Entrevista com Rogério Corrêa

Em sua última passagem pela cidade, o cineasta Rogério Corrêa, esteve presente no SESC de São Carlos para organizar um debate perante a exibição de seu longa-metragem ‘’No Olho da Rua’’. Rogério concedeu entrevista à equipe da RUA e traçou análise acerca de seu último trabalho, bem como discorreu sobre a configuração de sua carreira cinematográfica.

Por  Lidiane Volpi e Fernanda San Juan*


Lidiane Volpi – Rogério, como e quando teve início a sua carreira cinematográfica?

Rogério Corrêa –  Eu iniciei meus estudos no curso de Cinema da ECA, no ano de 1973. Já em 1975 eu fiz o meu primeiro média metragem, trata-se de um documentário denominado ”Roças”, ainda dentro da grade curricular da ECA. Em seguida, eu e Pedro Farkas, um amigo, produzimos e realizamos juntos o ”Tem coca-cola no Vatapá”, que é um documentário-ficção. O curta-metragem versa sobre o Paulo Emílio Sales Gomes e a trajetória do cinema brasileiro, desde seu início até a ocupação do mercado pelo produto estrangeiro, passando pela teoria defendida pelo Paulo Emílio de que nós somos ocupados, de que somos estrangeiros no nosso próprio país. Esses dois filmes ainda são semiprofissionais porque não possuíamos recursos e a trabalhávamos em cooperativa, eu e alguns amigos. O terceiro curta-metragem, ”Os Queixadas”, já é um projeto profissional. Eu ganhei o prêmio ”Estímulo ao curta metragem”, da secretaria de cultura do estado, que existe até hoje, e com esse dinheiro eu realizei o filme. Depois de ”Os queixadas” eu realizei outros dois curtas de ficção, dentre outros.

Lidiane –  Você cursou cinema em um momento histórico muito atribulado, o país estava sob a ditadura militar que impunha uma série de restrições ao audiovisual com a censura, perseguia àqueles que não concordassem com o regime e uma série de outros desmandos. O que o fato de ser estudante de cinema nesse período, influenciou na sua obra?

Rogério –  Influenciou muito. O meu primeiro filme ”Roças”, é um filme feito sobre trabalhadores rurais lá no Maranhão. Eu levei uma equipe pro Maranhão, descolei passagem de graça, fomos para lá em seis pessoas e realizamos um documentário sobre um grupo de pessoas que faziam uma roça comunitária, onde cada um tinha a sua rocinha particular, mas todos eles trabalhavam num terreno comum, numa espécie de mutirão e produziam através deste trabalho comunitário. O segundo filme fala sobre o domínio cultural norte-americano no Brasil. O meu trabalho sempre esteve ligado a uma postura social/política, é uma coisa que eu gosto e que acho importante.

Foto de Luan Reis

Lidiane –  Você trabalhou com o Bertolucci, no filme La Luna, conte-nos um pouco sobre como foi essa experiência.

Rogério – Na verdade eu era estagiário voluntário. O estágio voluntário é o seguinte, você não recebe nada, você chega lá e diz ”olha eu quero aprender e tal, posso ajudar em algo?”. Eu estava na Itália, minha esposa foi cursar o Centro Sperimentale di Cinematografia, foi quando conheci o montador e o editor de som do Bertolucci, pedi para fazer estágio e então eu acompanhei todo o trabalho de edição de som do La Luna. Foi um trabalho maravilhoso, conheci o Bernardo Bertolucci e fiz até uma entrevista com ele para uma revista brasileira. Depois ele produziu o filme do irmão, o Giuseppe Bertolucci, no qual eu trabalhei também, mas desta vez eu recebi cachê, que era um valor simbólico, logicamente. Não era aquela coisa, milhões de euros como se pensa, mas foi o dinheirinho com o qual eu comprei uma bota no final do filme, muito bonita por sinal, já que lá é muito frio e eu não tinha levado bota do Brasil.

Lidiane –  No olho da Rua, que é o seu primeiro longa ficcional, é possível observar a influência do apelo ao real que o documentário carrega?

Rogério –  Muito, tanto é que o ”No Olho da rua” é um trabalho sobre o mundo operário e eu já tinha feito ”Os queixadas” , que é um documentário que se utiliza de recursos da ficção sobre uma greve operária ocorrida em uma fábrica de cimento em São Paulo. Foi uma greve muito longa e, nove anos após o ocorrido, eu fui lá e pedi que eles reconstituíssem dramaticamente a greve. Diferente do que ocorre em um documentário, eles não davam entrevistas, eles realmente atuavam, eram atores dos próprios papéis. Eu sempre tive um interesse muito grande pelo trabalho documental e claro que e trago essa experiência também para a ficção.

Foto do facebook do cineasta.

Lidiane Volpi –  E como foi, para você, a experiência de participar de festivais internacionais?

Rogério –  É uma experiência maravilhosa, é uma coisa que todo mundo deva fazer. O dia em que tiver um trabalho pronto de vocês, um curta, inscrevam ele em festivais internacionais. Tentem, é difícil, porque são muitos festivais, tem muitos filmes concorrendo, mas se conseguirem entrar em um deles já é uma coisa interessante. Em geral, você recebe algum tipo de convite, ou pagam a passagem ou fornecem hospedagem- até mesmo os dois. Enfim, o interessante é ir, ver o filme sendo exibido e conversar com as pessoas. Mesmo que não possa estar presente, o fato de ter um filme sendo exibido lá trás bastante repercussão para o trabalho.

Lidiane –  E você comentou bastante sobre o Festival de Havana que você gostou bastante…

Rogério – Foi muito interessante. Enfim, é essa coisa do público gostar de Cinema de uma forma absurda. Ter oitocentas, novecentas pessoas numa sala é uma coisa que não se vê mais aqui no Brasil. Foi emocionante. Depois, Havana também é uma cidade muito interessante, Cuba em si é um país muito peculiar. É uma experiência de vida viajar com seu filme. É o melhor tipo de viagem que existe porque o filme exerce a função de um passaporte, e um passaporte de peso.

* Lidiane Volpi e Fernanda San Juan são graduandas do curso de Imagem e Som da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Editoras da Revista RUA.

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