Por: Athos Rubim
Redação RUA
Karim Aïnouz vem se estabelecendo mundialmente como um dos maiores nomes da cinematografia brasileira atual. Seu primeiro longa Madame Satã (2002), foi exibido na mostra Un Certain Regard, conhecida por condecorar filmes inovadores e desafiadores, do festival de Cannes e desde então, a esmagadora maioria de seus filmes seguintes foram exibidos em festivais de grande prestígio, como os de Berlim ou Veneza, além de Cannes. Em 2019, novamente na cidade francesa, Aïnouz conquistou o prêmio da mostra Un Certain Regard, pelo filme A Vida Invisível (2019). .
Após um breve hiato de filmagens brasileiras (entre 2020 e 2023, o cineasta realizou 3 longas inteiramente no exterior) e uma pausa maior de filmagens na sua terra natal, o Ceará (desde 2014 o cineasta não realizava um filme no estado). Karim retorna ao Ceará no filme Motel Destino, que por sua vez também estreou no festival de Cannes, tendo passagens também pelo Festival de Gramado e outros festivais ao redor do mundo.
A grande maioria do filme foi rodada em Beberibe, uma pequena cidade no interior cearense, e Aïnouz destaca a importância da relação do filme com seu estado natal. Para o diretor, era imperativo que o elenco fosse inteiramente cearense; e assim foi, salvo duas personagens, uma delas interpretada por Fábio Assunção. Elias, um ex -policial carioca é a figura do “estrangeiro” na obra, um homem que chega àquela terra para explorá-la.
As outras duas figuras do trio principal são Heraldo (Iago Xavier) e Dayana (Nataly Rocha). Ele, um jovem marginalizado que faz de tudo para escapar da sua condição, mas sempre apanha da vida. Ela, esposa de Elias, uma mulher resignada com sua condição subalterna, que aprendeu a tirar o melhor dessa situação. Para Dayana, Heraldo representa tudo aquilo que ela também poderia ser, um sopro de juventude apaixonante. É nesse encontro entre os dois, e seu embate contra Elias que o filme brilha.
Bebendo da fonte de gêneros como o terror, o thriller e o filme policial, Aïnouz constrói um sincretismo que deixa o espectador eletrizado do começo ao fim, pulsando de tensão. O enredo da obra se inicia quando Heraldo se vê preso no Motel de Elias e Dayana, o Motel Destino titular, assombrado pelos fantasmas de seu passado. Dayana e Elias o acolhem e dão emprego, construindo uma relação recheada de desejo e excitação. Dayana e Heraldo se envolvem amorosamente pelas costas de Elias, que eventualmente descobre e tenta matá-los. No entanto, Dayana e Heraldo já estão acostumados com os ataques da vida e conseguem escapar.
Filmado inteiramente em película super 16mm, o filme transmite com maestria o calor do Ceará. A luz forte e marcada, num branco cegante imprime textura sobre a película. Além das cores marcantes e saturadas, que de certa forma aumentam ainda mais a tensão das cenas.
Em suma, Karim Aïnouz constrói uma análise muito interessante e completa das relações das protagonistas. Nenhum personagem é unilateral, até Elias tem seus momentos de bondade e o filme faz questão de entender os fatores que levaram o personagem a ser como ele é. Junto a isso, o desejo e a tensão são muito bem construídos na obra e no fundo transmitem excepcionalmente o desejo pulsante do Brasil, e especialmente do nordeste, de fazer cinema.