Palestra sobre Crítica Cinematográfica, com Sérgio Alpendre

Por Jéssica Agostinho *

Não seria essa a primeira vez que Sérgio Alpendre discorre sobre crítica cinematográfica no espaço da UFSCar. O crítico compôs uma mesa de debates cuja motivação consistia na própria criação e lançamento da RUA, ainda em 2008 (a cobertura desse lançamento pode ser acessada clicando aqui). Os contextos cronológicos diferentes fazem com que as experiências também sejam distintas. Sérgio voltou à UFSCar para fazer parte da programação da SeIS.13, ministrando uma palestra sobre crítica cinematográfica no segundo dia do evento (23/04).

A proposta trazida até nós foi a de que perguntas e intervenções do público permeassem a exposição, algo que, a princípio, pode facilitar o aprofundamento nos variados assuntos. Assim, Sérgio, iniciou essa ‘conversa’ traçando sua trajetória na crítica cinematográfica e, a partir daí, relacionou-a a outros assuntos mais amplos.

“Você não tem como provar que um filme é melhor que outro, mas você tenta”

Sérgio Alpendre é crítico de cinema da revista Interlúdio e escreve resenhas para a Folha de São Paulo e Uol. Também é professor em espaços especializados e, recentemente, retornou à Academia como pesquisador. Sua trajetória com a crítica inicia-se de maneira não formal, a partir de vários anos de cinefilia. Encarou por muito tempo a escrita como um hobby, proporcionando a si mesmo um aprendizado na área livre de pressões profissionais. Mesmo quando passou a contribuir para a revista Contracampo possuía uma relação não profissional com a crítica, o que só iria acontecer em 2006, com a fundação da revista Paisà. Sérgio pontuou uma relação de decepção com a Paisà, publicação que visava manter-se com seus próprios lucros, o que, em sua avaliação, era uma “bobagem” no contexto brasileiro. A revista manteve-se por três anos e foi de fundamental importância para seu aperfeiçoamento crítico.

Partindo da pluralidade de veículos para os quais escreve, Sérgio diferenciou o que acredita ser a crítica formal daquilo que apontou como resenha jornalística. A primeira estaria relacionada às revistas como a Contracampo e a segunda às mídias como Folha e UOL. Mesmo com essa diferenciação, Sérgio acredita que textos bons podem ser feitos em ambos os casos e acrescentou uma terceira possibilidade de escrita, ligada à Academia.

Segundo Sérgio, o texto jornalístico carrega em si uma obrigação em falar sobre a história do filme, ainda que não revele seu final. Já a crítica formal reserva-se o direito de não dar explicações sobre o enredo fílmico e sim construir análises das escolhas feitas pelos filmes. Gera-se a dualidade entre aquele material que deve ser lido antes da ida ao cinema e aquele que deve ser lido depois. Para Sérgio, essa leitura anterior pode gerar condicionamentos ao espectador, viciando-o com o olhar do crítico e interferindo na relação do leitor com o filme. Defende uma leitura posterior e espera que seus leitores assim o façam, já que o filme deve ser analisado enquanto um todo que já foi explorado, no caso, assistido.

“Você não tem como provar que um filme é melhor que outro, mas você tenta”. Nesse momento da palestra foi retomada uma tradição histórica da crítica de arte, onde muitas análises eram traçadas a partir do efeito de comparação. Citou-se o livro Estética Doméstica, de Clement Greenberg, assim como as ideias do autor. Foi-nos lançada a seguinte pergunta, de maneira clara e direta: A crítica deve ter um posicionamento diferenciado perante o filme brasileiro? Sérgio defende que não. A crítica exerceria, segundo ele, uma pressão para que o cineasta e os filmes melhorem, como um instrumento a serviço da boa arte.

Mas o que é boa arte? Questionado por um dos participantes, Sérgio acredita que exista um consenso sobre o que é aceito como “bom” nas artes em geral, conceito este que tende ao clássico, tendo ele citado exemplo da música, como Mozart, e, em minha avaliação, elitista. As artes de origem popular seriam consideradas “boas” ou o popularesco seria encarado como pejorativo? Este consenso da “boa” arte é estabelecido por quem e para quem? Entretanto, Sérgio pontuou que este consenso é altamente difícil de ser estabelecido no cinema, por ser uma arte muito próxima do real.

Voltando à perspectiva sobre a qual a crítica deve olhar para o filme nacional, Sérgio não nega a importância de se assistir os filmes brasileiros, mas pondera que a crítica seguir por meios não cinematográficos pode ser perigoso. Mesmo que ele tenha brincado, em certo momento do encontro, com o fato de que um baixo orçamento americano é equivalente a um orçamento de luxo no Brasil, a crítica não deve ponderar esses contextos de produção. A crítica deve se debruçar sobre o que cada diretor conseguiu realizar com o orçamento que em mãos tinha, mantendo o foco da análise no filme em si, mais especificamente na mise-en-scene. Sérgio deixou claro que esse é um recorte com o qual ele trabalha e que existem críticos que trabalham recortes de enredo ou políticos. O ideal é que a crítica traga um olhar que faça o leitor/espectador pensar coisas diferentes sobre determinado filme, um olhar que traga algo novo.

Depois dessas e outras discussões e reflexões, Sérgio exibiu um trecho de Tropas Estrelares. O intuito era discutir a visão do filme de grande parte dos críticos da época do lançamento, majoritariamente negativa, oposta à visão do crítico Inácio Araújo, que considerou o filme altamente político e repleto de signos. Seria esse um caso em que o crítico sai em defesa de um filme.

A palestra, que funcionou como um diálogo aberto, com intervenções dos participantes, levantou vários assuntos pertinentes e reflexões acerca da crítica, tendo um balanço final bastante positivo.

*Jéssica Agostinho é estudante de Imagem e Som da Universidade Federal de São Carlos e editora da RUA.

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