*Por Marcelo Félix*
Nesta quinta-feira, 17 de novembro, aconteceu a mesa sobre Formação Livre, Cultura Digital e Economia da Cultura mediada pelo diretor do 5º Festival CONTATO Ricardo Rodrigues e a participação do historiador Célio Turino1 e da professora Chloe Mary Furnival2, ambos destacaram a importância da discussão sobre o desenvolvimento de atividades culturais descentralizadas se aproveitando do processo de difusão digital, como um passo a mais da cultura em busca do seu reconhecimento social. Nesse sentido foram levantados exemplos de fomento a cultura como os Pontos de Cultura (de núcleos de produção cultural), programa do qual Célio foi idealizador; destacou-se a apropriação da universidade pelos grupos sociais em favor de um conhecimento e uma formação livre; e até de atividades de difusão cultural, como a exibição de filmes produzidos por realizadores de comunidades indígenas que desenvolvem suas narrativas e produções culturais em seus próprios idiomas.
Nesse debate, foi fundamental o questionamento sobre a inclusão social, pois a visão da ascensão social, principalmente da nova classe média brasileira foi desconstruída. Célio foi incisivo no apontamento de que o que houve foi apenas uma ascensão pelo consumo, segundo ele o que temos agora são novos consumidores, mas em qualidade de vida, educação e cultura, inclusive recorrendo ao recém-divulgado novo IDH brasileiro, avançamos muito pouco. A contraposição contra essa situação, segundo ele, pode ser feita, pois a ideologia do Mercado não é a única alternativa (nem a do Estado e nem a da Igreja), somos nós que transmitimos poder a eles. Ainda assim as mercadorias se apoderam de nossos desejos e sonhos contra o que devemos nos opor com o protagonismo, a autonomia, as narrativas próprias, ações estas articuladas em redes paras que sejam amparadas pela formação e pela cultura livre.
Outro ponto importante levantado no debate foi a criminalização dos acessos livres na internet em alguns países, ou mesmo o controle do acesso a internet. Ao que saiu a indicação sobre a necessidade de defesa do que é comum, no sentido daquilo que deveria estar a disposição para uso coletivo. Célio propôs a redescoberta do valor do comum e da percepção de um novo estágio de vida em um viés comunitário. Segundo ele, para tanto é preciso um comércio mais justo, o trabalho colaborativo, o compartilhamento de informações e conhecimento, auxiliado por uma rede de sustentação na qual os grupos sociais seriam os protagonistas de suas ações, diferentemente do que predomina no sistema político e estatal brasileiro.
Nesse sentido faz-se extremamente urgente a discussão de novas plataformas jurídicas para repensar o espaço institucional, plataformas estas de participação popular que adentrem as instâncias Estatais para amplificar a potência de articulação civil e ocupem um espaço de direito da sociedade do qual ela está se ausentando. Para isso, Célio usou exemplos de medidas que grupos ou partidos políticos tomam de forma “interesseira”, em suas palavras, diferente de defenderem interesses de um grupo amplo da sociedade nas bancadas parlamentares.
Diante da correlação de forças políticas foi colocado em pauta o imaginário do Brasil e o seu reconhecimento. Através de uma identificação por meio de uma linguagem comum foi proposto que a dominação deve ser combatida da mesma forma, ou seja, contrapondo uma ideologia de mercado com outra mais livre, solidária e colaborativa ou no caso das universidades “hackeando” seus espaços de utilização e se apropriando deles socialmente. Nos casos de núcleos de extensão a idéia é que além deles irem até as comunidades, o melhor seria que elas viessem até a universidade, no sentido de se apropriarem do que é comum e público por direito. Para tanto deve haver uma mudança forte de atitude nos espaços institucionais, jurídicos e sociais que abarque novos atores sociais.
Foi com um depoimento que a mesa de debate terminou: um dos ouvintes testemunhou sua experiência no poder, colocando justamente a necessária apropriação tecnológica e social do conhecimento dos espaços institucionais para a transformação do sistema. Ao mesmo tempo desabafou quanto as ações políticas e partidárias, ressaltando o seu pior lado, o da “politicagem” e a necessidade de ocupação civil do sistema político em prol de melhorias significativas em relação a educação e a cultura brasileira.
*Marcelo Félix é graduando do curso de Imagem e Som da UFSCar, graduado em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e integrante da Editoria Geral da RUA.
1. Célio Roberto Turino de Miranda é historiador, especialista em Administração Cultural, escritor e servidor público brasileiro. Atualmente, integra o Coletivo Nacional de Cultura do PCdoB. Célio Turino foi Secretário Municipal de Cultura de Campinas de 1990 a 1992, Diretor do Departamento de Programas de Lazer na Secretaria de Esportes, na gestão de Marta Suplicy, e Secretário na Secretaria da Cidadania Cultural do Ministério da Cultura entre 2004 e 2010, período em que criou o Programa Cultura Viva, política do Ministério da Cultura que marca uma mudança de paradigma na elaboração de políticas públicas para a Cultura no Brasil. O Programa Cultura Viva viabilizou a criação de mais de 2000 Pontos de Cultura espalhados em mais de mil municípios do Brasil, beneficiando mais de 8 milhões de pessoas e criando 30.000 postos de trabalho.
2. Chloe Mary Furnival possui graduação em Comparative American Studies – University Of Warwick (1987), mestrado em Computation – University Of Manchester Institute Of Science And Technology (1993), mestrado em Master In History – University Of Warwick (1988) e doutorado em Política Científica e Tecnológica pela Universidade Estadual de Campinas (2001). Atualmente é professor adjunta da Universidade Federal de São Carlos. Tem experiência na área de Ciência da Informação, com ênfase em Processos da Comunicação, atuando principalmente nos seguintes temas: desenvolvimento sustentável, educação ambiental, informação, ciência da informação e ciência e formulação de políticas públicas.
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