CRÍTICA | Classe Operária vai ao Paraíso (1971), Elio Petri

Por: Nycolle Barbosa

Redação RUA

“Classe Operária vai ao Paraíso”, filme italiano de 1971 dirigido por Elio Petri, é um drama político e satírico que oferece uma visão penetrante sobre o sistema capitalista e a complexidade das relações de classe. Acompanhamos a jornada de Lulu Massa (interpretado brilhantemente por Gian Maria Volonté), um operário de uma fábrica metalúrgica obcecado por ascender socialmente, mesmo envolto em um ambiente de exploração e alienação. Ele está disposto a sacrificar sua integridade e segurança, assim como a de seus colegas, em nome de uma suposta ascensão na hierarquia social – ou 30 liras italianas a mais por mês.

Na cena inicial, somos confrontados com a crua realidade da vida de Lulu. Enquanto sua esposa sonha com os prazeres da carne, ele está imerso em pensamentos sobre trabalho e produtividade. O contraste entre os sonhos da esposa e a reflexão de Lulu com o trabalho é emblemático das tensões subjacentes na vida do casal e na sociedade retratada no filme: enquanto a esposa busca escapar da realidade por meio de fantasias eróticas, desejando intimidade com o marido, Lulu estabelece um tom sombrio e satírico considerando o homem como uma fábrica de merda – um comentário mordaz sobre a condição alienante do trabalho sob o capitalismo, onde os indivíduos são transformados em meros instrumentos de produção, perdendo sua humanidade no processo.

Lulu questiona o mundo ao seu redor e busca entender sua própria condição dentro dele. Sua inquietação em relação ao futuro e seu medo de se tornar “um animal”, alguém destituído de humanidade e sensibilidade, ecoa as ansiedades e incertezas de muitos trabalhadores em um mundo marcado pela exploração e pela opressão. A narrativa é habilmente construída em torno dos dilemas morais e das contradições internas enfrentadas pelo protagonista. À medida que ele se envolve em jogos de poder e manipulação para ganhar a aprovação de seus superiores, sua consciência é confrontada com as consequências de suas ações.

A ironia reside no fato de que, mesmo que Lulu alcance seus objetivos materiais, ele se torna cada vez mais alienado de si mesmo e dos outros ao seu redor, sendo além de um símbolo das injustiças sociais e da exploração dos trabalhadores, uma figura trágica, presa em um ciclo de violência, desilusão e ambição. A identificação com Militina, seu amigo do manicômio, serve como um espelho de suas próprias preocupações e medos em relação à loucura e à alienação.

No entanto, apesar de não achar que o filme concorde com as ações que o personagem tem com sua esposa e ex, na verdade, a película mostra que é Lulu um personagem complexo e multifacetado, cujas motivações são influenciadas por uma variedade de fatores. Tampouco parece oferecer o mesmo para as personagens femininas, alvos de objetificação e assédio constante, representadas de maneira irreal. Elas carecem de chances de darem suas próprias perspectivas.

De maneira geral, “Classe Operária vai ao Paraíso” possui uma visão pessimista da realidade, mas sugere que as respostas para esses problemas podem ser encontradas no coletivo e na solidariedade dos trabalhadores, sindicalistas e estudantes. É nessa comunhão de esforços e na resistência coletiva que reside a esperança de uma transformação significativa e duradoura. Na cena final, imersos nesse ambiente da linha de montagem, Lulu Massa compartilha a história do sonho que teve, onde ele é encorajado por Militina a derrubar os muros que os separam do Paraíso.

Para o diretor, Elio Petri, o Paraíso só seria alcançado quando a classe operária conseguisse superar as estruturas de poder que os mantêm aprisionados na alienação e na exploração. Essa mensagem revolucionária ressoa, nos oferecendo uma visão de um futuro onde a solidariedade e a resistência coletiva podem triunfar sobre as injustiças e desigualdades do sistema capitalista.

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