Festival do Rio

O tempo chuvoso no Rio de Janeiro nas últimas semanas impediu o carioca de aproveitar as praias. Ainda bem que de 25 de setembro até 9 de outubro aconteceu o Festival do Rio.

“Um Segredo”

Até o dia 22 de setembro, ninguém sabia exatamente o que seria exibido no Festival do Rio. Uma revista que organiza todos os filmes com suas informações mais básicas é incluída no jornal “O Globo” distribuído na cidade do Rio de Janeiro, apenas alguns dias antes da abertura. E por ela são escolhidos os filmes, a dedo, lendo as sinopses, analisando horários, combinando programações. São mais de 300 filmes e os poucos que serão vistos são escolhidos por sorte. Com sorte, já vi Lost in Translation e Elephant em 2003, Kill Bill em 2004, A Noiva Cadáver e Lady Vingança em 2005, e tantos outros.  Fazendo boas escolhas, o espectador pode ver os melhores filmes do ano, com ótimas escolhas ele verá os mais desconhecidos melhores filmes do ano.

“Happy-Go-Lucky”

A minha programação ficou circulada de filmes atraentes por causa da sinopse ou do diretor. Fiz até uma classificação de importância separada por cores para não deixar de ver filmes que considero indispensáveis (o nível máximo foi apenas para Michel Gondry, detalhe). Tudo isso para, assim que os ingressos forem liberados, comprar o que estiver disponível.

Escolher foi extremamente difícil, são milhões de filmes (mentira, esse ano são um pouco mais de 300), mas é bem difícil de ver mais de vinte. A limitação mais óbvia é o preço de meia-entrada entre sete e oito reais (exceto em selecionadas sessões de filmes e curtas nacionais por dois reais). O preço cobrado pelo cinema é o mesmo para filmes do Festival e para filmes de circuito normal. O local também é limitado. Mesmo sendo um festival da cidade, a maioria dos cinemas fica localizado na Zona Sul ou no Centro da cidade, o que não atrai desprivilegiados moradores de outras áreas.

“O céu, a terra e a chuva”

Mesmo sendo umas das desprivilegiadas, na minha primeira sessão desse ano fui até o Leblon (bairro de mais difícil acesso da Zona Sul carioca) para ver o “Casamento de Rachel”. Como era domingo chuvoso (cinema é uma paixão, ninguém iria tão longe num dia chuvoso), tentei chegar 30 minutos mais cedo, pois acreditei que teriam facilmente ingressos. O Festival do Rio não costuma ter ingressos esgotados, apenas em sessões mais badaladas como “Tropa de Elite” em 2007 (onde chuto que 70% da platéia eram de convidados). Por ter confundido o cinema com um Cinemark num shopping do mesmo bairro (digamos que fiquei perdida no bairro vagando na chuva), cheguei 10 minutos antes de a sessão começar.

Vi uma movimentação animada na frente da bilheteria. Pensei ter ido inultimente até o cinema lotado.  Porém, vendo mais de perto, a sessão lotada era a de Mamma Mia, que estava sendo exibido em outra sala não-reservada para o Festival. Pensei que os cariocas estavam finalmente se animando com o evento, mas na verdade eles queriam ver a Meryl Streep dançando de macacão ao som de Abba. Sorte a minha que teria ingressos e lugares ótimos na sala.

“Fomos à Terra dos Sonhos”

Enquanto no Leblon o Festival do Rio está restrito a menor sala de um cinema velho e escondido, o bairro próximo, Botafogo, é a central do Festival. Já privilegiado em ofertas de salas (são 22), é também em Botafogo que passam a maioria dos filmes cults, em época de Festival ou não. Nele também está o QG do Festival, Espaço de Cinema, que contém três salas e é o único lugar onde se compram ingressos antecipados e os cobiçados passaportes (ingressos que dão direito a 20 ou 50 filmes).

E foi nesse cinema que vi todos os outros filmes que vi no Festival. A vantagem dele é oferecer sessões em horários bizarros como meio dia e meia, ser em frente ao ponto do ônibus diretamente para minha casa (que fica em outra cidade, Niterói) e ser próximo a faculdade. E, é claro, nele passam os melhores e mais desejados filmes. É o oásis para os alunos de Comunicação da UFRJ que não gostam de ir às aulas.

“Contratempo”

Como os organizadores do Festival do Rio tentam exibir todos os últimos sucessos dos outros festivais para satisfazer seus espectadores, algumas vezes acontecem imprevistos. A pressa provoca o cancelamento de alguns filmes depois do anúncio da programação. Esse ano foi cancelado o mais recente filme do Miyazaki, uma pequena decepção para uma fã como eu.  Li que o próprio diretor que vetou. Ele exige que os filmes sejam dublados na língua nativa de onde o filme está sendo exibido. E não houve tempo para uma dublagem em português.

Alguns filmes chegam em cima da hora, então são dúvidas até vésperas da exibição e nem têm os ingressos liberados para venda no primeiro dia. Com o filme “O Roqueiro” algo inédito aconteceu. No meio da exibição o filme parou. A platéia ficou sem entender até uma voz do além (suspeito ter sido do projetista) explicar que não houve tempo para juntar os dois rolos e foi inevitável uma pausa de 1 minuto para uma rápida troca. Esse chegou realmente muito em cima da hora.

“Eu sou porque nós somos”, “Ser como os outros”, “Somos todos diferentes”

(Esses são três nomes de filmes exibidos nesse festival. Prova que cineastas sofrem, freqüentemente, crises de identidade).

O público do Festival muda bastante, depende do horário. Domingo à tarde vão mais idosos e óbvios estudantes de Cinema (traje incluindo boina, xadrez, all star e óculos de acrílico). Segunda às 12h30 da tarde percebem-se estudantes de ensino médio fugitivos denunciados pelo uniforme. Quarta às 11h da noite assistem os viciados em cinema muito ocupados para outros horários, mas que, acima de tudo, verão os filmes (claramente reconhecíveis pelas olheiras).

Interessante são os intervalos. Todos os cinéfilos viram amigos no banheiro. Após assistir “Rebobine Por favor” estava no banheiro quando uma senhora me aconselha “Pelo jeito que você é, vai gostar de Rock’n’Rolla”. Infelizmente não assisti a indicação da misteriosa desconhecida. Minha amiga sugeriu que ela poderia ser Akira Kurosawa num corpo de idosa. Pois, todos sabem, deuses podem adquirir diferentes formas. Da próxima vez, tentarei não contrariar Deus, mesmo na dúvida.

Vivian Macedo é graduanda em Jornalismo pela Universidade Fedeal do Rio de Janeiro (UFRJ)

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