Crítica | Bottle Rocket, de Wes Anderson (1996)

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Por: Athos Rubim

O diretor americano Wes Anderson, de filmes como O Grande Hotel Budapeste (2014) e Os Excêntricos Tenenbaums (2001), é conhecido por seu estilo estético característico. Anderson usa e abusa de cores vibrantes e de uma decupagem um tanto peculiar, marcada pela construção simétrica dos quadros que se reflete também nos movimentos de câmera. Infelizmente, a produção desse diretor acaba muitas vezes reduzida a apenas isso: geração de trends em redes sociais devido a sua beleza visual.
No entanto, em seu primeiro filme, Bottle Rocket (1996), vemos o diretor despido de seus trejeitos clássicos. Neste filme é possível se esquivar dos espectadores vazios que assistem aos filmes de Anderson somente pelas cores, abrindo espaço para uma discussão muito mais profunda. O que muitos não percebem, hipnotizados pela estética de Anderson, aqui pode ser visto e analisado com clareza.
Quando olhamos para a totalidade da obra do diretor percebemos uma tendência de construção de personagens incompreendidos que muitas vezes não conseguem se encaixar nas conveniências sociais e também são repletos de contradições. Isto fica ainda mais claro quando os personagens adultos começam a agir como crianças e as crianças como adultos. Além disso, as histórias de Anderson, que à primeira vista podem parecer simples e mundanas, geralmente apresentam uma pesada carga dramática no caminho para o desfecho, seja com a morte de algum personagem importante para a trama ou outro fato inesperado. Todas essas características podem ser vistas em seu primeiro filme.
O protagonista de Bottle Rocket é Dignan (Owen Wilson), um jovem rapaz que sonha em ser ladrão. A trama se inicia quando Dignan “resgata” (aqui as aspas se devem ao fato do personagem ter sido enganado e o resgate ser falso) seu amigo Anthony (Luke Wilson) de um hospital psiquiátrico. E os dois iniciam os preparativos para um grande assalto, pois Dignan diz conhecer um mestre do crime, Senhor Henry (James Caan). Assim, aliam-se a um terceiro amigo, Bob (Robert Musgrave), para conseguirem um carro e começam a fazer pequenos golpes como treinamento a fim de se juntarem à equipe do Senhor Henry. Em meio a isso, os amigos acabam se desentendendo e se separam. Dignan mantém os preparativos com o Sr. Henry e, após reencontrar os amigos, convence o criminoso a incluí-los no golpe. O plano dá totalmente errado, mas Dignan não desiste, agarrando-se nele até o fim. Isso resulta em sua prisão, além de fazer com que a casa de Bob seja roubada pelo Sr. Henry que os enganara o tempo todo.
Nesta história já podemos ver os traços que reapareceriam mais tarde na filmografia de Anderson. O incompreendido aqui é Dignan que, retratado através de um plano elaborado e megalomaníaco, apenas queria ter seu amigo Anthony de volta. Não é possível saber exatamente porque Anthony está internado no começo do filme, mas é razoável acreditar que este fato abalou a amizade entre os dois. O desejo absurdo e quase infantil de levar o golpe até o fim, sabendo de seu desfecho infeliz, é na verdade um desejo de Dignan de manter sua amizade com Anthony.
Essencialmente, o valor de Bottle Rocket está na sua simplicidade. Em pouco mais de 90 minutos de filme, Wes Anderson foi capaz de estabelecer todas as fundações de sua autoria, que só seria acentuada pelos seus traços estéticos (ao contrário de ser pautada neles, como pensam alguns equivocados). Sua singularidade possibilitou uma carreira fértil que persiste até hoje. Prova disso é o filme Cidade Asteróide, sob sua direção, estreando no Brasil em 10 de agosto de 2023.

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