O Cinema Gigantesco: O Imax

Por Eduardo Pires Christofoli *

“Uma das questões centrais do mercado cinematográfico hoje é como trazer de volta as pessoas às salas de cinema”, coloca o diretor da RAIN NETWORKS, José Eduardo Ferrão, em entrevista ao site La Latina¹. Este é um dos objetivos da retomada dos sistemas estereoscópicos de projeção, assim como os super-formatos 70mm que deram origem às projeções IMAX. Ambas, tecnologias em desuso que saíram de suas “tumbas” graças às possibilidades de renovação tecnológica. Se a sala de cinema precisa oferecer uma nova experiência nada melhor do que seduzir o espectador com algo “novo”.

“O frenesi lúdico e espetacular se exprime igualmente através de um outro tipo de tela, caracterizada por suas dimensões: a tela gigante” (LIPOVETSKY e SERROY, 2009, p. 279). Voltam as telas gigantes. Ressurgimento é a palavra mais adequada, já que, assim como os processos de produção e exibição de imagens estereoscópicas (3D), as telas gigantes trazem de volta as antigas tecnologias do Cinemascope e do Cinerama.

Estas novas tecnologias (IMAX e 3D digital) vêm com a missão de oferecer ao público novas experiências cinematográfica, que o faça sair de casa, e do consumo doméstico de filmes, através do home video, da televisão e da Internet. A tecnologia digital amplia e facilita o acesso ao conteúdo audiovisual – aqui recortamos explicitamente os filmes de longas-metragens – e, assim como no passado, no qual o Cinemascope e o Cinerama tinham a missão de proporcionar algo exclusivo do cinema.

O Cinemascope foi uma tecnologia de filmagem e projeção, que trabalhava com lentes anamórficas, utilizada entre 1953 e 1957 para a gravação de filmes widescreen². O surgimento dessa tecnologia de lentes anamórficas, teoricamente, permitiu a criação de um processo que gerava uma imagem de aspecto 2.66:1, quase duas vezes mais larga do que a existente no mercado. Ao pretender dar ao espectador uma visão panorâmica de 146° no cinema, foi criado o Cinerama, um processo cinematográfico que trabalhava com imagens projetadas simultaneamente por três projetores de 35mm sincronizados para uma tela de proporções gigantescas.

O problema era que, por constituírem-se de processos que exigiam atualização de equipamentos por parte dos donos de salas de cinema, estas tecnologias foram aos poucos desaparecendo. Porém, suas características deram origem a uma nova tentativa para o formato: os cinemas IMAX. Esta busca no passado pelo diferencial cinematográfico é lembrada por Erik Felinto (2010, p. 9) que, ao analisar a questão, coloca “se, por um lado, não se pode fechar os olhos aos riscos que assumimos em nossa cultura cada vez mais tecnológica […], não parece sensato negar os rumos do tempo e buscar um retorno a idílicos passados”.

“É a mais moderna experiência cinematográfica do mundo”, descreve o site da IMAX3. Com imagens mais claras e brilhantes e som surround, o espectador é envolvido pelo filme. As dimensões da tela de um cinema IMAX são variáveis, mas geralmente possuem medidas de 22 x 16 metros. Esta escala equivale a um edifício de cinco andares e permite uma visão geral do filme, de qualquer lugar da platéia. O objetivo central do IMAX é:

“Amplificar dramaticamente a resolução da imagem pelo uso da bitola de filme mais larga. Para conseguir isso, uma película de filme de 70mm corre horizontalmente entre as câmeras. Enquanto o filme tradicional de 35mm, a área da imagem corresponde a 48,5 mm x 22,1 mm, no IMAX a imagem é de 69,6 mm x 48,5 mm. De modo a expor a tradicional velocidade do filme de 24 quadros por segundo, é necessário que uma quantidade de filme três vezes maior se mova através da câmera a cada segundo.” 4

O QUE MUDA COM O IMAX: COMPARAÇÃO DE TELA Fonte: Assis, Diego. Chegada do IMAX reforça processo de modernização dos cinemas do país. Disponível em: .

Foram precisos exatos 38 anos desde o seu surgimento para que a tecnologia IMAX chegasse ao Brasil. A primeira sala IMAX instalada no país foi no Shopping Bourbon, em São Paulo. O biodocumentário Fundo do Mar 3D (Deep Sea 3D, 2006), dirigido pelo oceanógrafo Howard Hall, foi escolhido para inaugurar a programação do espaço. Hoje, a IMAX já conta com pouco mais de 320 salas espalhadas pelo mundo. O Brasil conta com 2 salas, uma em São Paulo e outra em Curitiba, no Palladium Shopping Center. Há previsão de construção de mais uma sala em Porto Alegre, no Bourbon Shopping Walling5.

Tornar as telas cada vez maiores e proporcionar uma experiência única para o espectador sempre foi um dos maiores desejos da indústria cinematográfica. Mas de nada adiantaria apenas ampliar as imagens se houvesse perda de resolução nesse processo. Afinal, todos queriam qualidade, e não uma imagem enorme, granulada e cheia de falhas. “Que as tecnologias existam hoje principalmente para nos seduzir é algo que a experiência dos cinemas IMAX testemunham exaustivamente” (FELINTO, 2010, p. 14).

Essa potencialização dos sentidos acontece graças ao formato da tela e à disposição dos assentos. Como ela é levemente côncava, quando vista de frente temos a impressão que a profundidade do campo de visão (distância dos olhos em relação à tela) é um pouco maior do que o que realmente vemos. “Se o produto a ser exibido é diferenciado, as salas de exibição serão diferenciadas também” (DE LUCA, 2004, p. 297).

O objetivo da sala de cinema é proporcionar ao espectador um produto diferenciado, algo que ele não terá assistindo a filmes no computador e no celular, no formato de pequenas telas. A proposta é fazer com que o espectador saia de sua residência e vá ao cinema, sente-se na sala e sofra a ação do impacto cinematográfico, hoje, renovado pela tecnologia. A análise de Lipovetsky e Serroy reforça esta ideia e o principal objetivo do IMAX:

“O cinema, com certeza, pertence inteiramente a essa revolução cultural, em particular por sua força de impacto. A imagem gigante, projetada na tela de uma sala escura atinge em cheio aquele a quem é destinada. O impacto é visual, resultando literalmente de um fenômeno óptico, que o cinema sempre fez acentuar por meios técnicos cada vez mais sofisticados: imensidão das telas, montagem acelerada, efeitos especiais. Mas o impacto é também mental, graças ao poder de envolvimento da própria intriga e à projeção do espectador no que lhe é projetado.” (LIPOVETSKY e SERROY, 2009, p. 45)

A projeção IMAX funciona diferenciadamente da tradicional em 35mm. No filme tradicional, são rodados 24 quadros por segundo – ou seja, para cada 1 segundo de filme, temos 24 fotogramas. Assim, 1 minuto de filme equivale a 1.440 fotogramas. Já os filmes em 70mm podem rodar em até 72 quadros por segundo, mas normalmente são utilizados apenas 48 quadros por segundo. Logo, para um filme com duração de uma hora e meia, por exemplo, seria necessário despender o dobro de material para filmar exatamente o mesmo roteiro.

O QUE MUDA COM O IMAX: NEGATIVO. Fonte: Assis, Diego. Chegada do IMAX reforça processo de modernização dos cinemas do país. Disponível em: .

Mesmo assim, o diretor Christopher Nolan aceitou o desafio e usou desta tecnologia na continuação do filme do personagem de quadrinhos Batman, em O cavaleiro das trevas (The dark knight, 2008). Em sua versão em DVD, o filme traz, no disco de extras, o vídeo Filmando fora dos padrões convencionais (Shoting outside the Box), no qual o diretor, a equipe de fotografia, os produtores, entre outros, detalham a cena inicial do filme – chamada pelo diretor de prólogo –, que foi realizada em IMAX. Nolan comenta:

“Estou muito feliz com os resultados da fotografia em IMAX. É o formato de mais alta resolução do mundo. E cria uma imagem extraordinária, faz você mergulhar na sua tela IMAX, que é uma tela colossal. Lança o público direto na ação, de um jeito que nenhum outro formato faria.” 6

No mesmo vídeo, o consultor IMAX do filme, David Keighley, reforça a questão do diferencial do IMAX, comparando um pedaço de filme 35mm a outro de 70mm. Keighley destaca:

“Em cima [comparando as películas], você pode ver quatro quadros de 35mm. Claro que passa pelo projetor, sobe e desce. E essa é uma cópia abaixo de fotogramas em IMAX. E o IMAX passa pelo projetor horizontalmente. E são quatro quadros de IMAX. É nove vezes mais, então por isso que a resolução do IMAX é incrível. IMAX é um meio imersivo, claro. Você preenche a tela toda e tem um impacto maior no público. Não só visualmente. O som IMAX é incrível, também. Você sente e vê o filme.”7

Além do tamanho da tela, se comparada à média das salas de cinema tradicional, e da altíssima resolução das imagens, que pode chegar a até 10.000 por 7.000 pixels, segundo dados do fabricante canadense, contra 2.048 por 1.080 pixels da maioria das salas de cinema digital, o espaço IMAX é também compatível com os filmes com tecnologia de projeção 3D.

Nas salas IMAX, o exibidor tem a opção de uma programação diferenciada, porque ele tem a opção de realizar exibições em 2D e 3D. Este fato inclui grandes sucessos de Hollywood e documentários exclusivos para IMAX. Por isso, podemos afirmar que o IMAX 3D é uma projeção em 3D mais realista do que a comum, que coloca o espectador dentro do filme. A sensação de imersão é única, em função do tamanho e posicionamento da tela, que criam a ilusão de que os limites da tela desapareceram. Para a ativação do efeito 3D, são utilizados dois projetores. Os óculos 3D separam as imagens, ficando uma em cada lente, cabendo ao cérebro humano o papel de juntá-las novamente.

Este sistema estereoscópico só é possível pelo desenvolvimento das salas de exibição digital IMAX (IMAX digital theatre system). Este sistema começou a ser instalado em 2008, e acabou com a necessidade de bobinas para projetar o filme, além de facilitar a distribuição. Os sistemas foram construídos no padrão DCI, e utilizam projetores Chirstie 2K da Texas Instruments Digital Ligth Prossecing, juntamente com tecnologia da própria IMAX. O resultado é satisfatório, porém há uma perda de resolução, se comparado ao processo analógico. Esta perda está calculada no valor de 1.200 x 8.700 a 6.120 x 4.500 pixels realmente perceptíveis. Mas o sistema digital pode realizar exibições 2D ou 3D no padrão DCI, trazendo à sala mais benefícios do que malefícios. A empresa vem estudando a possibilidade de uma parceria com a Sony para implantar projetores de 4K em suas próximas salas.

Ao término do primeiro semestre de 2010, nenhum filme comercial foi realizado completamente com o uso da tecnologia das câmeras IMAX. Interpretações de comentários do diretor Christopher Nolan sobre filmar o terceiro longa metragem do homem-morcego de uma forma tecnologicamente nunca vista antes8, tendo o diretor já anunciado que não usaria o formato 3D, originaram suposições da produção do filme inteiro no formato IMAX. Porém, logo estes comentários foram desmentidos pela própria equipe do filme.

De qualquer maneira, outros filmes já utilizaram a película 70mm para filmagem de algumas de suas cenas. O resultado foi a exibição em projetores convencionais 35mm e nos IMAX. Entre eles, O cavaleiro das trevas realizou seis cenas, que somam trinta minutos. Michael Bay, ao realizar Transformers: a vingança dos derrotados (Transformers: revenge of the Fallen, 2009), incluiu nove minutos de cenas captadas em IMAX. John Woo já anunciou que está utilizando câmeras de 70mm em seu novo filme, Flying tigers. No Brasil, até o final de 2010, não constam registros de utilização desta tecnologia para produção de filmes. Porém, o formato vem buscando se afirmar no espaço, onde as salas IMAX veem um crescimento significativo, principalmente em mercados onde o produto norte-americano é dominante.

¹ Latina, La. Entrevista: José Eduardo Ferrão fala sobre a nova fase da Rain. Disponível em: <http://www.lalatina.com.br/viewpost.php?id=628>. Acesso em: 22 de Setembro de 2010.

² O resultado de imagens capturadas no formato widescreen está em seu formato mais retangular se comparado ao formato fullscreen da televisão comum, que era quadrado.

³ http://www.imax.com. The IMAX Experience, onde o espectador sente-se como se ele estivesse dentro do filme.

4Wikipédia: “IMAX”. Disponível em http://en.wikipedia.org/wiki/IMAX.

5 A primeira sala de cinema IMAX no Brasil foi inaugurada em 16 de Janeiro de 2009 com custo estimado em U$ 1,5 milhão, algo na estimativa de R$ 2,7 milhões. A sala possui 334 lugares e 300 metros quadrados. A sala de Curitiba, inaugurada no dia 23 de Julho de 2009, possui sistema de exibição 3D e IMAX Digital. A sala é resultado de uma parceria com o Grupo Dom Bosco e conta com 347 lugares e os mesmos 300 metros quadrados. A próxima sala a ser construída terá 345 lugares e tem previsão de inauguração para 2011.

6 Christopher Nolan, diretor de O cavaleiro das trevas (The dark Knight, 2008) no vídeo de making of Filmando fora dos padrões convencionais (Shoting outside the box).

7 David Keighley, consultor IMAX do filme O cavaleiro das trevas (The dark knight) no vídeo de making of Filmando fora dos padrões convencionais (Shoting outside the box).

8 Maiores informações sobre o comentário e sua repercussão no link: http://www.omelete.com.br/cinema/batman-dark-knight-rises-nao-sera-rodado-inteiro-em-imax/.

* Eduardo Pires Christofoli é Mestre em Comunicação Social pela PUCRS, Graduado no Curso de Produção Audiovisual – Cinema e Vídeo da PUCRS, Produtor Audiovisual, Sócio-Diretor da Produtora Colateral Filmes.


REFERÊNCIAS

Assis, Diego. Chegada do IMAX reforça processo de modernização dos cinemas do país. Disponível em: <http://g1.globo.com/Noticias/Cinema/0,,MUL959276-7086,00.html>. Acesso em: 08 de outubro 2010.

FELINTO, Erik e BENTES, Ivana. Avatar: o futuro do cinema e das tecnologias digitais. Porto Alegre: Sulina, 2010.

Latina, La. Entrevista: José Eduardo Ferrão fala sobre a nova fase da Rain. Disponível em: <http://www.lalatina.com.br/viewpost.php?id=628>. Acesso em: 22 de Setembro de 2010.

LIPOVETSKY, Giles e SERROY, Jean. A tela global: mídias culturais e cinema na era hipermoderna. Porto Alegre: Sulina, 2009.

LUCA, Luiz Gonzaga Assis de. Cinema digital: um novo cinema? São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo: Cultura – Fundação Padre Anchieta, 2004.

The IMAX experience. Disponível em <http://www.imax.com>. Acesso em: 4 de julho de 2010.

Wikipédia: “IMAX”. Disponível em <http://en.wikipedia.org/wiki/IMAX>. Acesso em: 4 de julho de 2010.

FILMES CITADOS

Deep Sea 3D (Fundo do Mar 3D) – Howard Hall, 2006.

The dark knight (O cavaleiro das trevas) – Cristopher Nolan, 2008.

Transformers: revenge of the Fallen (Transformers: a vingança dos derrotados) – Michael Bay, 2009.

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Este post tem um comentário

  1. Author Image
    Katrin

    Oi,

    Estou procurando de uma cinema analógico que mostra filmes de 35mm em POA. Alguém tem uma idéia?
    Muito obrigada

    Katrin

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