Hiato: (Vladimir Seixas, 2008)

Ditongo*

Por Iuri Leonardo dos Santos**

Vladimir Seixas é, antes de mais nada, um diretor inteligente. E sem ser apelativo, o que lhe dá mais créditos ainda. Seu doc constitui-se, é inegável, de elementos batidos, mais é justamente a forma como são utilizados que torna a obra  interessante.

Valendo-se de uma espécie de “mosaico” constitutivo, com materiais de arquivo de diferentes mídias (televisiva, com as cenas reais da invasão e impressa, através das inúmeras manchetes de jornais que incitaram à discussão popular), mesclados aos depoimentos dos ocupantes e estudiosos da área, que parecem validar “acadêmicamente” o ato – como se fosse necessário diante das impressionantes imagens – o filme apresenta um ritmo que prende o espectador, imerso num bizarro turbilhão de sensações que perpassam o espanto total, o riso desconcertado e uma reflexão social não muito convencional, tudo isso sob a visão explícita do realizador.

Apesar do claro viés social, a temátíca em si é original, e inusitada diga-se de passagem: a real ocupação desestabilizadora de uma verdadeira legião de sem-tetos e moradores de favela, com direito a pão com mortadela e roupas e mais roupas experimentadas, em um shopping frequentado pela classe média-alta paulistana, com a cobertura da imprensa.

As imagens do filme, nem sempre de boa qualidade (estourada às vezes), como as feições de nojo e falsa superioridade por parte dos próprios vendedores que compartilham um estilo de vida muito mais próximo ao dos invasores se comparado ao dos donos/empresários, e as palavras, as não ditas em especial, escancaram a existência de uma evidente barreira separatista entre a classe média-alta e os mais humildes: os hábitos, costumes, enfim, o modo de vida.

E é, a meu ver, justamente essa total adequação – sintonia aliás – entre a estética e a narrativa, a grande sacada deste curta. De fato, o que é visto representa o que é dito e/ou subentendido. E assim, ao menos como filme, as coisas são “faladas” num só esforço de voz, e não separadamente como hiatos.

**Iuri Leonardo dos Santos é graduando em Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

*Resenha sobre o filme da Mostra Brasil 5 “Hiato:” (Vladimir Seixas, Brasil (RJ), documentário, 19′, cor, DV, 2008), publicada no Tablóide Crítica Curta do Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo, projeto do qual o redator-editor fez parte.

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    Convidado

    Pow essa invasão foi no shopping Rio Sul no Rio de Janeiro, e não em um Shopping  frequentado pela classe media alta paulistana.

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