Os Vingadores (Joss Whedon, 2012)

Por Arthur Souza Lobo Guzzo*

Quando os estúdios Marvel tiveram a ousadia o suficiente para chamar um diretor como Kenneth Branagh (acostumado com obras de Shakespeare) a comandar o filme Thor, mais um blockbuster sobre super-heróis, fizeram algo digno de nota. À época, o filme agradou justamente por essa característica que denotava um desejo de agregar verossimilhança às relações humanas contidas na história em meio às explosões, pancadarias e cenas de ação que, obviamente, estariam lá. E deu certo, em minha opinião. Mesma coisa com Homem de Ferro: foram extremamente corajosos em chamar Robert Downey Jr. como protagonista, que se revelou a grande atração de todo o filme com seu Tony Stark cínico e irreverente. É a mesma coragem, por exemplo, que os realizadores de Piratas do Caribe tiveram em deixar Johnny Depp compor um personagem totalmente estranho e hilário como Jack Sparrow. Pois a Marvel e o diretor Joss W. acertaram novamente com Os Vingadores, que trilhou o mesmo caminho: souberam dosar adequadamente a exposição dos personagens e suas motivações pessoais,  enquanto tem-se o carnaval de sempre de uma superprodução que lida com uma invasão alienígena à Terra como pano de fundo. Apesar das falhas que obviamente existem, o filme é muito bem sucedido no que se propõe a fazer.

E a que um filme que atende pelo nome Os Vingadores se propõe? “Amarrar” as histórias dos principais heróis da Marvel em um esforço conjunto? Ser o filme mais barulhento e com as maiores explosões do momento? Propiciar duas horas e vinte minutos de entretenimento puro e simples, mas com qualidade? Consolidar a idéia de um estúdio de cinema originado a partir de uma empresa que faz histórias em quadrinhos, levando seus principais personagens ao cinema?  Todas as alternativas citadas são devidamente atendidas pelo filme, com algumas ressalvas, é claro. A começar pelo batido conceito de que a união faz a força e que somente resolvendo suas diferenças os super heróis conseguirão derrotar a ameaça que os cerca.

Quando Alan Moore escreveu o seminal Watchmen, que, curiosamente, também lida com uma equipe de heróis e seus problemas (em um nível muito mais complexo e profundo do que Os Vingadores), um dos personagens, o super herói Niteowl, comenta que foi só quando os vilões começaram a desaparecer que eles perceberam o quanto eles eram necessários. Trata-se também de um tema explorado no Cavaleiro das Trevas de Christopher Nolan, quando o Coringa explica ao Batman que ele não quer que as coisas voltem a ser como antes (sem Batman), pois o herói o completa. O grande problema de um filme desses é que, quando se junta um monte de humanos com poderes especiais e fantasias de gosto duvidoso, é preciso conjurar também uma ameaça proporcional ao que eles podem fazer. Apenas o irmão vilanesco de Thor, Loki, não é suficiente, apesar de Tom Hiddleston estar excelente e muito à vontade no papel, ainda mais do que no filme Thor. E aí sobra para os bons e velhos alienígenas invadindo a Terra. Só que essa premissa (invasão alienígena) já está mais do que desgastada, surrada, e em muitos casos utilizada de forma bem mais interessante do que aqui. E os realizadores deste filme sabem disso. Portanto, o que restou foi investir nos conflitos de personalidade entre os protagonistas, nos diálogos entre os personagens e no ocasional bom humor que tempera algumas cenas. Feito isto, o resto é pancadaria pura, capaz de rivalizar até com Michael Bay, um notório apreciador de explosões em grande escala, como em sua série Transformers (outra franquia que tem por base a chegada de seres de outros planetas à Terra).

Nesse sentido, alguns dos momentos mais interessantes são aqueles que envolvem o conflito de personalidades entre Capitão América e Homem de Ferro. Apesar de óbvio, rende. Afinal, um é um super soldado a serviço do governo, vindo diretamente dos anos 40, pregando o respeito à hierarquia e às ordens, etc., enquanto o outro esteve justamente em conflito com o governo (que queria pôr as mãos em sua tecnologia) e faz o que bem entende, revelando-se um grande hedonista que preza pela sua liberdade acima de tudo. Os demais “conflitos” acabam empalidecendo diante deste. Um exemplo é a cena em que Thor tenta resgatar seu irmão Loki da custódia da agência governamental S.H.I.E.L.D., para que ele seja julgado em Asgard, e uma briga entre ele, o Capitão e o Homem de Ferro se desdobra. Desnecessária, a cena serve apenas ao intuito de mostrar a destruição que os heróis podem causar. Outro ponto que vale a pena comentar é a presença do Hulk, interpretado por Mark Ruffalo. O contexto em que aparece é bem diferente dos outros filmes – enquanto antes ele era o estigma do qual Bruce Banner tentava suprimir e se livrar, aqui ele é uma espécie de alívio cômico. Funciona bem, e é de se esperar mais filmes com o grandalhão depois do tamanho sucesso que a sua aparição obteve.

Em resumo, Os Vingadores consegue obter êxito em algo que, a princípio, parecia fadado ao fracasso. Um filme sobre um grupo de super heróis que consegue dar o devido destaque a cada um deles – e até mesmo mostrar lados desconhecidos de suas personalidades. A coragem anteriormente citada diz respeito à tentativa do novo, mais especificamente a questão de um universo cinemático divido em vários filmes solo dos super heróis, que aqui atingem seu ápice. Este fato com certeza dará origem a vários outros produtos semelhantes, visando franquias e longas séries. Não nos esqueçamos de que isto ainda é Hollywood, os orçamentos ainda estão na casa das centenas de milhares de dólares, e a Marvel agora pertence aos estúdios Disney. Ou seja: Agora é esperar a sequência, que, fatalmente, virá.

*Arthur Souza Lobo Guzzo é graduado em Comunicação Social pela PUC-Campinas e em Ciências Sociais pela Unicamp.

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