
Por Nycolle Barbosa
Redação RUA
A cultura do armário não é simplesmente sobre se esconder – é uma presença sufocante e opressiva que permeia todos os aspectos da vida cotidiana. Em Blue Jean (2022) dirigido pela diretora britânica Georgia Oakley, essa realidade é explorada com uma sensibilidade aguda ao revelar a constante tensão e medo vividos por aqueles que são forçados a esconder sua verdadeira identidade. Ambientado na Inglaterra dos anos 80, durante o governo de Margaret Thatcher e a imposição da Cláusula 28, o filme nos leva ao mundo de Jean, uma professora de educação física que navega a dualidade de sua existência sob a sombra do preconceito e da repressão. Ao emular a estética da época com filmagens em 16mm, Oakley não apenas homenageia os clássicos cinematográficos, mas também captura a textura visceral de uma época marcada pela luta e resistência da comunidade LGBTQIA+. Neste contexto, é importante lembrar que o orgulho é um motim, uma força vital que impulsiona Jean e muitos outros a reivindicarem sua verdade, desafiando as barreiras impostas pela sociedade.
Blue Jean (2022) nos transporta para a Inglaterra de 1988, período marcado pela repressão e pelo medo para a comunidade LGBTQIA+ dos cidadãos britânicos conservadores, durante o governo de Margaret Tatcher que cria a “Cláusula 28”, lei que proíbe a “promoção da homossexualidade” nas escolas. Justamente, acompanhamos a história de Jean (Rosy McEwen), uma professora de educação física que vive uma vida dupla: discreta e dedicada aos seus alunos durante o dia, mas de noite, livre e apaixonada ao lado de sua namorada Viv (Kerrie Hayes) e amigas frequentando bares lésbicos. No entanto, a chegada de uma aluna, Lois (Lucy Halliday), à escola pode mudar essa situação. A professora percebe que ambas frequentam os mesmos lugares, o que ameaça sua privacidade.
Destacando-se pela construção de uma atmosfera tensa e claustrofóbica, que reflete a realidade opressiva da época, na verdade, o título “Blue Jean” não podia ser melhor empregado na semântica do filme, onde a expressão inglesa feeling blue (sentindo-se azul na tradução literal, mas que significa estar triste) anuncia escrachadamente o estado sentimental da personagem criando um filme em tons azuis melancólicos para enunciar Jean, oprimida. A constante ameaça da descoberta e das represálias paira sobre Jean, obrigando-a a esconder sua verdadeira identidade e reprimir seus desejos. Essa tensão é habilmente transmitida pela atuação impecável de Rosy McEwen, que captura com maestria as nuances de medo, insegurança e sofrimento da protagonista.
Além disso, Georgia Oakley vai além da representação estereotipada de uma personagem lésbica oprimida. Em vez de simplesmente retratar Jean como uma vítima, ela a constrói como uma figura complexa, cheia de nuances e contradições sabotando a própria aluna por ser exatamente como ela: lésbica. Jean acredita que ser lésbica é apenas transar e se relacionar com mulheres, e que por fugir da norma heterossexual, caractegoriza seus relacionamentos de forma errada por ter visto a vida toda que é algo desviante e pecador, o que a transforma em certo momento em uma oficial contra a própria classe por recursar-se a se reafirmar.
Oakley humaniza a experiência de Jean, mostrando suas vulnerabilidades, mas também sua resiliência e desejo de liberdade. Ao fazer isso, a diretora desafia a narrativa comum e oferece uma representação mais rica e autêntica da vida de mulheres lésbicas na época, explorando não apenas o medo e a repressão, mas também a força e a luta pela aceitação e amor próprio.
Blue Jean (2022) encerra perfeitamente com o outdoor de promoção contra políticas anti-LGBTQIA+ com os dizeres: “ARE YOUR CHILDREN BEING TAUGHT TRADITIONAL MORAL VALUES?” (seus filhos estão sendo ensinados valores morais tradicionais?), pichado por um belo “FUCK OFF MAGGIE” (cai fora Maggie, sua desgraçada). Afinal de contas, a cultura LGBT existe por transversão própria.