Comunicação e Educação: do hegemônico para o popular

(Comunicação e Educação: do hegemônico para o popular)[1]

 *Djalma Ribeiro Junior

 

Resumo 

Neste texto, a Comunicação e a Educação são compreendidas como áreas do conhecimento que se constituem como processos que se dão nas mais diversificadas práticas sociais. Assim, é possível relacionar a Comunicação e a Educação em contextos sócio-políticos de opressão ou de libertação. Partindo-se desta compreensão, o texto traça um paralelo entre a Comunicação Hegemônica e a Educação Bancária com a Comunicação Popular e a Educação Popular, destacando a importância da participação coletiva em um processo educativo e comunicativo de valorização do ser humano como sujeito crítico, criativo e transformador. 

Comunicação Hegemônica e Educação Bancária 

As informações veiculadas pelas grandes empresas de comunicação obedecem a uma estrutura organizacional que está atrelada à grandes interesses políticos e econômicos. Por este motivo, estas empresas monopolizam todo o sistema comunicativo, exercendo o que chamaremos de Comunicação Hegemônica. 

Esta cadeia comunicativa, protagonizada por estas grandes corporações, interferem de forma direta nas vidas de muitas pessoas: ditando costumes, impondo necessidades, (de)formando opinião, etc. 

Dentre as formas de atuação destas grandes empresas, a televisão é a que consegue obter mais êxito, por se tratar de um meio de comunicação que está presente no cotidiano de muitas pessoas. “O impacto dos meios de comunicação sobre as ideias, as emoções, o comportamento econômico e político das pessoas cresceu tanto que se converteu em fator fundamental de poder e de domínio em todos os campos da atividade humana” (DÍAZ BORDENAVE, 1982, p. 33). 

Na América Latina, complexos empresariais como a Televisa e a Rede Globo, paulatinamente, vem atuando de forma decisiva nas estruturas simbólicas das sociedades e interferindo, sobremaneira, nas questões econômicas e políticas (GARCÍA CANCLINI, 2008). 

A televisão, portanto, é um meio muito representativo de Comunicação Hegemônica que concentra algumas características importantes deste tipo de Comunicação, tais quais: 

  • comunicação diretiva e verticalizada, pautada no binômio emissor – receptor;
  • veiculação de conteúdos tidos como “universais”;
  • utilização de mecanismos de linguagens com a intenção de cativar o público;
  • homogeneização de costumes e opiniões por meio de atuação no campo simbólico das mensagens transmitidas;
  • manutenção de uma estrutura política e econômica que a privilegia.

Estas características, não por acaso, também estão presentes, guardadas as suas especificidades, no processo de Educação Bancária, outrora detalhada por Paulo Freire em seu livro Pedagogia do Oprimido. 

Antes de analisarmos com mais detalhes estas características da Comunicação Hegemônica, vamos nos deter no conceito de Educação Bancária para que, posteriormente, relacionemos estas duas formas de comunicação e educação, respectivamente, de maneira mais crítica. 

Na Educação Bancária há um educador que tudo sabe e um educando que nada sabe, cabendo aquele a função de “educar” (dentro da perspectiva “bancária”). Este “educar” parte do pressuposto, portanto, em que há um sujeito que fala o que sabe, através da narração e um ouvinte paciente a quem cabe apenas o papel de depositário dos comunicados do educador. Nesta perspectiva, o educando é cercado de um discurso prescrito, onde a realidade é algo estático, dado, imutável, destruindo, assim, a possibilidade de o educando se tornar sujeito do processo de busca do conhecimento (FREIRE, 1987). 

Imaginemos um professor que entra em uma sala de aula para começar um curso de História do Brasil. Sem conhecer os estudantes e nem o contexto local em que aquela escola está inserida, o professor começa a escrever no quadro negro sua primeira aula de História do Brasil que, não poderia ser diferente, começou com o “descobrimento” do Brasil. Tudo o que vem antes da chegada dos portugueses em solo brasileiro é negado, ocultado. A História do Brasil começa com o “descobrimento”. 

Inibindo a participação dos estudantes, por sua postura arrogante, o professor rebate as poucas perguntas com o que está escrito naquele livro que há anos é utilizado como base para aquele curso. 

Vamos substituir este professor por uma televisão. O que muda? Qual a diferença de atuação entre um e outro? Da mesma maneira como atua a Comunicação Hegemônica, age um professor dentro de um sistema de Educação Bancária. 

Tanto a Educação Bancária quanto a Comunicação Hegemônica se pautam em um processo de comunicação diretivo e verticalizado apoiado no binômio emissor – receptor, no qual este nada sabe e é objeto de retenção de informação daquele que possui o poder do conhecimento. O estudante e o telespectador são meros objetos dentro deste sistema, não lhe é permitido questionar ou contestar o que lhe é transmitido. Cabe apenas aceitar, decorar, acreditar e aplicar, enquanto o professor e a televisão, neste sistema, assumem um papel de poder, concebido pelo fato de possuírem os conteúdos necessários para informar os seus estudantes ou telespectadores. São soberanos dentro deste processo e não permitem o questionamento e nem a contestação. 

Esta soberania do professor e da televisão se justifica por que ambos trazem conteúdos indispensáveis para a (de)formação dos seus estudantes e a (des)informação de seus telespectadores. Os conteúdos comunicados neste processo foram construídos pelo professor e pela televisão sem nunca ter consultado os estudantes ou telespectadores. Parte-se do princípio que o emissor sabe o que é preciso o receptor saber e o que o receptor sabe, se é que ele sabe algo, não interessa neste sistema formativo. Estes conteúdos são tidos como “universais”, por se tratar, segundo o ponto de vista do emissor, de conteúdos essenciais para a vida de quaisquer pessoas em quaisquer espaços. Ou seja, o contexto local e a realidade concreta onde vivem os receptores não possuem importância e, às vezes, podem ser até prejudiciais para este sistema formativo. O local, espaço de vida dos receptores, é desprezado neste sistema opressor: “a arte vale mais que o artesanato, a medicina científica, mais que a popular, a cultura escrita, mais que a transmitida oralmente.” (GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 194). 

A Comunicação Hegemônica e a Educação Bancária, para manterem este sistema diretivo e verticalizado, lançam mão de mecanismos de linguagem que operam no campo simbólico, cativando o receptor e o aprisionado em um sistema que oprime sua liberdade crítica, criativa e expressiva. 

Para que um programa de televisão agrade um telespectador e que uma aula prenda a atenção dos estudantes, ambos devem satisfazer, suficientemente, os fantasmas conscientes e inconscientes, as angústias dos seus receptores, porém, tal satisfação deve estar contida em determinados limites para que ela não estimule a mobilização do receptor para transformar suas angustias (FERRÉS, 1996). 

O professor e a televisão sempre estão em uma posição de destaque: os olhares sempre estão voltados para eles. É preciso manter a atenção sob o risco de não reter aquelas informações que estão sendo depositadas. Pode ser que aquilo que o professor está dizendo neste momento caia na prova, então é preciso ouvir, decorar e depois repetir certinho. Pode ser que esta manchete do telejornal ou este episódio da novela seja o assunto da roda de amigos, então é preciso ouvir, decorar e depois repetir certinho. E se alguém vier me contestar, digo que foi o professor quem falou e que vi no jornal e que, portanto, estou certo. Repete-se, assim, o ciclo dos conteúdos “universais”. 

Nestes sistemas comunicativos e educativos opressores a diversidade é ocultada e se impõe uma regra de conduta. Os estudantes e os telespectadores são disciplinados a agirem de uma forma prescrita que promove a homogeneidade. Aquele que foge das regras é punido, quer seja pelo “mau comportamento” na escola, quer seja por não estar usando aquela roupa que a atriz usa ou não estar ouvindo aquela música que tocou no programa de domingo. 

Diante deste quadro, cria-se um clima de competitividade que amplifica o individualismo e o direciona para o prazer de possuir mais que o outro. Cada indivíduo é tratado como seres atomizados que estão em constante competição: é preciso tirar a melhor nota, é preciso ser melhor que todos, é preciso comprar aquilo, é preciso ouvir aquilo… Tudo que se apresenta é tomado como necessidade vital e de maior importância para estar na frente nesta competição. 

Todas estas características pelas quais se processam a Comunicação Hegemônica e Educação Bancária possuem como objetivo principal manter esta estrutura que privilegia os opressores. O que, em última instância, significa manter a estrutura política e econômica da sociedade em que estamos vivendo, uma vez que estas formas opressoras de Comunicação e Educação não se processam alheias à sociedade, mas pelo contrário, sendo cúmplice de uma sociedade, também opressora, que nega a liberdade crítica, criativa e expressiva dos sujeitos através de injustiças presentes nos sistemas comunicativos, educativos, jurídicos, econômicos, etc. 

Se, por um lado a Comunicação Hegemônica e a Educação Bancária são uma realidade impositiva na nossa sociedade; por outro, é possível vislumbrar movimentos que fazem resistência a este sistema opressor e nos apontam um outro caminho pautado em processos comunicativos e educacionais libertadores: a Comunicação Popular e a Educação Popular. 

Comunicação Popular e Educação Popular   

 A Comunicação Popular é um movimento que nasce no interior dos grupos populares e dos movimentos sociais e que, portanto, está enraizado em seu contexto local e expressa a vontade dos atores sociais que protagonizam este processo. 

Da mesma forma, o movimento de Educação Popular, que historicamente começou com a alfabetização de jovens e adultos, também vai fincar suas raízes na realidade concreta dos grupos populares e dos movimentos sociais. 

“Educação Popular é o processo contínuo e sistemático que implica momentos de reflexão e estudo sobre a prática do grupo ou da organização; é o confronto da prática sistematizada com elementos de interpretação e informação que permitam levar tal prática consciente a novos níveis da compreensão. É a teoria a partir da prática e não a teoria ‘sobre’ a prática” (NUÑEZ HURTADO, 1993, p. 44). 

Estas maneiras de processar a Comunicação e a Educação vão privilegiar aspectos negados na Comunicação Hegemônica e na Educação Bancária. 

Nos sistemas comunicativos e educativos hegemônicos e opressores, o termo popular, normalmente possui conotação pejorativa. “Popular é o que vende maciçamente, o que agrada multidões (…) não consiste no que o povo é ou tem, mas no que é acessível para ele, no que gosta, no que merece sua adesão ou usa com freqüência.” (GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 260 – 261). 

Aqui, na Comunicação Popular e na Educação Popular, o termo popular é uma marca de resistência contra um sistema que hegemônico e opressor que sempre excluiu milhares de pessoas. Assim, a palavra popular representa: 

“grupos e movimentos sociais que compartilham uma situação de domínio social e econômico. São, na maioria das vezes, setores aos quais se negou sua qualidade de sujeitos históricos; setores que não participam ou participaram subalternamente dos benefícios do trabalho, do poder e da cultura” (GAJARDO, 1986, p. 14-15). 

Quando a palavra popular aparece na frente das palavras Comunicação e Educação pretende-se, na verdade, marcar uma posição política e apontar que tanto a Comunicação quanto a Educação compreendem diversas perspectivas que, historicamente vem sendo negada pela Comunicação Hegemônica e pela Educação Bancária. 

Em seguida apresentamos um quadro que tem como objetivo confrontar estes dois tipos de Comunicação e Educação: 

 

A intenção deste quadro foi apresentar algumas características importantes da Comunicação Popular e da Educação Popular e deixar mais evidente a sua função de resistência contra o domínio da Comunicação Hegemônica e da Educação Bancária. 

A Comunicação Popular, por ser aquela que nasce do cotidiano das classes populares, consegue ser um elemento expressivo e reflexivo sobre as práticas sociais presente no dia a dia das pessoas que vivem nesta comunidade. É por isso que “os produtos gerados pelas classes populares costumam ser mais representativos da história local e mais adequados às necessidades presentes do grupo que o produz” (GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 198). 

As rádios comunitárias são um bom exemplo de Comunicação Popular. Por meio da atuação das rádios comunitárias, as pessoas da comunidade conseguem expressar seus sentimentos e suas reflexões utilizando-se de um sistema comunicativo que atende aos interesses específicos de tal comunidade. O sistema comunicativo está em comunhão com a comunidade. 

 A comunhão entre a Comunicação Popular e as pessoas que vivem na comunidade em que se processa este sistema comunicativo é extremamente importante para a construção e a manutenção de espaços críticos, criativo e reflexivo. O conteúdo “universal” choca-se com o conteúdo local. Aquilo que era imposto, agora é contestado. O receptor também é um emissor e, por conseqüência, o emissor se torna um receptor. A mensagem já não é portadora de uma verdade, as mensagens se diversificam. É proposto um debate de ideias, uma troca de visões de mundo. 

Tal comunhão também está presente no processo de Educação Popular. O contexto local é a base para a construção de uma pedagogia libertadora. 

 Imaginemos, agora, um professor que entra em uma sala de aula para começar um curso de História do Brasil. Todos os estudantes conhecem o professor porque ele sempre está presente nas festas promovidas pela escola, já foi visitar o pessoal do hip hop, até já jogou futebol com os meninos no campinho de terra. Conhecendo os estudantes e o contexto local em que a escola está inserida, o professor começa sua primeira aula de História do Brasil ouvindo o que os estudantes sabem sobre o tema.  Conversam bastante sobre este tema. O professor sabe de algumas coisas, os estudantes sabem de outras. 

Incentivando a participação dos estudantes, o professor coordena a aula e muitas vezes busca alguns livros e algumas situações ou alguns espaços que fazem parte daquele contexto em que a escola está inserida para auxiliar na conversa. De repente é possível saber que algum lugar ali do bairro é representativo para se conhecer a História do Brasil ou que o hip hop e até mesmo o futebol no campinho de terra se relacionam com o tema da aula. 

Tanto a Comunicação Popular quanto a Educação Popular se constituem como processos que se sustentam na crítica, na criatividade e na expressividade dos seus sujeitos. Isto faz com que estes sistemas comunicativos e educativos sejam libertadores, uma vez que se fundamentam na participação coletiva e colaborativa e que caminha para um processo de conscientização acerca da realidade concreta em que estão inseridos os sujeitos (NUÑEZ HURTADO, 1993). 

Este processo de conscientização se constitui em um processo de formação de seres humanos cada vez mais críticos em relação à realidade concreta em que estão inseridos. Dizendo de outra maneira, é possível destacar um processo educativo que não se dissocia da conscientização, mas a acompanha, e que se dá nas relações entre as pessoas e delas com o mundo. “Educação e conscientização se implicam mutuamente.” (FIORI, 1986, p. 03). 

“Juntos, consciência e mundo ganham realidade. Um não se perde no outro, perdendo sua identidade: identificam-se, um através do outro. (…) O mundo é significado no permanente significar ativo, que não é atividade de uma consciência pura, mas desenvolvimento dialético da consciência do mundo ou do mundo consciente. (…) Na medida em que o ser humano dá significados ao mundo, neste se reencontra, reencontrando, sempre, e cada vez mais, a verdade de ambos. Neste momento, a conscientização já se prefigura como ação transformadora e não como visão especular do mundo: refazer-se, com autenticidade, implica em reconstruir o mundo” (FIORI, 1986, p. 04). 

A conscientização, assim, é parte fundamental na constituição do ser humano como sujeito e, se a conscientização prefigura a ação transformadora, podemos dizer que a libertação e a humanização do ser humano e, por conseguinte, a transformação do mundo em um lugar mais justo passa pelo processo de conscientização. 

Assim, a partir do momento em que o oprimido, inserido criticamente na sua realidade, conscientiza-se de sua condição de oprimido, construindo, portanto, uma consciência histórica desta situação, é possível entrever a possibilidade de o oprimido lutar pela sua libertação, pela sua humanização. (FREIRE, 1980). 

A individualidade, então, passa a ser valorizada na comunidade como uma forma de contribuição do indivíduo para o fortalecimento desta comunidade. O individualismo direcionado para a competitividade presente em processos opressores é rebatido com a solidariedade dos indivíduos que coloca a disposição da comunidade sua capacidade de ajudá-la a se fortalecer. 

Em processos de Comunicação Popular e Educação Popular todos os saberes são respeitados e dialogados para que o coletivo avance junto de forma autônoma, respeitando a individualidade de cada um(a) e construindo espaços colaborativos. 

Por este motivo que tanto a Comunicação Popular quanto a Educação Popular estão enraizadas no contexto em que se processam. O território é onde a vida é vivida e, por isso, trata-se do espaço onde são plantadas a criticidade, a criatividade, a expressividade e a esperança na construção de um mundo mais justo. Parte-se do local para dialogar com o global, o “universal”. O “universal” já não mais sufoca o local, pelo contrário, o “universal” é contestado, questionado. 

Os processos educativos não mais ficam circunscritos ao saber do professor e ao sistema escolar. Os processos educativos estão presentes nas práticas sociais que se desenrolam no cotidiano da comunidade. Aprende-se vivendo e, sobretudo, convivendo com as pessoas e em comunhão com a realidade concreta em que estamos inseridos. 

Enraizar-se na realidade concreta dos grupos populares e dos movimentos sociais, implica em agir territorialmente, todavia, é possível a criação de redes colaborativas que compartilham experiências locais por meio da internet. Este fenômeno propicia o fortalecimento das ações locais por meio de trocas de visões de mundo com outros agentes locais que, em dado território, também trava uma luta contra os sistemas comunicativos e educativos hegemônicos. 

Dessa forma, a internet se torna uma ferramenta valiosa para o fortalecimento da Comunicação Popular e da Educação Popular. Por meio das redes colaborativas é possível fortalecer a luta de grupos populares e de movimentos sociais e consolidar uma união entre essas redes capaz de amplificar as vozes de quem sempre esteve excluído dos processos de Comunicação Hegemônica e de Educação Bancária. 

 O papel da escola 

Diante do que foi exposto acerca da Comunicação e da Educação, apresentando as facetas opressoras e libertadoras destas duas áreas do conhecimento, seria importante destacarmos o papel da escola neste debate. 

Há, e não é possível fechar os olhos para isso, uma nova dinâmica na Comunicação, proporcionada, sobretudo, pelas novas tecnologias de captação e veiculação de imagens e sons (telefones celulares, câmeras portáteis, computadores, internet). Esta nova dinâmica na estrutura da Comunicação permite que o receptor atue, também, como emissor de mensagens de forma ampla, principalmente através de sites de acomodações de vídeos, como o youtube, por exemplo. Dessa forma, é inevitável que estas novas tecnologias de Comunicação adentrem cada vez mais o ambiente escolar. 

A inserção destas tecnologias no sistema de ensino escolar recebe, amiúde, dois tratamentos: a desconsideração total das possibilidades pedagógicas ou a incorporação precipitada sem nenhuma base de pesquisa ou de conhecimento (MARTÍNEZ SANCHEZ, 1999). Esta última possibilidade pode gerar o praticismo atrelado à ideia de diversão sem nenhuma postura crítica, intensificando uma comodidade didática ou reforçando hábitos pedagógicos bancários, transferindo para o recurso tecnológico uma função decorativa de um sistema escolar pautado na Educação Bancária. 

A escola muitas vezes ainda insiste 

“em identificar o melhor do modelo pedagógico tradicional com o livro e anatematizar o mundo audiovisual com o mundo da frivolidade e da manipulação das mentes jovens, imaturas e indefesas. […] Pela maneira que se apega ao livro, a escola desconhece tudo o que produz e circula pelo mundo da imagem e das oralidades” (MARTÍN-BARBERO; REY, 2004, p. 60 – 61). 

É urgente que o sistema escolar aproprie-se criticamente das possibilidades trazidas pelas novas tecnologias de Comunicação, de forma a desconstruir os hábitos que estas novas tecnologias trazem consigo, hábitos estes que camuflam ideologias e valores de uma Comunicação Hegemônica, apontando perspectivas de se trabalhar novas possibilidades que partam da realidade concreta do território em que a escola está inserida. 

Do hegemônico para o popular 

Caminhar do hegemônico para o popular consiste em compreender a Comunicação e a Educação como processos que se dão nas mais diversas práticas sociais, ou seja, que é possível relacionar a Comunicação e a Educação com contextos sócio-políticos de opressão ou de libertação. 

Partir do hegemônico para o popular é construir um processo de conscientização que permita analisar criticamente a Comunicação Hegemônica e a Educação Bancária e perceber que muitas pessoas não são sujeitos destes sistemas que, historicamente, vem negando ao outro sua criticidade, criatividade e expressividade. 

Sair do hegemônico para o popular é se fortalecer na comunidade em que se está inserido. É perceber que os conteúdos “universais” comunicados pela Comunicação Hegemônica e pela Educação Bancária impõem valores e não levam em consideração o saber construído localmente, territorialmente. 

Passar do hegemônico para o popular é substituir o individualismo, que acirra a competitividade, pela valorização da individualidade que, de forma solidária, se compromete com o fortalecimento da comunidade. 

Andar do hegemônico para o popular não é uma andança solitária, mas sim solidária.


[1] Trabalho apresentado no GP Comunicação e Educação do X Encontro dos Grupos de Pesquisa em Comunicação, evento componente do XXXIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Caxias dos Sul, setembro, 2010.

 *Djalma Ribeiro Junior é Bacharel em Imagem e Som e Mestre em Educação pela Universidade Federal de São Carlos. Atua como Técnico de Laboratório Audiovisual do Departamento de Artes e Comunicação e como Assistente de Coordenação na Coordenadoria de Cultura da UFSCar. É sócio da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) e da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom) e membro do Grupo de Pesquisa Práticas Sociais e Processos Educativos da UFSCar, credenciado no CNPQ desde 1997, coordenador do GECEPop – Grupo de Estudo e Extensão em Comunicação e Educação Popular.  

Referências Bibliográficas 

DÍAZ BORDENAVE, Juan E. O Que é Comunicação. São Paulo: Editora Brasiliense, 1982. 

FERRÉS, Joan. Televisão e Educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. 

FIORI, Ernani Maria. Conscientização e Educação. Educação e Realidade. Porto Alegre: UFRGS. 11(1): 3-10. Jan. jun. (1986). 

FREIRE, Paulo. Conscientização. São Paulo: Moraes, 1980. 

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. 

GAJARDO, Marcela. Pesquisa participante na América Latina. São Paulo: Editora Brasiliense, 1986. 

GARCÍA CANCLINI, Néstor. Culturas Híbridas. São Paulo: Edusp, 2008. 

MARTÍN-BARBERO, Jesús; REY, Germán. Os Exercícios do Ver. Hegemonia Audiovisual e Ficção Televisiva. São Paulo: Editora SENAC, 2004. 

MARTÍNEZ SANCHES, Francisco. Os Meios de Comunicação e a Sociedade. In BRASIL Mediatamente! Televisão, cultura e educação. Brasília: Ministério da Educação, SEED, 1999. 

NUÑEZ HURTADO, Carlos. Educar para transformar, Transformar para Educar: comunicação e educação popular. Petrópolis, RJ: Vozes, 1993.

 

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