Kinoforum – 23º Festival Internacional de Curtas Metragens de São Paulo

Por Loiane Vilefort*


A 23ª edição do Festival de Curtas-Metragens Kinoforum aconteceu entre os dias 23 e 31 de Agosto. E esteve presente em seis salas de cinema espalhadas pela cidade de São Paulo, dentre elas a Cinemateca Brasileira, sede do festival, além do Museu da Imagem e do Som (MIS) e do CineSESC. A descentralização por si só já nos evidencia a ótima sugestão do festival: a movimentação das pessoas pela cidade, a descobrir outros espaços, como no meu caso, que fui ao Cine Olido pela primeira vez.

Na programação do festival, o carro chefe, é claro, foram as exibições, onde os curtas-metragens foram agrupados em pequenas subdivisões de mostras. O público teve acesso a curtas internacionais e brasileiros. Cada sessão, com duração aproximada de 1h30, apresentava cerca de cinco ou seis curtas independentes entre si, com a única semelhança de comporem a Mostra Latino-Americana ou a Mostra Panorama Paulista, por exemplo. E o mais interessante é que cada um dos “pacotes” audiovisuais agrupados nas Mostras teve três exibições durante todo o festival, em diferentes dias, horários e lugares, possibilitando ao espectador escolher a melhor oportunidade para conferir.

Cabe lembrar que ao final de todas as sessões os espectadores podiam dar simbólicas estrelas aos curtas assistidos para uma futura lista com os preferidos do público, o que gerava maior interatividade. E é ainda mais importante ressaltar que toda a programação é sempre gratuita, promovendo uma efetiva ponte entre o curta-metragem e o público, muitas vezes pouco acostumado com o formato.

Nesse ponto, observamos a grande importância do festival, que se volta por completo ao formato dos filmes de curta duração, atualmente com espaço reduzido no mercado audiovisual, e que, no entanto, não perdem a força e a vontade de existirem. A prova está no próprio evento, que contou com a inscrição de mais de 600 curtas nacionais de todas as regiões do país.

Foto: Loiane Vilefort

Destaco algumas seções especiais, organizadas como homenagens a importantes personalidades do cinema nacional. Uma delas é Carlos Reichenbach, o realizador das famosas Sessões do Comodoro, falecido em junho desse ano. A curadoria da sessão contou com dois curtas de sua autoria e mais outros cinco à la Comodoro, pouco convencionais ao nosso olhar cinematográfico.

Outras mostras especiais contaram com assuntos mais específicos, como a homofobia. Com o subtítulo de “os outros somos nós” abriu espaço para a discussão sobre a crescente hostilidade da sociedade quanto à visibilidade cada vez maior das diferentes opções sexuais. O subtítulo bastante sugestivo traz a ideia de abrir espaço para a discussão sem a divisão da sociedade entre gays e não gays, e sim a participação mútua para uma boa convivência coletiva. Além da homofobia, outra sessão com temática específica foi a Mostra Feminino Plural, que contou com a exibição de curtas-metragens que de alguma forma tratavam sobre as relações da mulher, tanto profissionais quanto pessoais, gerando certa discussão acerca de alguns temas dentro do movimento feminista.

No entanto, e felizmente, não só com exibições o festival foi organizado. Com a preocupação sobre o espaço do curta-metragem na nossa cultura audiovisual, o festival se propõe a uma interessante discussão para o curioso desinteresse da mídia e do grande público pelo formato. A Oficina Crítica Curta surge justamente com a iniciativa de promover a reflexão desses filmes por meio de críticas, assim como estamos habituados a existência delas para os filmes mais populares, os de longa duração. O crítico Ségio Rizzo comandou a oficina que teve um caráter mais independente, sem ditar normas ou sugestões de escrita, dando aos participantes, alunos de cursos de audiovisual, apenas a liberdade de expressarem suas reflexões críticas acerca dos curtas assistidos. Ao final do evento foi distribuído um tablóide com as algumas das críticas produzidas, além de um blog que permaneceu online durante todo o festival com textos sendo publicados com maior imediatismo.

Foto: Loiane Vilefort

Outro ponto bastante positivo na discussão audiovisual ficou por conta das entrevistas. Todas as manhãs, no saguão da Cinemateca Brasileira, aconteceram breves conversas com os realizadores dos curtas exibidos. (https://www.ebsta.com/) E o grande diferencial foi que as entrevistas podiam ser assistidas não só por quem estivesse no local, como também por quem estivesse em casa, pois tudo foi transmitido ao vivo pelo site do Kinoforum, numa parceria com a Rede Fora do Eixo, que encabeçou a transmissão.

E esse contato mais próximo com os realizadores esteve presente durante todo o festival. Na maioria das exibições os diretores estiveram presentes e antes que a projeção se iniciasse comentavam um pouco acerca de seus filmes, mostrando-se sempre abertos a conversas pelos corredores do evento a quem se interessasse em discutir um pouco mais. Convite que realmente era possível, pois a circulação era intensa nos lugares de exibição, principalmente na sede do festival, onde realizadores e público se misturavam e confundiam-se. Afinal, que realizador não é espectador? E porque não dizer que muitos ali presentes mantinham um interesse tão grande pelo cinema a ponto de também produzirem, ou almejarem produzir, conteúdos audiovisuais?

Uma Mostra em específico, o Cinema em Curso, tendia a estreitar ainda mais essa relação. Com a exibição de curtas-metragens produzidos dentro de cursos universitários de audiovisual do estado de São Paulo, juntamente com a presença dos realizadores representando seus respectivos filmes e cursos, era possível observar um panorama da produção universitária. A intenção do festival com essa mostra foi justamente poder apresentar aos espectadores os diferentes, e, no entanto semelhantes, caminhos que os estudos sobre cinema tem seguido no estado, com a formação de potenciais realizadores.

Foto: Loiane Vilefort

Ainda com a preocupação sobre o espaço do formato no mercado atual, o festival promoveu uma importante atividade chamada Curta & Mercado, onde profissionais da área esclareceram questões a respeito da comercialização do curta-metragem. A principio, foram esclarecidos pontos importantes da nova lei de regulamentação audiovisual para produtos independentes nos canais de TV paga. Logo após essa introdução, representantes de alguns canais pagos apresentaram os enfoques que buscam nos conteúdos audiovisuais independentes para suas grades, que seguem perfis específicos. E a seguir, o festival promoveu uma rodada de negócios, onde realizadores tiveram a oportunidade para negociações de seus produtos com os canais presentes. E tendo em vista a própria realização audiovisual, o festival também promoveu um debate acerca da Lei Rouanet de incentivo à cultura, unindo de forma eficaz as discussões sobre realização, distribuição e exibição.

Observando a variada programação e participando efetivamente dela, o que se pode perceber é uma atenção primorosa a respeito do cinema. Mais especificamente sobre o de curta duração, que ao contrário do que a nossa mal acostumada cultura cinematográfica nos permite deduzir, em nada deixa a desejar. E não por acaso digo isso. Certamente esse é um dos maiores objetivos da organização do festival, dirigido por Zita Carvalhosa: a descoberta da apreciação de um importante personagem da sétima arte: o curta-metragem.

*Loiane Vilefort é graduanda em Imagem e Som pela Universidade Federal de São Carlos(UFSCar) e é editora responsável pela seção Plano Detalhe da Revista Universitária do Audiovisual(RUA)

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