Os 25 Melhores Filmes de 2022

2022 foi marcado como o ano de retorno completo das salas de cinema. Avatar: O Caminho da Água e Top Gun: Maverick marcaram como os grandes blockbusters do ano, que reacenderam a chama do cinema de ação hollywoodiano para além da Marvel – além de provarem a força das salas de cinema pós-pandemia. Enquanto isso, Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo marcou como o grande sucesso independente do ano, revelando-se um auge da produtora e distribuidora estadunidense A24. Com um orçamento baixo, o longa-metragem dos Daniels também mostra o impacto das salas de cinema, que perduram mesmo com as janelas de exibição cada vez menores. Além disso, é importante pontuar que o ano foi marcado por dois fracassos de bilheteria vindo de grandes cineastas. Primeiro Os Fabelmans, de Steven Spielberg, e depois Babilônia, de Damien Chazelle. Ambos filmes mostram como o cinema, em 2022, volta seu público cada vez mais para grandes blockbusters e filmes-espetáculo, enquanto trabalhos autorais perdem para a exibição em casa.

Para elaborar o nosso ranking dos 25 melhores filmes de 2022, reunimos os vinte e seis membros da equipe da RUA (que terão seus nomes mencionados no decorrer desta publicação) para elencar seus longas-metragens favoritos, e a lista final resulta da soma dos pontos obtidos nos rankings individuais (dos quais o primeiro colocado recebeu 10 pontos, o segundo, 9 pontos, e assim sucessivamente). Além disso, vale destacar que consideramos como “filme de 2022” as obras lançadas em seu país de origem ao longo do ano passado, logo, produções como Licorice Pizza (2021) e Mães Paralelas (2021) não foram elegíveis, enquanto filmes que chegaram ao Brasil apenas em 2023 foram considerados. Finalmente, a duração mínima estipulada foi de 60 minutos de duração, e as listas pessoais dos membros participantes podem ser visualizadas na segunda página desta publicação. A seguir, os 25 melhores filmes de 2022.

25. NOITES DE PARIS (11 pontos)

Paris: década de 1980. Acompanhamos a personagem Elisabeth vivenciando crises em todas as instâncias de sua vida e, em meio a isso, encontra uma jovem estranha, Talulah, e a leva para casa, fato que mudará a rotina da casa e a visão da própria Elisabeth acerca de suas emoções. Mikhael Hers concebe personagens poucos falantes, mas que encontram no próprio cinema uma forma de extravasar esses sentimentos, sendo assim, as personagens femininas de Hers, que tão pouco falam, vão ao cinema contemplar a verborragia de Éric Rohmer.

– Ana Vitória


24. PÂNICO (12 pontos)

Vinte e cinco anos depois do primeiro filme da franquia e onze depois do último episódio, Pânico [5] dá seguimento à narrativa de que a metalinguagem e autoconhecimento de filmes é um assunto que dificilmente vai carecer de qualidade e divertimento. Nesse novo filme, dirigido pela dupla Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett, a mesmice mantém seu brilho em novos meios de tecnologia: agora, o novo Ghostface não se limita em aterrorizar suas vítimas apenas por telefones. De forma ampla, esse equilíbrio se espalha para as outras áreas da obra, sendo esse um filme bem dosado, onde o familiar se mescla com um certo entusiasmo dado pela nova lente que algo conhecido será apresentado. Sua consciência sobre seu lado trash abraça ainda mais seu lado mais patético e sem noção, ao passo que mostra que o verdadeiro está em varrer seu próprio passado. No final, o sentimento é que o medo nunca vai embora e vai te seguir em cada lugar que você for — e existe um charme nisso.

– Leonardo Frederico


23. O HOMEM DO NORTE (12 pontos)

Em seu terceiro longa-metragem, Robert Eggers se inspira em Hamlet de Shakespeare e na lenda de Amleth para levar às telas um épico viking. Contando uma história de vingança, o diretor mescla cenas de ação com momentos mais contemplativos, criando assim uma atmosfera onírica e transportando o espectador para o século IX. Mais do que um elenco estelar, com Alexander Skarsgård, Nicole Kidman, Ethan Hawke, Willem Dafoe, entre outros nomes, a precisão técnica impressiona, principalmente nas cenas de batalhas gravadas em master shot. Dessa forma, em O Homem do Norte (2022) Robert Eggers, mais uma vez, demonstra seu apreço técnico e modo original de contar histórias.

– Marcela Rauter


22. TRIÂNGULO DA TRISTEZA (12 pontos)

Vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes em 2022, Triângulo da Tristeza (2022), de Ruben Östlund, é uma ácida comédia sobre um naufrágio em um cruzeiro de luxo cheio de super-ricos. O longa tece comentários à cultura dos digital influencers e desenrola um discurso sobre luta de classes à altura da atualidade do tema no debate político. É um filme inteligente e bem executado que não tem medo de ir até às últimas consequências, para o deleite do espectador.

– Gabriel Pinheiro


21. PEARL (14 pontos)

Fazendo parte da trilogia do diretor Ti West, Pearl (2022) é uma carta aberta àqueles que sonham com o sucesso e a fama. O roteiro, assinado pelo próprio diretor junto a Mia Goth, brinca com os discursos da meritocracia e da ambição dos seres a uma consolidação na indústria cultural. Aquele discurso apresentado no filme Cisne Negro (2010) de que “a única pessoa no seu caminho é você mesma” escancara aqui que a fábrica dos sonhos nos custa muito mais do que a própria ambição. As cores, a direção de arte e principalmente a fotografia ironizam o enredo slasher, à medida em que a obsessão da personagem, que tenta se fixar como uma estrela a qualquer custo, contrasta com o mundo vivo e saturado da “fazendinha feliz”.

– Claudio Roberto


20. NADA DE NOVO NO FRONT (15 pontos)

Edward Berger, no alemão Nada de Novo No Front (2022), nos faz voltar os olhos para mais um dos esporádicos filmes com o comum argumento anti-guerra em seu cerne, mas cuja realização me parece muito memorável para as futuras comparações com as próximas tentativas de representações que virão. O que funciona nessa obra é a sua capacidade de nos fazer sentir a angústia, o asco e o terror daquelas trincheiras nas quais centenas de jovens foram jogados para morrer na “guerra que acabaria com as guerras”, nos colocando como plateia em camarote para algumas das mais criativas, cruéis e, eventualmente, criminosas maneiras de carnificina institucionalizada. Tal escolha nos mantêm suspensos de nossa realidade sem pesar para o apelo próprio de um romance heroico ou patriota, muito pelo contrário, o sentimento constante é o de derrota, uma derrota moral e humanitária. A vilania não escolhe lados aqui, ela infesta qualquer um à posto de comando, e já para aqueles que sofrem as mazelas provenientes dela, não resta nada a não ser a desesperança da potencial derrota do eixo. É destruidor ver aquelas feições jovens e inspiradas por uma falsa promessa de grandiosidade se desfazer na primeira explosão de morteiro e derreter junto ao barro lamacento das terras-de-ninguém, onde o apego à vida se torna a única força motriz daqueles rapazes.

Tão efetivo quanto as sequências do caos, são aquelas de calmaria — escassas e significativas — de conversas bobas, da adrenalina de roubar um ganso e o prato delicioso que ele se tornaria, em uma confraternização genuína das pequenas alegrias de um pelotão, cuja humanidade, a vida e a inocência fora-lhes arrancadas e trancafiadas, como um inseto preso em uma caixa de fósforos que vagueia por terras hostis banhadas de arrependimentos dos seus devotos (não) voluntários. Nada de Novo no Front não inova em seu gênero, mas o pinta com as suas próprias cores monocromáticas e cenários arrasadores de forma intrigante, a qual não somos capazes de tirar os olhos à espera da iminente e certa tragédia que conhecemos e haveria de vir.

– João Arenhart


19. ADEUS, CAPITÃO (17 pontos)

Em Adeus, Capitão (2022), Vincent e Tatiana mesclam o aspecto documental com o aspecto simbólico da imagem ao documentar a situação e a memória do povo indígena Gavião e seu líder Krohokrenhum. Mais do que um documento que prova a existência e a luta dos Gaviões, a imagem mantém viva sua memória e cultura. O filme tem consciência da importância da imagem enquanto documento histórico, mas também tem consciência do seu poder simbólico, tanto para a representação e conservação de símbolos já existentes, como para criação de novos. Adeus, Capitão traz esperança para a continuação e preservação da cultura indígena dos Gaviões, como também para o cinema e sua capacidade simbólica.

– Pedro Acadroli 


18. GLASS ONION: UM MISTÉRIO KNIVES OUT (19 pontos)

O que era para ser apenas uma brincadeira de investigação, sai do controle quando dois assassinatos aconteceram de verdade e todos os personagens são suspeitos. Um grupo de amigos e um detetive, que por acaso estava presente para essa brincadeira, agora precisam realmente lidar com não um, mas dois assassinatos. Rian Johnson traz em Glass Onion (2022) um jogo com o espectador, uma longa sequência de investigação que te prende do início ao fim, um jogo onde podemos acompanhar as investigações e chegar a conclusões antes mesmo dos personagens, o que não é muito vantajoso, já que no meio do filme podemos concluir algumas coisas, enquanto ainda está sendo realizada uma longa explicação sobre o motivo e quem seria o assassino.

– Audrey Geromel


17. O FILME DA ESCRITORA (19 pontos)

O espectador familiarizado à obra do diretor sul-coreano Hong Sang-soo pode esperar sua tradicional construção narrativa que se desenvolve através da cristalização de um conceito cinematográfico e sua subsequente subversão de forma e poética realista. The Novelist’s Film (Coreano romanizado: So-seol-ga-ui yeong-hwa) segue esta trajetória, mas ao mesmo tempo se apresenta como um possível ponto de virada na autoria do diretor. Sua protagonista é uma romancista em crise criativa (Lee Hye-young) que ao visitar uma amiga que havia perdido contato, conhece uma famosa atriz (Kim Min-Hee) que também não estava atuando em sua aptidão artística. Como todas as mulheres da cinematografia do autor, ela anda, percorre e às vezes parece flutuar pela cidade. Enquanto caminha, ela desenvolve sua relação com as pessoas e redescobre o impulso de criar, tudo permeado pelos diálogos agridoces e uma encenação despreocupada. A grande virada da história é o jogo proposto entre o que está escrito, mas não encenado, e o encenado mas não escrito: assim, a obra vencedora do Grande Prêmio do Júri no Festival de Berlim abre uma janela ainda maior para a descoberta de uma verdade através da subversão do fictício e a libertação da câmera ao realismo documental. 

– Vitória Rocha


16. STARS AT NOON (20 pontos)

Tensões políticas ambíguas e tensões sexuais concretas. Essa é a dinâmica que define Stars At Noon (2022), o mais recente filme da diretora francesa Claire Denis. A trama acompanha uma jovem jornalista estadunidense se apaixonando por um empresário britânico na Nicarágua, até que os dois se tornam perseguidos políticos no país. Porém, nunca entendemos o porquê dessa perseguição. Não importa, para a cineasta, definir exatamente quais são esses conflitos, e sim nos deixar cada vez mais confusos em seu fluxo narrativo. Interessa a ela tornar mais sensível e carnal o romance dos personagens, brilhantemente interpretados por Margareth Qualley e Joe Alwyn. Quanto menos entendemos os conflitos políticos, mais sentimos a paixão e o tesão dos dois crescer.

– Luís Gongra


15. RRR: REVOLTA, REBELIÃO, REVOLUÇÃO (21 pontos)

Raramente reconhecemos retratos tão rebuscados de repressão, rebeldia e reparação. Em meio à força de tantos “erres”, o diretor S. S. Rajamouli nos presenteia com um melodrama tollywoodiano disposto a narrar a importante luta do povo indiano contra o domínio do Império Britânico sem medo de exageros e extravagâncias em sua forma fílmica. Neste que é possivelmente o longa mais enérgico de 2022, acompanhamos as trajetórias de um herói em busca de justiça por seu povo e um anti-herói que sente não pertencer a lugar algum, destinados a enfrentar um ao outro até sua inevitável união contra um inimigo em comum. Um épico sobre incomunicabilidade e amores impossíveis, RRR (2022) se vale de suas três horas de duração para explorar seu vultoso enredo através de uma série de segmentos, indo de cenas musicais com elaboradas coreografias a momentos aventurescos que elevam a espetacularização da ação a patamares únicos.

– Gabriel Ritter


14. DECISÃO DE PARTIR (25 pontos)

Em um fluxo de sensações, Decisão de Partir (2022) transporta o espectador para o subconsciente do detetive Hae-Joon. Após o corpo de um alpinista ser encontrado na base de uma montanha rochosa íngreme, o inspetor Hae-Joon começa a investigar a viúva, Seo-rae, principal suspeita do crime. Durante a investigação, no entanto, o detetive se encontra inegavelmente atraído pela mulher. Em meio a um ambiente de estranheza e violência construído por um trabalho de cinematografia e montagem autoconsciente, somos incitados a observar, mediante um voyeurismo digno de Hitchcock, e juntar as peças junto à câmera e ao protagonista. Cada enquadramento, cada plano, cada movimento de câmera é feito de forma minuciosa e criativa, resultando em uma percepção única da trama para além dos mistérios clássicos de detetive. Trata-se aqui de uma investigação da mente humana em um ritmo hipnótico, do ponto de vista atormentado de Hae-Soom, da enigmática Seo-rae, que pode-se dizer é a alma de toda a obra, e do romance fatalista de ambos. Mais relevante do que a narrativa, sua forma inventiva e abusiva é o que nos transporta para o subconsciente dos personagens, representando suas emoções, seus pensamentos, suas tentações, suas contradições e seus anseios, que, pouco a pouco, nos amarram em uma história de amor impossível puramente humana. 

– Isabella Bretas


13. CRIMES DO FUTURO (29 pontos)

Num futuro distópico em que as infecções não existem mais, os corpos de alguns indivíduos começam a rejeitar a comida normal e a desenvolver novos órgãos, aparentemente inúteis, fazendo com que as pessoas comecem a se interessar mais por cirurgias, tanto de forma sexual quanto artística. Os protagonistas, Saul (Viggo Mortensen) e Caprice (Léa Seydoux), são artistas performáticos: ele gera novos órgãos, enquanto ela os remove durante suas apresentações. Esse desejo e fetiche se tornam claros para o espectador quando a frase “a cirurgia é o novo sexo” é cunhada. O filme tem consciência da bizarrice dessa ideia, mas em momento nenhum discorda dela; a obra é carregada de sensualidade, e leva isso muito a sério na medida que encontra beleza e erotismo nos desejos e detalhes mais estranhos. É também na construção do mundo que ele se sobressai, toda esquisitice das mudanças corporais é tão bem integrada com a arte e a luxúria das cirurgias e os movimentos políticos que permeiam o longa, que parece impossível que um exista sem o outro.

– Antônio Mendes


12. ARGENTINA, 1985 (31 pontos)

Em Argentina, 1985 (2022), Santiago Mitre relata um período extremamente delicado da história da Argentina, remetendo ao julgamento dos principais responsáveis do regime militar do país. O filme traz à tona um importante debate sobre a justiça referente a atos políticos, soando quase como uma crítica geral ao atual cenário da política brasileira. O filme, diferente do padrão Hollywoodiano, aborda o julgamento de uma maneira “latino-americana”, sem muitas performances teatrais em júris. Por fim, vale a pena destacar mais uma atuação impecável de Ricardo Darín, o qual interpreta o promotor Julio Strassera, que nos conquista com seu carisma.

– Luiz Carlos


11. OS BANSHEES DE INISHERIN (38 pontos)

Uma alegoria trágica e cômica à Guerra Civil Irlandesa de 1922, bem como à tensão política e social que ainda divide o país nos dias de hoje, Os Banshees de Inisherin (2022) é uma mordaz reflexão sobre amizade, gentileza, idealismo, legado e a efemeridade do ser humano. Ambientada na fictícia, provinciana e titular ilha de Inisherin, a um grito de distância da costa Irlandesa, a obra de Martin McDonagh acompanha a solitária confusão de Pádraic quando seu único verdadeiro amigo, Colm, decide terminar sua amizade a fim de perseguir sua aspiração de ser imortalizado como um violinista virtuoso. Bombardeado pelos habitantes da ilha com tentativas incessantes e crescentemente ridículas de reatar a relação entre os dois, Colm declara que, para cada futura investida do ex-amigo, irá cortar um de seus próprios dedos. O desenrolar do enredo revela um diretor-roteirista no auge de suas habilidades dramáticas, capaz de justapor cenas de absurdismo encantador e melancolia existencial sem enfraquecer seus impactos. Profundamente introspectivo e hilariamente grotesco, Os Banshees de Inisherin (2022) é adornado ainda por uma trilha sonora atmosférica, atuações excepcionais e belíssima fotografia repleta de cenários naturais exuberantes, permanecendo na mente e memória de seu espectador senão por sua gentileza, talvez por sua maestria artística.

– Eduardo Guimarães


10. TOP GUN: MAVERICK (42 pontos)

A sequência do grande clássico estadunidense Top Gun – Ases Indomáveis (1986) surpreende os espectadores ao desenvolver uma história madura e cheia de personalidade para os dias atuais. Com uma harmonia entre renovação e nostalgia, o mais recente blockbuster do cinema hollywoodiano possui um dinamismo forte na sua ação e um romantismo muito potente, que transforma simples interações entre seus carismáticos personagens/atores e os ambientes circundantes em uma proporção epopeica. Top Gun: Maverick (2022) se prova um dos melhores filmes populares dos últimos anos ao realçar duas de suas grandes virtudes: usar das fórmulas clássicas de Hollywood para reinventar seus apelos técnicos e narrativos de maneira elegante e sensível para a modernidade, além usufruir do talento de uma das últimas grandes estrelas do cinema, o magnífico Tom Cruise

– Lucas Mariotti


9. TÁR (45 pontos)

Como uma falsa biopic montada ao contrário, TÁR (2022) inicia no auge da gloriosa Lydia Tár, mas tem como correspondência no resto de sua rodagem a vertiginosa queda de sua protagonista ao pior destino que se possa imaginar à figura tão palpável e assustadoramente cotidiana que permitiu à imprensa e público desavisados a acreditarem que a obra de Todd Field concerne a uma história real. Por outro lado, a incursão de gritos retirados de The Blair Witch Project (1999) e elementos fora do mundo real, como fantasmas escondidos no fundo de alguns enquadramentos, contrapõem a curiosa impressão de alguns espectadores de ser uma obra tão palpada pelo real que se confunde entre realidade e ficção, afinal, tal fluxo de ideias converge com a epopeia de Lydia Tár, instrumentista tão apta a atingir o apogeu de sua profissão que se perde em suas relações interpessoais e profissionais.

– Alisson Nunes


8. MARTE UM (62 pontos)

De Gabriel Martins, o longa-metragem nacional mais aclamado de 2022 é um mosaico íntimo e singelo do cotidiano de uma família mineira, a qual vê seus sonhos serem ameaçados pela ascensão de um governo de extrema-direita. Tá certo que o contexto político não passa de um pano de fundo (que, quando mais evidente, menos parece se articular dentro do filme, impedindo que a trama alcance proporções alegóricas), mas é no registro corriqueiro de trocas de afeto, de acontecimentos prosaicos e de declarações de sonhos, que é possível entrever um verdadeiro contragolpe ao projeto de desmonte cultural instaurado pelo governo de Jair Bolsonaro. Recupera-se uma brasilidade até então desalentada, que fora interrompida com os levantes fascistas, reprimida e taxada com os piores nomes. Num cenário de estreitamento democrático, em que o discurso político se confunde com o discurso de ódio, talvez nada seja mais revolucionário do que ousar sonhar além. Um tanto conformista, o longa de Gabriel Martins aposta suas fichas na esperança de que, seja como for, a gente dá um jeito.

– Vinicius João


7. NÃO, NÃO OLHE! (64 pontos)

Em Não, Não Olhe! (2022), Jordan Peele nos apresenta um filme de terror com uma pitada de faroeste protagonizado por OJ, um homem negro que treina cavalos para Hollywood. Após notar algo estranho no céu quando alguns de seus cavalos somem misteriosamente, OJ e sua irmã resolvem se unir para fotografar o fenômeno, mas as coisas não saem como esperado. Como num espetáculo, o longa nos apresenta uma história fantástica e instigante, com a quantidade certa de terror e deslumbramento, além de visuais de tirar o fôlego. Ainda, a maneira que o filme aborda o trauma do luto de forma subtextual é muito inteligente.

– Heliz Petrechen


Após 14 anos trabalhando na reconcepção da história do mais famoso boneco de madeira, Guillermo del Toro subverte a delicadeza comumente atribuída aos contos de fadas a partir da exploração de um contexto real e um visual fora do comum. A essência desse formato permanece em sua integridade, tratando de assuntos sérios com simplicidade e rebuscamento. Apesar de o protagonista ser historicamente reconhecido pelas mentiras e por seu nariz que cresce, esses pontos não ocupam papel central, o que abre espaço para discussões sobre uma Itália ainda sob regime fascista; noções de masculinidade ainda vigentes; seres simultaneamente oníricos e escabrosos; e, principalmente, um boneco que se torna um menino de verdade, mas permanece com as mesmas juntas de madeira. E mudanças assim não ocorrem de repente, nem são visíveis a olho nu. 

– Laura Penalva


5. TUDO EM TODO O LUGAR AO MESMO TEMPO (75 pontos)

Impostos, morte, existencialismo, filosofia, daddy issues, amores e o que parece a interminável tarefa de lavar roupas são elementos unidos e batidos em um liquidificador cinematográfico, transformando-se na algazarra de Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo (2022). Escrito e dirigido pela dupla Daniel Kwan e Daniel Scheinert, Tudo em Todo o Lugar conta a história de Evelyn Wang, imigrante chinesa em um casamento frustrado e dona de uma lavanderia à beira da falência, tentando lidar com o progresso das tradições sociais e familiares com uma filha LGBTQIAP+ que quer apresentar a namorada para o avô, pai da protagonista, o qual possui uma antiga história de traumas, tudo isso ao mesmo tempo em que recebe a notícia de que é a única capaz de deter Jobu Tupaki, a grande vilã que ameaça a existência do multiverso. O tom de comédia e a necessidade do próprio filme de não tentar ser sério, parodiando e homenageando, simultaneamente, o cinema asiático, seja com as lutas de Kung-Fu, seja por utilizar em alguns momentos da estética de Wong Kar-Wai, parecem dar a ele a capacidade de explorar os tópicos mais profundos e recorrentes da vida. Ao final das contas, como o próprio filme enuncia ao espectador, o mais ordinário talvez seja o que mais valha a pena de viver.

– Nycolle Souza


4. BATMAN (78 pontos)

The Batman (2022), de Matt Reeves, merece ser lembrado por trazer um novo lado do cavaleiro das trevas ao cinema. Na contramão das outras adaptações pré-existentes do personagem, Matt Reeves e sua equipe optaram por trazer o lado mais detetivesco do homem-morcego, inclusive escolhendo um ator que não se enquadra no tipo tradicional do protagonista. Robert Pattinson, que dá vida ao personagem,  diferente de atores que interpretaram o Batman anteriormente, é marcantemente mais esguio, ressaltando como esta interpretação do personagem recorre mais a resoluções intelectuais para seus desafios. A galeria de vilões do herói da DC Comics é notoriamente bem construída, e o antagonista escolhido para o filme, o Charada, também conversa com essa vertente do personagem. Em quesitos técnicos, o filme se sobressai na fotografia que, comandada pelo ganhador do Oscar de melhor fotografia em 2022, Greig Fraser, é capaz de transmitir a morbidez da Gotham City criada por Reeves. A trilha sonora, composta por Michael Giacchino, também merece ser lembrada, pois auxilia em muito na criação da atmosfera desejada. Em última instância, a obra ficará marcada por trazer novos ares para um personagem muito trabalhado anteriormente e fazê-lo com primazia.

– Athos Parentoni


3. AFTERSUN (78 pontos)

Aftersun (2022), o primeiro longa dirigido pela escocesa Charlotte Wells, revisita as memórias de Sophie em suas férias ao lado de seu pai Calum quando ela tinha 11 anos. O filme é um exercício de reflexão acerca da memória e sobre o imaginário perdido da personagem, que tenta encontrar uma imagem concreta de sua figura paterna através de gravações daquela viagem na Turquia. Dessa forma, transitando entre o passado por meio de vídeos caseiros e o presente de Sophie mais velha assistindo tais filmagens, o resultado é uma obra sensível, com planos impecáveis que conseguem, com êxito, emocionar o espectador.

– Fernanda Carbonera


2. AVATAR: O CAMINHO DA ÁGUA (87 pontos)

Treze anos após o lançamento do primeiro filme da franquia, retornamos a Pandora para desbravar mais a fundo todo o universo Na’vi criado por James Cameron. O longa mostra a vida da família de Jake Sully e Ney’tiri após o exército norte-americano retomar a tentativa de colonização do planeta, entretanto, não é essa a questão central do filme. O protagonista, diferentemente do primeiro Avatar (2009), é o mundo de Pandora, e é como se o diretor não tivesse pressa alguma em ambientar o espectador nele. Muito mais do que contar uma boa história, em Avatar: O Caminho da Água (2022), James Cameron entende que Cinema é a arte da sinestesia, e se preocupa em fornecer ao espectador uma experiência de sentidos, explorando todas as possibilidades que o CGI pode fornecer.

– Victoria Oliveira


1. OS FABELMANS (92 pontos)

Quando pensamos em filmes que amaram o cinema, não é raro pensar em alguns títulos como Cinema Paradiso (1988), A Invenção de Hugo Cabret (2011) ou A Última Sessão de Cinema (1971), mas a comparação mais direta que se pode fazer com The Fabelmans é Jacquot de Nantes (1991), de Agnès Varda, especialmente na abordagem focalizada em demonstrar o amor pelo ato de fazer filmes em si, na experimentação de uma personalidade real quando criança/adolescente para com a câmera. Todavia, existe algo que apenas poderia ser narrado quando se trata de uma experiência pessoal do cineasta.

Spielberg é um romântico por natureza, e sua dramatização em cima do personagem Sammy Fabelman, que por si é um alter-ego do próprio realizador, constrói uma crença no indivíduo que aposto que os mais cínicos, durante as duas horas e meia de projeção, deixarão seu cinismo de lado. Dessa forma, Spielberg é tão romântico que facilmente poderíamos substituir O Caminhante Sobre o Mar de Névoa pelo último plano, ou melhor, o último enquadramento que há antes dos créditos começarem a subir.

– Samuel Malaquias


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