1998); seja no choque entre ricos e pobres de O Invasor (2001); seja na derrocada do crítico de arte que se apaixona pela jovem modelo que não possui uma perna (e aqui o limite é o próprio belo) em Crime Delicado (2005), ou, ainda, na afetividade trôpega do tradutor de línguas que se depara com a possibilidade do amor em Cão sem Dono (2007).

2.2.Cinema literário

Beto Brant tem como base de inspiração para seus filmes a literatura recente realizada no País. Seus três primeiros longas-metragens partiram do trabalho do romancista Marçal Aquino, que possui um estilo muito próximo do gênero policial, aos moldes da literatura de Rubem Fonseca. Dessa maneira, o filme Os Matadores é inspirado no conto homônimo contido no livro Miss Danúbio, de Marçal Aquino; Ação entre Amigos nasceu da adaptação de um romance que Aquino não chegou a finalizar, e O Invasor foi criado a partir da novela do mesmo autor, que preferiu não terminá-la para assumir a produção do roteiro do filme junto com Renato Ciasca e o próprio Brant. Os dois últimos longas do diretor também não fugiram à regra da inspiração literária: Crime Delicado foi adaptado do romance homônimo do veterano carioca Sérgio Sant´Anna e Cão sem Dono é baseado no livro Até o dia em que o cão morreu, do gaúcho Daniel Galera.

3. Crime Delicado e os desencantos contemporâneos

O filme Crime Delicado, quarto longa-metragem de Beto Brant, parece ser um divisor de águas em sua carreira. Arriscamos mesmo dizer que se os três primeiros longas do diretor tenderam a se filiar ao gênero policial, com foco na realidade socioeconômica e na violência das grandes cidades, em Crime Delicado, Brant parece ter ido buscar a trilha oposta, realizando uma espécie de antiespetáculo. Tanto assim que Crime Delicado e Cão sem Dono seguiram uma linha nada comercial. Nesses filmes, cada imagem serviu menos para mostrar do que para suscitar interrogações sobre os mundos interiores dos personagens.  Evidentemente, essa mudança de rumo na temática pôde ser sentida igualmente no plano estilístico, sendo notório que os dois últimos filmes propuseram narrativas mais estáticas, marcadas pela concisão e pelo laconismo, nas quais não mais se percebe a busca pelo grande impacto como nos filmes anteriores – que primavam por uma câmera virtuosa em constante movimento e pela quantidade significativa de cortes. Neste novo momento, Beto Brant optou por uma câmera mais fixa, sendo que os cortes dentro do quadro se tornaram escassos, aprofundando uma das preferências do diretor em explorar o plano-sequência. Permaneceu, porém, a tendência, já incorporada por Brant, de entremear dados documentais às encenações, criando estruturas híbridas.

A narrativa de Crime Delicado gira em torno da paixão fulminante do implacável crítico de teatro, Antônio Martins, pela jovem modelo Inês, que não possui uma perna e mantém uma relação pouco nítida com o artista plástico José Torres Campana, de quem parece ser musa inspiradora e protegida. Depois de conhecer Inês num bar, Antônio Martins tem a percepção afetada, tornando-se obcecado pela moça e desenvolvendo um violento ciúme de sua relação com Campana. É desse modo que o crítico feroz vai abandonando sua condição de observador racional, protegido pelas barreiras de seu intelectualismo, para se tornar alvo da crítica alheia no mundo dos vivos. E será justamente sua inabilidade afetiva que o levará a cometer um gesto ambíguo e pouco louvável: uma relação sexual não consentida por Inês, numa atitude que modificará de vez sua vida e a da moça, que o levará aos tribunais sob a acusação de crime de estupro.

É a partir desses enredamentos envolvendo os personagens, que pensamos no filme Crime Delicado como uma possibilidade de leitura sobre como a questão do sujeito contemporâneo tem sido midiaticamente representada, bem como no cinema de Beto Brant como um lócus privilegiado de análise de alguns aspectos importantes que se apresentam no mundo social. Como já dissemos, desde o seu primeiro longa-metragem, Beto Brant trouxe como uma de suas preocupações centrais a exploração das relações humanas, investigando a singularidade dos sujeitos e os seus modos de “estar no mundo”.

É flagrante que esta relação dos sujeitos contemporâneos com o mundo que os rodeia tem sido objeto de análise detida de diversos teóricos sociais na atualidade. Grande parte dos autores (JAMESON, 2006; HALL, 1999; KELLNER, 2001; HARVEY, 2008; SARLO, 1996) afirma que a complexidade que assolou as sociedades, principalmente a partir da segunda metade do século XX – com a investida do capitalismo em setores antes isentos como a cultura, bem como a rapidez dos processos de globalização e o fluxo sem precedentes de imagens e informações que passou a fazer parte do cotidiano das pessoas foi responsável pelo aparecimento de novas formas de subjetividade, dando lugar ao nascimento de um sujeito fragmentado, desconexo e descentrado, constituído num cenário e numa cultura pós-moderna.

Além disso, é importante lembrar que o trabalho de Beto Brant teve início nos anos 1990, fim do século em que o mundo inteiro se perguntava sobre o estatuto do sujeito, após a sua anunciada “morte” por pós-estruturalistas e pós-modernos. Naquele mesmo momento, com o fim da Guerra Fria e a queda do Muro de Berlim, as nações presenciaram o fim da utopia socialista e a vitória do neoliberalismo pós-moderno e anti-utópico, juntamente com a derrocada dos ideais de progresso da modernidade.

Fredric Jameson (2006) chamou essa era de capitalismo tardio, momento de uma investida sem precedentes do capital, que passou a dominar todos os setores do mercado, inclusive a cultura.  Voltando-se para as produções do cinema, da arquitetura, das artes plásticas e da música, o teórico enfatizou a mercantilização e o fetichismo das mercadorias a que estão submetidas as produções pós-modernas – fatores que desembocam num novo tipo de achatamento, superficialidade, falta de profundidade e esmaecimento do afeto –  numa celebração do fim do gesto utópico nas artes. Para Jameson, com o colapso da ideologia do estilo modernista, os artistas contemporâneos só podem recorrer ao passado e imitar estilos mortos. Ele identifica essa recorrência ao passado, por exemplo, nas produções do cinema, através da proliferação dos “filmes de nostalgia”. O autor defende que essa constante imitação do passado gera uma crise de historicidade, que traz em seu bojo importantes questões relativas à organização da temporalidade, pois se o sujeito perde a capacidade de organizar seu passado e seu futuro como uma experiência corrente, é difícil supor como os objetos produzidos por tal sujeito possam resultar em algo coerente, coeso e não fragmentário. Por isso mesmo, a forma pós-moderna de retratar o mundo por meio de fragmentos em perpétua mudança e a consequente quebra da linearidade dos discursos causa efeitos sobre a personalidade e a psique dos sujeitos que, na pós-modernidade, acabam por desenvolver uma forma esquizofrênica de interpretação da sua história pessoal. Em razão da fragmentação do sujeito na pós-modernidade, Jameson sugere que conceitos como ansiedade e alienação já não são mais assimiláveis. Ele convoca as experiências com drogas do final dos anos 1960 e a esquizofrenia como as novas possibilidades de patologias culturais contemporâneas.

Outro importante pensador a refletir sobre como a fragmentação da subjetividade está atrelada às estruturas do cenário contemporâneo é o filósofo Zygmunt Bauman. Ele afirma que a aceleração e a fugacidade da vida moderna, conseqüências da compressão espaço-tempo, levou o mundo de objetos duráveis a ser substituído pelo mundo de produtos projetados para imediata obsolescência. Desse modo, há uma celebração da não-fixidez, já que as pessoas mudam rapidamente de identidade e são impelidas a conduzir os atos de suas vidas como se fossem jogadas curtas que não exigem comprometimento com experiências passadas ou qualquer previsão de conseqüências futuras. Desse modo, homens e mulheres passaram a ter como ideal viver um dia de cada vez, num exercício contínuo de impedir que sua identidade se fixe. No entendimento de Bauman, tal atitude é derivada das constantes mensagens de incerteza, indeterminação e maleabilidade que são oferecidas pela indústria da imagem e pelos eficazes meios de comunicação. Sendo assim, numa era em que o tempo já não estrutura o espaço, “a dificuldade já não é descobrir, inventar, construir, convocar (ou mesmo comprar) uma identidade, mas como impedi-la de ser demasiadamente firme e de aderir depressa demais ao corpo” (BAUMAN, 1998: 114).

4. Percurso metodológico: por uma crítica social à luz dos Estudos Culturais

Para justificarmos a coerência de analisar textos culturais com o intuito de  compreender o cenário contemporâneo, e, desse modo, realizar uma crítica social a partir do filme Crime Delicado, de Beto Brant, nos valeremos de alguns pressupostos levantados pelo teórico Douglas Kellner (2001). O autor aponta, como o melhor modo de desenvolver estudos sobre mídia e cultura, a pesquisa de fenômenos concretos contextualizados na sociedade e na história atuais. Isto porque Kellner considera que os diversos textos produzidos pela cultura da mídia cumprem papel fundamental na construção das identidades, na configuração de pensamentos e comportamentos e na crítica da cultura de nosso tempo.

Sendo assim, para investigar a natureza das produções culturais, Kellner defende a realização de uma crítica diagnóstica da cultura, que utiliza a história para ler os textos e os textos para ler a história, num movimento característico que é o de “ir ao produto social”. Por isso mesmo, Kellner afirma que se deve partir do texto para o seu contexto – a cultura e a sociedade – que auxiliaram na constituição deste texto e que apresentam a grade pela qual tais produtos devem ser lidos e interpretados. Desse modo, o autor defende que:

As situações locais, nacionais e globais de nossos dias são articuladas entre si por meio dos textos da mídia; esta, em si mesma, é uma arena de lutas que os grupos sociais rivais tentam usar com o fim de promover seus próprios programas e ideologias, e ela mesma reproduz discursos políticos conflitantes, muitas vezes de maneira contraditória. Não exatamente o noticiário e a informação, mas sim o entretenimento e a ficção articulam conflitos, temores, esperanças e sonhos de indivíduos e grupos que enfrentam um mundo turbulento e incerto. As lutas concretas de cada sociedade são postas em cena nos textos da mídia, especialmente na mídia comercial da indústria cultural cujos textos devem repercutir as preocupações do povo, se quiserem ser populares e lucrativos. A cultura nunca foi mais importante, e nunca antes tivemos tanta necessidade de um exame sério e minucioso da cultura contemporânea (KELLNER, 2001: 31-32).

Ao considerar a intrínseca articulação entre texto e contexto sugerida por Kellner, podemos notar sua filiação à perspectiva dos Estudos Culturais,             que, em linhas gerais, busca interpretar os textos culturais em seu contexto social, o que implica “traçar articulações pelas quais as sociedades produzem cultura e o modo como a cultura, por sua vez, conforma a sociedade por meio de sua influência sobre indivíduos e grupos” (KELLNER, 2001:39).

Por isso mesmo, Kellner assevera que os textos da mídia devem ser analisados em contexto e relação, o que significa levar em conta, por exemplo, o gênero da produção, o período de sua realização e a forma como a mesma se relaciona com outras produções similares. Nesse sentido, Kellner propõe a abordagem multiperspectívica, que estabelece que quanto mais teorias estiverem à disposição, mais tarefas poderão ser cumpridas e mais específicos serão os objetivos e temas que poderão ser tratados (numa interseção entre cultura, sociedade e política). Desse modo, para capturar todas as dimensões políticas e ideológicas dos textos da cultura e da mídia, é preciso vê-los a partir de perspectivas de sexo, sexualidade, raça, classe, etnia e subalternidade, mas também a partir da combinação das perspectivas críticas marxista, feminista, estruturalista, pós-estruturalista, psicanalítica e outras que possibilitarão uma leitura mais sólida dos fenômenos. É dessa maneira que o autor define a natureza do texto cultural:

Um texto é constituído por suas relações internas e pelas relações que mantém com a situação social e histórica, e quanto mais relações estiverem expressas numa leitura crítica, melhor poderá ser a compreensão do texto. O método multiperspectívico deve necessariamente ser histórico e ler seus textos em termos de contexto social e histórico e pode também optar por ler a história à luz do texto (KELLNER, 2001: 12).

Ao realizar um trabalho cultural crítico sobre alguns filmes produzidos por Hollywood entre os anos 1960 e 1980, Douglas Kellner lançou mão de estudos sobre ideologias, movimentos sociais e o ambiente em que surgem realizados pelo sociólogo Robert Wuthnow (1989), adotando três categorias de análise: horizonte social, campo discursivo e ação figural. Com a aplicação de tais categorias, Kellner pretendeu “descrever alguns dos modos como os textos culturais transcodificam e articulam imagens sociais, discursos e condições ao mesmo tempo em que operam dentro de seu campo social” (KELLNER, 2001: 137).

O autor enquadra o horizonte social num plano que se refere “às experiências, às práticas e aos aspectos reais do campo social que ajudam a estruturar o universo da cultura da mídia e sua recepção” (KELLNER, 2001: 137). O horizonte social, portanto, ao dizer dessas múltiplas relações, acaba por contextualizar o local, a época e o cenário em que se dá a produção da cultura da mídia. O teórico exemplifica que “o horizonte social dos anos 1960, que serviu como pano de fundo para filmes como Easy Rider e Woodstock, foi a emergência da contracultura com seu estilo próprio de roupa, comportamento, música, linguagem e cultura” (KELLNER, 2001: 137). Os anos 1960, portanto, constituem o horizonte social de filmes do período – desse modo, as características ideológicas e históricas daquele momento foram incorporadas e transcodificadas em campos discursivos específicos, dentro de cada um desses filmes. Sendo assim, na categoria campo discursivo Kellner propõe que sejam avaliadas as imagens e os discursos cinematográficos, bem como a música e a linguagem dos filmes, assim como os demais recursos expressivos da linguagem do cinema. Já na categoria ação figural, o autor destaca os desdobramentos sociais do filme, de acordo com o contexto do público, expondo assim, os reflexos da cultura da mídia na sociedade. “Na ação figural de Woodstock encontravam-se os roqueiros como heróis culturais deificados, apresentados como facilitadores benevolentes da contracultura, e o público como participante integrado da comunidade e da rebelião contracultural” (KELLNER, 2001: 139). Isso significa dizer que a ação figural supõe efeitos figurais e discursivos na dimensão da recepção, atentando-se para uma resposta do público.

4.1. Exploração de elementos contextuais e fílmicos para a realização de uma crítica social em Crime Delicado

Para realizar uma crítica social a partir do filme Crime Delicado, capturando possíveis configurações das relações entre os sujeitos contemporâneos, nos valeremos de duas das três categorias apontadas por Douglas Kellner: horizonte social e campo discursivo. Esclarecemos que não utilizaremos a categoria ação figural, pois a mesma abarca dimensões da recepção, mostrando os desdobramentos sociais dos filmes de acordo com o contexto do público e expondo, assim, os reflexos da cultura da mídia na sociedade. Uma análise que privilegie esta categoria de modo específico não faz parte dos nossos objetivos neste artigo, tendo em vista que a questão proposta não comporta uma investigação dessa natureza.

Já a categoria horizonte social nos auxiliará a contextualizar o período histórico em que o filme Crime Delicado (2005) foi produzido, ou seja, meados da primeira década do século. É justamente a delimitação deste período que nos auxiliará a enquadrar o contexto sócio-histórico deste filme de Brant, realizando aquilo que Douglas Kellner chama ir “do texto ao contexto” para se proceder a uma leitura crítica da cultura – capturando a natureza mesma dos fenômenos sociais, culturais e políticos.

Num segundo movimento, utilizaremos a categoria campo discursivo para avaliarmos as imagens e os discursos cinematográficos – o que inclui a leitura dos recursos expressivos utilizados na narrativa, à medida em que eles se constituam como possibilidades para avaliarmos as questões conceituais de que pretendemos tratar.

4.1.1. O horizonte social dos filmes de Beto Brant

Do ponto de vista do horizonte social que abarca o período histórico que atua como pano de fundo do filme Crime Delicado, é preciso relembrar que o momento é marcado pelas perplexidades do fim do século e início de uma nova era, quando teóricos do mundo inteiro discutiam a derrocada dos ideais de progresso da modernidade, do fim do gesto utópico, num mundo onde se acentuaram as desigualdades sociais, a economia globalizou-se num ritmo acelerado e o mercado passou a ser o orientador de todos os aspectos da vida social.

Para Michael Denning (2005) o marco histórico desse período iniciou-se, de fato, em 1989, com o fim da Guerra Fria e a queda do Muro de Berlim, fatores que desembocaram numa era pós-histórica. Como acentua o autor:

Se a história é um pesadelo do qual estamos tentando despertar, 1989 marcou de fato o fim de uma história específica, uma libertação da história, a capacidade de dizer que algo a que estávamos presos terminou. Para a direita, foi o fim do comunismo; mas para a esquerda, que havia muito se livrara de seus investimentos utópicos e até solidários na União Soviética e nas democracias populares, também foi uma nova liberdade. O velho manifesto poderia ser lido com novos olhos e parecia uma misteriosa antevisão do novo mundo pós-histórico (DENNING, 2005: 35).

De acordo com Denning, é justamente em função desses marcantes acontecimentos históricos e políticos que se pode situar o começo da globalização, embora o autor não ignore que o Oxford English Dictionary assinale o primeiro emprego do termo ainda em 1961. Mas para Denning, o que está em jogo é compreender por que a partir dos anos 1990 a palavra “globalização” passou a ser substituta imediata de “internacional”, a palavra por excelência do período anterior. “Que mudança histórica é representada por essa nova palavra, por esse desvio do internacional para o global?” (DENNING, 2005: 27). É justamente nesse tópico que o teórico esclarece que a nova acepção da palavra globalização pretendia se referir a uma nova ordem mundial, que agora se tornara inevitável. Por isso mesmo, não foi mero acaso que o termo globalização tenha entrado em largo uso, reorientando o trabalho na teoria crítica, no início da década de 1990. No entendimento de Denning, dizer a palavra globalização naquele novo contexto representava afirmar a destituição da era dos três mundos: capitalista, comunista e socialista – o que, em última análise, significava que esses mundos não só fracassaram, mas morreram. É no mesmo sentido que Denning faz referência à publicação do polêmico artigo no qual Francis Fukuyama (1990) anunciava o fim da história. “Apesar da tendência do discurso da globalização de substituir a narrativa histórica ampla pelas escalas temporais anistóricas da teoria do mercado e da comunicação, pode-se dizer que o momento da globalização começou, em termos intelectuais, com o amplamente lido anúncio do fim da história de Fukuyama”. (DENNING: 2005: 34).

Por outro viés, mas tangenciando a mesma questão, Douglas Kellner chama a atenção para o fato de que, nos anos que se seguiram ao fim da Guerra Fria, o mundo já não mais se via mergulhado na insegurança advinda da militarização das superpotências e de suas disputas veladas, mas tornou-se vítima de instabilidades de outra natureza:

A derrubada do muro de Berlim, a queda do império comunista soviético e a dissolução final da própria União Soviética pareciam por fim ao pesadelo. O resultado, porém, não foi a criação de uma nova era de paz e estabilidade. Em vez disso, explodiram guerras nacionalistas e religiosas, criando uma nova era de medo e instabilidade, sem forças políticas capazes de oferecer uma via atraente para se sair do pantanal da recessão econômica, da instabilidade política da confusão cultural (KELLNER, 2001:26).

No plano sócio-cultural, o cenário global do período foi marcado pela chegada de cada vez mais novas tecnologias da mídia e da informática, que mudariam de forma definitiva os padrões da vida cotidiana e reestruturariam de vez os âmbitos do trabalho e do lazer, até a atualidade. Nesse sentido, se presenciou o recrudescimento absoluto das características que se iniciaram ainda nos anos 1960, apontadas por tantos teóricos (JAMESON, 2006ab; HARVEY, 2008; SENNETT, 2007; BAUMAN, 1998, 2004) como conseqüências da expansão do capitalismo, de sua conquista de novos mercados, e de sua invasão sem precedentes de setores como a cultura. Por isso mesmo, Douglas Kellner aceita que na sociedade de atual, a cultura ocupa papel cada vez mais central:

A cultura está desempenhando um papel cada vez mais importante em todos os setores da sociedade contemporânea, com múltiplas funções em campos que vão do econômico ao social. Na economia, as sedutoras formas culturais modelam a demanda dos consumidores, produzem necessidades e moldam um eu-mercadoria com valores consumistas. Na esfera política, as imagens da mídia têm produzido uma nova espécie de política de frases de impacto descontextualizadas, o que lhe confere posição central na vida política. Em nossas interações sociais, as imagens produzidas para a massa orientam nossa apresentação do eu na vida diária, nossa maneira de nos relacionar com os outros e a criação de nossos valores e objetivos sociais (KELLNER, 2001:29).

Em sintonia com esse pensamento, Bauman (2004) identificou a profunda modificação nas relações humanas, advinda da lógica consumista da sociedade contemporânea. Para ele, na cultura atual, que favorece o produto pronto para uso imediato, o prazer passageiro e a satisfação instantânea, a promessa de aprender a amar é oferta que funciona à semelhança das mercadorias, que fascinam e seduzem enquanto não exigem esforços nem investimentos prolongados. Por isso mesmo, o que se presencia é a fragilidade dos laços humanos e dos relacionamentos, que tendem a ser flutuantes e flexíveis. Desse modo, o autor nos diz que o homem antes centrado tornou-se o sujeito sem vínculos da pós-modernidade, num mundo que detesta tudo o que é sólido e durável e onde os compromissos a longo prazo são sinônimo de opressão.

4.1.2. Campo discursivo de Crime Delicado: dos personagens à questão do sujeito contemporâneo

Crime Delicado tem um início pouco convencional. Em sua primeira cena assistimos ao trecho de uma peça teatral na qual uma jovem atriz menciona frontalmente para a câmera as grandes lutas travadas durante o século XIX nos lares patriarcais pela emancipação feminina. A peça em questão é Confraria Libertina, que estava em cartaz em São Paulo por ocasião das gravações do filme. No transcorrer da narrativa, trechos de mais duas peças serão mostrados: Woyzeck, o brasileiro e Leonor de Mendonça, ambas em exibição nos teatros paulistas durante as filmagens de Crime Delicado e trazendo como temática comum a eterna querela entre machos e fêmeas em momentos históricos e contextos sociais diferentes.

Esse parece um bom fio condutor para começarmos a tangenciar as questões semânticas logo após apresentadas no campo discursivo do filme, que pretende dar conta, na forma e na linguagem utilizadas pelo diretor, do delírio amoroso em que mergulha Antônio Martins, um crítico feroz de teatro que denuncia sua completa inabilidade social e afetiva ao se apaixonar por Inês, uma moça “descolada” que não possui uma das pernas e figura como modelo do excêntrico e proeminente artista plástico José Torres Campana. O conteúdo textual discutido nas peças teatrais se aproxima dos dilemas de Antônio e Inês – funcionando mesmo como fio condutor da narrativa fílmica em alguns momentos – por descortinar desencontros, ciúmes, acusações e derrocadas, todos esses elementos que se entrecruzam na trama de Crime Delicado, evidenciando, enfim de contas, a dificuldade de se estabelecer laços afetivos num mundo em que os vínculos subjetivos estão deteriorados. Se o sujeito moderno ainda possuía bases sólidas de fixação no mundo, que contribuíam para manter sua capacidade de firmar alianças, de alimentar o desejo utópico que o habilitava a buscar no povo e na comunidade a possibilidade da revolução, a crise do sujeito contemporâneo, em contrapartida, o levou à perda desse horizonte, ao abalo das certezas e a tatear em busca do vínculo que o ligava à História e ao Outro. E é justamente dessa ruptura que trata Crime Delicado, pois no filme o que concorre para colocar os personagens em risco é o fato de Antônio Martins pretender se aproximar, estabelecendo um contato demasiado humano e pouco hábil com uma modelo que acaba de conhecer. Portanto, aqui o elemento desestabilizador a retirar o crítico de sua zona de segurança é o desejo, que leva Antônio a arriscar o passo em falso, enredado pelas armadilhas do amor.

Logo após a apresentação do trecho da peça Confraria Libertina, um corte seco no quadro nos leva ao apartamento de Antônio, onde, entre livros e penumbra, ele escreve uma crítica achincalhando o espetáculo. Antônio é um sujeito altamente intelectualizado, cuja percepção de mundo passa pelas letras. É desse lugar inacessível que o personagem estabelece uma barreira que parece separá-lo do restante dos mortais, não raro vítimas de seu julgamento impiedoso. Adaptado à condição de observador que não se contamina, o solitário crítico busca sentidos objetivos para aquilo que vê, e naquilo que vê busca a perfeição, a completude, a harmonia das formas. Mas é justamente ao ser tocado pela irregularidade da paixão, aqui insinuada pela beleza igualmente irregular do corpo de Inês, que Antônio experimentará o desassossego.

O encontro dos dois acontece num bar da noite paulista, e depois de alguns flertes e devidas apresentações, a moça, um pouco bêbada, pede que Antônio a leve a algum lugar, qualquer lugar. Nesse momento, ao se levantarem da mesa, Antônio descobre (junto a nós) a deficiência física da modelo. Já no apartamento da jovem, os dois se beijam e trocam carícias até que Inês desmaia nos braços de Antônio. Um corte no plano e entra em cena a segunda peça de teatro. No palco, é tocante a atuação do amante abandonado e corroído de ciúmes que se interroga: “Todo homem é um abismo, a gente fica tonto quando olha pra dentro dele. Ela parece a própria inocência. Mas você inocência, tem algum sinal que se faça reconhecer, uma mancha, uma cicatriz?”. A intertextualidade da fala com o que se seguirá no mundo de Antônio Martins é interessante de se notar. Na sequência seguinte, o crítico recebe um convite de Inês para visitar uma exposição de artes plásticas, onde ele comparece com o desejo de rever a modelo. Porém, para sua desagradável surpresa, Inês não chega. Entre as diversas telas expostas, uma especialmente incomoda Antônio (imagem 1). É aquela em que o corpo nu da garota está eroticamente entrelaçado ao do pintor José Torres Campana. Num acesso de ciúme provocado pela visão da tela insinuante, Antônio se retira do local. Aqui vale o destaque para o caráter documental da cena, pois trata-se da exposição Corpos Divergentes que realmente acontecia em São Paulo e abrigou trabalhos de diversos artistas, incluindo o do pintor interpretado no filme – na vida real Felipe Ehrenberg, artista plástico e também adido cultural do Consulado do México em São Paulo.

Imagem 1: 57 15
Imagem 1: 57' 15''

Já nesse ponto da narrativa podemos afirmar sem perigo de errar que Crime Delicado é um filme de poucas falas e muitas encenações teatralizadas. O entrecruzamento da linguagem das diversas artes, como a do teatro, da pintura, do cinema e da literatura dão o tom contemplativo de um filme que impacta pelos silêncios, pela ausência quase completa de trilha sonora (há somente a música sublime de Schubert que abre e fecha a narrativa), pelo prolongamento das sequências e pela insistência nos planos fixos, que garantem a integridade da duração. Assim, cenas documentais alternam-se a outras totalmente oníricas, encenações teatrais sucedem-se a pensamentos em voz alta. Não há imagens de rua, todas as ações acontecem nos palcos, bares, interior dos apartamentos e num tribunal, numa metáfora formal ao mergulho que o filme faz no mundo interior dos personagens. Vale destacar que todas as cenas são noturnas, à exceção daquelas que dão conta da ação no tribunal e no jornal onde Antônio Martins trabalha. De resto, é como se a cada tomada estivéssemos diante de quadros vivos, assumindo o ponto de vista de um espectador de teatro, oferecido pela câmera que não se move. Nesse sentido, é emblemática a sequência que parece trazer de volta Antônio Martins ao mundo dos que se afetam, dos que sofrem. Após a decepção com o não comparecimento de Inês à exposição Corpos Divergentes, Antônio assiste à terceira peça teatral mostrada no filme, e ao fim da encenação ele sai para jantar com a protagonista do espetáculo, que pretende seduzi-lo em troca de uma crítica elogiosa no jornal. O que se segue é digno de nota, tanto pelo registro da fala do crítico – que dá conta daquilo que vai no seu estranho mundo interior – quanto por revelar seu desempenho diante de uma mulher, na cena posterior. Ainda no restaurante, quando a atriz faz insinuações sobre o aspecto solitário de Antônio, o crítico dispara: “Você deve estar querendo armar uma certa intimidade para poder perguntar o que achei da sua peça e com isso comprometer um pouco minha opinião, senão sobre o espetáculo, pelo menos sobre seu trabalho. Eu sei que isso deve ser um pouco difícil pra você, porque você vem batalhando a um puta tempo nessa carreira e vê em mim a possibilidade de alavancá-la, me trazendo aqui, me expondo aos seus como um troféu. Talvez você quisesse isso e talvez eu também quisesse um monte de coisas e quem sabe a gente pudesse fazer uma troca. Talvez você pudesse chupar lentamente meu pau enquanto eu escrevesse um artigo sobre a grande revelação dos palcos nesse momento e talvez você pudesse ser até um pouco mais generosa, me encontrar vez ou outra e tirar essa aparência de solitário que você diz que eu tenho. E talvez eu até pudesse me apaixonar por você, o que não seria difícil, e em pouco tempo eu perceberia que a paixão é realmente uma invenção da literatura burguesa. E aí eu acho que você se arrependeria de ter me procurado e perceberia que uma bosta de um elogio num jornal diário não significa mais do que uma trepada numa noite fria que no dia seguinte não passa de uma lembrança, sem desdobramento. Talvez eu pudesse olhar nos seus olhos como eu tô fazendo agora e dizer que o mundo é tão óbvio que se a morte me tocasse nesse momento seria ainda assim previsível”. Essa fala cortante desemboca diretamente no apartamento de Antônio, onde o personagem toma uísque nervosamente e parece não suportar a entrega da atriz, que, nua sobre a cama o desafia a deitar-se com ela. Nesse momento, a imagem oferecida ao espectador é totalmente onírica (imagem 2). Quando o crítico chega à porta do quarto, aproximando-se da atriz, ele ouve o que parecem ser gargalhadas de um grande público de teatro assistindo a uma comédia. Então Antônio se volta assustado em busca de pistas. Um corte neste plano e (talvez tendo acesso à fantasia de Antônio) vemos uma platéia em escárnio completo. Mais um corte e presenciamos Antônio e a atriz novamente no quarto, só que agora sobre um palco, diante do qual o público continua gargalhando absurdamente. Então, em primeiro plano, presenciamos a expressão horrorizada de Antônio, que, em seu delírio, está sendo ridicularizado por sua atuação pouco convincente. Desse modo, o filme nos mostra, metaforicamente, que o crítico saiu da platéia para entrar no palco, passando a ser julgado na vida.

Imagem 2. Início da sequência: 33 18. Fim: 3347
Imagem 2. Início da sequência: 33' 18''. Fim: 33'47''

Daí em diante, a narrativa assume uma forma cada vez mais irregular e desconexa, dando conta da percepção de Antônio. Não por acaso, na sequência seguinte, os fatos parecem não mais se amarrar ao todo do filme. O que se vê são personagens desconhecidos, provavelmente criaturas da noite paulistana, em mesas de bar falando sobre as peripécias do amor. Primeiro dois travestis, depois dois homens maduros, e, logo após, um casal, que numa intempestiva briga de ciúmes tem o próprio Antônio Martins como espectador (imagem 3). Após disparar agressões verbais e palavrões contra a companheira, o homem se volta para o crítico e provoca: “Agora seu otário, é o seguinte, eu amo, você não ama nada, quem é você?”, para logo após desculpar-se com a amada num abraço e partir entre beijos e juras de amor, anunciando que aquilo foi só uma cena de ciúme.

Imagem 3a: 3357
Imagem 3a: 33'57''

Imagem 3b: 3809
Imagem 3b: 38'09''

Imagem 3c: 3922
Imagem 3c: 39'22''

O crime delicado

Após presenciar essa cena de ciúme no bar, Antônio Martins vai à casa de Inês no meio da madrugada. Já bêbado, o crítico confessa seu amor pela jovem que, em princípio, se assusta e pede que ele vá embora. Mas Antônio está decidido a falar, e além de confessar seu amor, dispara insinuações e acusações sobre o relacionamento da modelo com o pintor. Num verdadeiro acesso de ciúme, e ao perceber a atitude pouco comovida de Inês após sua declaração, Antônio diz a Inês que ela não é de fato uma modelo para Torres Campana, mas uma personagem, uma atriz pornô enclausurada por ele naquele apartamento-ateliê que não passa de um cenário para satisfazer a excentricidade de um artista fetichista. A cena merece destaque (imagem 4) por ser uma das mais teatrais apresentadas no filme. A disposição dos dois corpos no quadro parecem obedecer a marcação de uma encenação teatral. As falas de Antônio são formais e literárias, quase declamadas. Mas o fato é que Inês repudia os argumentos do crítico, chamando-o de parasita. Num ato intempestivo, Antônio se insinua sobre ela, jogando-a sobre a cama e fazendo sexo com a jovem sem o seu consentimento. Após o ato voluptuoso e breve ele vai embora. Inês chora e fala entre dentes: “sou uma prisioneira”.

Imagem 4: 42 01
Imagem 4: 42' 01''

Para o crítico, parece que o amor se fez carne. No dia seguinte ao encontro com Inês, ele escreve uma carta de amor à modelo, reafirmando seus sentimentos e propondo-lhe um pacto de sangue. A narrativa irregular avança neste ponto e a cena posterior é também bastante onírica. Num devaneio, Antônio se vê num teatro completamente vazio dançando com Inês sobre o palco. A sublimidade do quadro encanta a visão. Envolto numa iluminação azulada, o casal rodopia ao som da música elevada de Schubert. Porém, a sensação não dura muito, um corte brusco nos introduz na dureza de um tribunal, onde uma áspera juíza anuncia que o crítico foi acusado de crime de estupro, previsto no artigo 213 do Código Penal.

A partir daí, o fluxo do filme em cor é suprimido e começamos a assistir à audiência em preto e branco, com o close no rosto de Antônio. Cara a cara com Inês no tribunal (imagem 5), Antônio nega a acusação de estupro, afirmando que se violência houve, foi delicada, voluptuosa, já que ele está perdidamente apaixonado por Inês. A juíza pergunta estupefata: “apaixonado após dois encontros?! Isso não parece normal”. E Antônio atesta: “Eu não sou normal!”. Nesse momento, a defesa questiona de Inês o que teria acontecido naquela noite, se houve violência, se ela tentou gritar, chamar algum vizinho, se Antônio lhe batera – perguntas que a modelo somente consegue responder negativamente.

Mas agora, o que chama a atenção é que Inês parece duvidar de si mesma. Um sobe som com a sinfonia de Schubert é acionado. A cena, embora sem movimento aparente, é absolutamente intensa, pois as emoções de Inês entram em turbilhão. Corte. Numa outra ação, vemos a modelo entrando decididamente na bienal de artes plásticas de São Paulo, onde uma pintura de Campana expõe seu corpo eroticamente. Naquele que aparenta ser um gesto libertário, a moça retira sua prótese e a deixa embaixo da tela, abandonando prontamente o local. Sobem os letreiros. Saímos do filme sem saber se houve estupro e se Antônio foi incriminado – mas ficamos tentados a acreditar que Inês conquistou sua libertação.

Imagem 5a: 1: 10 30
Imagem 5a: 1: 10' 30''

Imagem 5b: 1: 10 37
Imagem 5b: 1: 10' 37''

Referências bibliográficas

ANDERSON, Perry. As origens da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1999.

BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1998.

BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 2004.

BENTES, Ivana. Sertões e subúrbios no cinema brasileiro. Cinemais, Rio de Janeiro, nº 15, p.85-96, jan./fev. 1999.

BUTCHER, Pedro. Cinema brasileiro hoje. São Paulo: Publifolha, 2005.

DENNING, Michael. A cultura na era dos três mundos. São Paulo: Religare, 2005.

HARVEY, David. Condição pós-moderna. Uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 17ª Edição. São Paulo: Edições Loyola, 2008.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 3ª Edição. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.

HALL, Stuart. Quem precisa de identidade? In: SILVA, Tomaz Tadeu (org.) Identidade e diferença. A perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000, p. 103-133.

JAMESON, Fredric. A virada cultural. Reflexões sobre o pós-modernismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006a.

JAMESON, Fredric. Pós-modernismo – A lógica cultural do capitalismo tardio. 2ª Edição. São Paulo, Editora Ática, 2006b.

NAGIB, Lúcia. O Cinema da Retomada: depoimentos de 90 cineastas dos anos 90. São Paulo: Ed. 34, 2002.

NAGIB, Lúcia. A utopia no cinema brasileiro: matrizes, nostalgia, distopias. São Paulo, Cosac Naify, 2006.

ORICCHIO, Luiz Zanin. Cinema de Novo. Um balanço crítico da retomada. São Paulo, Liberdade, 2003.

RAMOS, Fernão Pessoa. Cinema Marginal (1968-1973). A representação em seu limite. São Paulo: Brasiliense, 1987.

RAMOS, Fernão Pessoa. Má-consciência, crueldade e narcisismo às avessas no cinema brasileiro contemporâneo. Estudos Socine, São Paulo, Ano IV, p.371-379, out. 2003.

ROCHA, Glauber. Revolução do Cinema Novo. São Paulo: CosacNaify, 2004.

SARLO, S. B; ALCIDES, S. Cenas da vida pós-moderna: intelectuais, arte e videocultura na Argentina. 4ª Edição. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2006.

SENNETT, Richard. A corrosão do caráter. Conseqüências pessoais do trabalho no novo capitalismo. 12ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2007.

SOVIK, Liv. Lembrar o sujeito pós-moderno ou viva o fim da razão instrumental. In: PRADO, José L. A. e SOVIK, Liv (orgs). Lugar global e lugar nenhum: ensaios sobre democracia e globalização. São Paulo: Hacker Editores, 2001, p 87-95.

VANOYE, Francis; GOLIOT-LÉTÉ, Anne. Ensaio sobre a análise fílmica. 4ª Edição. Campinas, SP: Papirus, 2006.

XAVIER, Ismail. O discurso cinematográfico. A opacidade e a transparência. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977.

XAVIER, Ismail. O cinema brasileiro dos anos 90. In: Praga – estudos marxistas. São Paulo, n 9, p. 97-138, junho 2000.

XAVIER, Ismail. O Cinema brasileiro moderno. 2ª Edição. São Paulo: Paz e Terra, 2001a.


[1] Folha de São Paulo, 24 de maio de 2002. No mesmo artigo, José Álvaro Moisés acrescenta outros dados: 60 novos diretores surgiram. O público de filmes brasileiros saltou de menos de 400 mil espectadores, entre 1990 e 1994, para 25 milhões, entre 1995 e 2000. O cinema beneficiou-se de R$ 500 milhões, por meio de leis de incentivos, além de R$ 70 milhões do orçamento da União em diversos programas de apoio, como Cinema Brasil, Mais Cinema e Apoio à Comercialização de Filmes. Dados mais recentes da Agência Nacional do Cinema (Ancine) revelam que de 1995 a 2004, 207 longas- metragens de ficção e animação brasileiros foram lançados em salas de exibição no País (www.ancine.gov.br). O site Filme B (www.filmeb.com.br) revela que o público do cinema em 2003 ultrapassou a barreira dos 100 milhões, e em 2004 houve alta de 10%, chegando-se a cerca de 110 milhões de ingressos vendidos.

[2] A expressão foi criada para fazer contraponto ao manifesto Estética da Fome, escrito por Glauber Rocha em 1965, no qual foram apresentadas as propostas do Cinema Novo para lidar com a situação de exclusão social e miséria dos países periféricos. O texto sintetizou o projeto estilístico do movimento do Cinema Novo, defendendo a estética da violência para o confronto da realidade e como forma de legitimar as causas populares diante da opressão.

Author Image

RUA

RUA - Revista Universitária do Audiovisual

More Posts

RUA

RUA - Revista Universitária do Audiovisual

Este post tem um comentário

Deixe uma resposta