Entrevista com Rodrigo Camargo¹ – Assessor de Diretoria da Ancine

Por Estela Andrade e Priscila Lourenção, Estela Andrade, Gabriel Ribeiro*

Durante a 11ª Semana de Imagem e Som, no final de Maio deste ano na Universidade Federal de São Carlos, UFSCar, uma das palestras mais esperadas pelos estudantes de Audiovisual e o público em geral, foi a do Assessor de Diretoria da Ancine , Agência Nacional do Cinema, Rodrigo Camargo.

Rodrigo Camargo, formado pela UFSCar em 2000, trilhou seu caminho de estudante a produtor, até “mudar de lado no balcão”. Passou a trabalhar na Ancine em 2002, mesmo ano de nascimento da Agência. Nela, foi responsável pela avaliação de projetos e suas possíveis captações de recurso no mercado. Hoje, como assessor de diretoria, é um dos responsáveis pela estruturação do Fundo de Audiovisual.

A RUA conversou com Camargo sobre a sua trajetória na produção audiovisual, sua experiência como produtor. Ele também nos contou como vê a produção nacional de hoje e acalentou a polêmica que atualmente envolve a Ancine e os cineastas do país.

Estela Andrade e Priscila Lourenção: Atualmente você é assessor de diretoria da Ancine, mas já trabalhou como realizador no meio audiovisual. Você poderia falar sobre as diferenças e as particularidades de se trabalhar nessas duas áreas ?

Rodrigo Camargo: Como realizador, comecei ainda na faculdade no curso de Imagem e Som e quando fui para o mercado, eu entrei pela porta da produção. Assistente de produção, assistente de produção executiva e também trabalhando no dia – a – dia da produtora, na parte de formatação de projetos para leis de incentivo, projetos para editais. Então, um trabalho também burocrático, de escritório e quando tinha a filmagem, aí era o grande momento depois de 6, 7 meses trabalhando em escritório captando recursos. E quando a produção se concretizava a gente ia pro set. Trabalhei em um filme no qual ficamos 4 meses em uma cidade no litoral da Bahia. E durante esse tempo, a produção não tem praticamente um dia de folga, porque você acaba projetando coisas para dia seguinte. Eu tinha um ano formado, quando fui trabalhar nesse longa – metragem e adorei a experiência. Foi muito gratificante, aprendi muito com a produção. Uns dois anos depois (nesse tempo eu trabalhei como freelancer, com edição), eu recebi o convite para trabalhar na estruturação da Ancine, que estava sendo criada com a área de projetos de cinema. Ou seja, eu recebia os projetos, verificava a habilitação dos projetos para captarem os recursos incentivados. Mudei de lado no balcão. Antes eu mandava os projetos para o Ministério da Cultura. Depois, eu passei a recebê-los. Trabalhei 5 anos nessa área, vendo todo tipo de problema que a produção enfrenta, mas claro, de um jeito mais burocrático, uma parte mais de documentação, de captação de recursos. Eu tive contato com toda produção brasileira feita com recursos de incentivo. Estou há 3 anos trabalhando na assessoria da diretoria. Ajudei a estruturar o Fundo do Audiovisual, que é um fundo público em que o Estado tem uma participação nos resultados da obra. As particularidades são essas: na produção audiovisual você tem toda uma parte de burocracia envolvida, de escritório, de participar de editais e que é fundamental para levantar os financiamentos do projeto. Antes, eu preenchia o formulário, agora, eu o analiso. Essa é a grande diferença no setor público.

E. e. P: Ultimamente há muitos estímulos para realizações em parceria com outros países, como isso auxilia no desenvolvimento da produção nacional ?

Rodrigo: Os acordos de coproduções internacionais, muitos eram dos anos 1960 e foram sendo renovados dos anos 2000 pra cá, tem como objetivo levantar fundos para a produção. E a troca de capacitação, experiências. É um aprendizado técnico e artístico.

E. e P: A cada ano há uma maior industrialização do cinema nacional. Você acha que a criação da Ancine, em 2001, contribuiu para a aceleração disso ?

Rodrigo: Esse é o objetivo da Ancine: fortalecer a indústria do cinema. Claro que já havia uma política de estímulo à produção audiovisual, desde a criação das leis de incentivo no começo dos anos 1990, e já havia crescimento e consolidação dos filmes nacionais no cenário brasileiro. Tanto é, que um dos grandes sucessos do cinema brasileiro, Cidade de Deus (Fernando Meirelles, 2002), foi lançado em 2002, o ano em que a Ancine foi criada. O que eu acho que a Ancine proporcionou foi, primeiro, normas mais claras para a entrada dos projetos. A quantidade de empresas produtoras registradas dobrou e a quantidade de projetos triplicou. A gente trabalhava com cerca de 30 filmes lançados por ano no começo da década, entre 2000 e 2005. Hoje em dia, nós trabalhamos com cerca de 90 filmes lançados por ano. Isso mostra que a Ancine serviu para consolidar o crescimento que já havia e com a exceção de vários novos mecanismos como os Funcines (Fundo de Financiamento da Indústria Cinematográfica Nacional), proporcionou aumento da capacidade produtiva e melhoria da produção. Além de agregar outros parceiros do mercado, como as distribuidoras nacionais, a parceria cinema – televisão e também recentemente o investimento na construção e reformas de salas de cinema.

E. e P.: No mês de abril, uma reunião do Conselho Superior de Cinema, vários cineastas entregaram à ministra da Cultura, Ana de Hollanda, um documento com uma série de reivindicações e críticas dizendo que a Ancine é muito burocrática, no processo de captação de recursos. Gostaríamos de saber sua opinião sobre o assunto.

Rodrigo: Sobre a questão da burocratização da Ancine, no mal sentido, porque a burocracia também tem seus pontos positivos, foi que, como falei anteriormente, o número de empresas audiovisuais dobrou e o número de projetos triplicou. Então, se antes a Ancine trabalhava com 300 projetos anuais e 30 viravam filmes, agora trabalha com cerca de 1000, 1500 projetos. Houve um aumento da carga de trabalho e a contratação de funcionários não acompanhou devidamente essa demanda. O que está acontecendo a partir dessa carta dos realizadores entregue ao Conselho Superior de Cinema é uma força tarefa na área que cuida dos projetos, e está havendo uma pequena reestruturação para identificar quais são os pontos de estrangulamento que poderiam ser aliviados. E naqueles pontos em que não tem como abrir mão, realmente dedicar mais funcionários a eles. Enfim, eu posso dizer que tem tido resultado nos últimos dois meses, mas sempre lidamos com essa dualidade: quanto mais investimos na produção, mais papel, mais trabalho haverá para a Ancine dar conta. Sempre terá de ser acompanhado o aumento no investimento e o aumento na carga de trabalho para que haja um equilíbrio.

1.Rodrigo Albuquerque Camargo é pós-graduando lato sensu MBE – Analista Internacional, do CCJE (Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas), pelo NEI (Núcleo de Estudos Internacionais) da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), pós-graduado em Formação Executiva em Cinema e Televisão pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), especialista em Regulação da Atividade Audiovisual, pela UFRJ e graduado em Comunicação Social – habilitação em Imagem e Som – pela UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos). Trabalhando desde 2002 na Agência Nacional do Cinema – ANCINE, ocupou o cargo de Coordenador de Acompanhamento de Projetos Incentivados até fevereiro de 2008, quando tornou-se Assessor da Diretoria. Possui interesse nas áreas (e interações) de Cultura, Mídia, Relações Internacionais, História, Ciências Políticas e Sociologia.

Perguntas – Estela Andrade e Priscila Lourenção
Captação de Áudio – Estela Andrade
Captação de Vídeo – Gabriel Ribeiro

*Estela Andrade, Gabriel Ribeiro e Priscila Lourenção são graduandos em Imagem e Som pela UFSCar.

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