As 11 etapas de Saldanha

Por Eduardo Palazzo*

No dia 19 de maio de 2011, nas instalações da FAAP, o diretor Carlos Saldanha deu uma palestra para alunos e público externo contando um pouco de sua trajetória e, principalmente, todo o processo por trás da realização de seu filme Rio. Bem humorado, Saldanha aos poucos demonstrou porque conseguiu rápida ascensão na carreira e sucesso no filme: com uma fala direta e clara, o diretor explicou seu processo de realização bastante organizado, eficiente e criativo.

Graduado em computação, Saldanha se mudou para Nova York para cursar animação digital na School of Visual Arts. Dessa primeira experiência surgiu o curta-metragem Time for Love, de 1994. Toda a sala assistiu atenciosamente e o aplaudiu no final. O diretor considera esse um de seus principais trabalhos, por ser muito autoral e conter características de roteiro que foram adotadas posteriormente em seus outros filmes.

Depois dessa introdução, começou a falar sobre sua última realização, Rio, que era o centro da palestra. Saldanha disse que a vontade de realizar esse filme era antiga e, depois de terminar a terceira parte de A Era do Gelo, finalmente pôde se dedicar integralmente ao projeto. A ideia inicial era ter como protagonista um pinguim, mas como outras animações já estavam sendo lançadas com o mesmo personagem, ele desistiu. Acompanhado de um slide show com material exclusivo da Blue Sky Studios, dividiu o processo em 11 etapas e contou as histórias sobre cada uma delas.


Etapas de construção do personagem Blu, do esboço ao detalhe da textura das penas.

1. Exploração do conceito: A partir do argumento, desenhistas criam o personagem principal, Blu, a lápis. Vários modelos foram criados, variando formatos do rosto e outras características mais marcantes, até chegar a um modelo ideal.

2. Definição do personagem: Definidas as características essenciais, aprofundam-se outros aspectos como expressões faciais e corporais. As poucas linhas do desenho inicial se multiplicam, mas todo o processo continua bidimensional.

3. Modelamento: Blu é criado em uma maquete física, já com ajuda de softwares 3D. Isso auxilia toda a equipe a pensar texturas e movimentos do personagem.

4.Texturas: São pensados aspectos de textura, primeiramente dos personagens. Saldanha já havia trabalhado com diversos tipos de animais na sequência de A Era do Gelo, o que deu a ele bagagem para aprimorar essa etapa. Cada pássaro possui mais ou menos 5 mil penas, que na verdade divergem de três tipos criados: uma penugem mais fina e lisa e duas mais grossas e ásperas. Deste processo de colagem das penas (que pode durar semanas) surge o personagem. Também foram criadas texturas de peles humanas e dos demais personagens.

5. Testes de animação: As primeiras sequências de movimentos são realizadas e assim se especificam os trejeitos de movimentação dos personagens. Saldanha exibiu um vídeo criado por um finlandês, animador de sua equipe, no qual Blu está sambando. O animador não conhecia nada sobre samba, e para isso teve que estudar os movimentos da dança através de vídeos. O resultado final ficou hilário, misturando muito bem movimentos humanos e de pássaros.

6. Seleção das vozes: A escolha das vozes foi feita por um processo curioso. Ao invés de criar uma sequência e pedir para os atores a dublarem, a equipe resolveu fazer o processo inverso: escolheram filmes e entrevistas desses atores e criaram a animação posteriormente. Para Anne Hathaway, foram escolhidas falas do filme Agente 86 que foram adaptadas à personagem Jade.


Criação do cenário da favela e Anne Hathaway gravando as falas da personagem Jade.

7. Criação do cenário: Essa etapa também foi realizada em camadas com a ajuda de vários softwares. Para criar o calçadão da praia do Rio de Janeiro, a equipe definiu os desenhos e tamanhos de cada pedra, calculou imperfeições e fez o preenchimento de cores com muita paciência. A favela foi um dos cenários mais difíceis de criar, devido às imperfeições e abundância de texturas. Uma maquete 3D e sequências modelo para a luz auxiliaram o desenvolvimento.

8. Gravação e animação: Escolhidos os atores, iniciou-se o processo cansativo de gravação, que levou vários anos. Antes da gravação, para simular o resultado, os próprios animadores gravaram vídeos, tendo eles mesmos como atores.

9. Passos da animação: Para ter uma margem de erro menor, as sequências são criadas por animações de esboços em lápis, até chegar ao resultado ideal. Depois da confirmação, a animação é feita em 2D e posteriormente em 3D. Como o diretor reforçou várias vezes, essa escolha economiza tempo e dinheiro.

10. Animação de fundo: Uma das equipes foi designada somente para os movimentos de fundo, em especial dos personagens. Saldanha reforçou que são esses pequenos detalhes que enriquecem o filme e caracterizam a cidade. Foram exibidos exemplos de pessoas caminhando pela praia, jogando futevôlei e até a luz de um avião ao fundo fazendo uma ponte aérea Rio – São Paulo durante a noite.

11. Progression Reels: Essa etapa nada mais é do que uma comparação entre esboço, animação 2D, animação 3D e resultado final com cenários, animações de fundo e iluminação prontas. No YouTube estão disponíveis exemplos de vários filmes.

No final da apresentação, foram abertas as perguntas ao público e Saldanha deu a entender que uma continuação poderá acontecer futuramente. Com mais de 4 milhões de espectadores no Brasil em menos de 2 meses, já era de se imaginar.

*Eduardo Palazzo é graduado em Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

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